29/09/2019 - 13:30 - 15:00 EO-21A - GT 21 - Itinerários terapêuticos: vulnerabilidade(s), interseccionalidade(s) e experiências de luta pelo direito à saúde no e para além do SUS 1 |
31075 - A VIVÊNCIA DE MULHERES COM ARTRITE REUMATÓIDE: TRAJETÓRIAS, ITINERÁRIOS E INTERSECCIONALIDADES CRISTINA DIÓGENES SOUZA BEZERRA - UFRN
Introdução
Na busca por compreender as experiências de vida e da doença de mulheres que convivem com dores do corpo e cansaço do modo cronificado, esta pesquisa em
desenvolvimento há dois anos no mestrado em antropologia social, PPGAS/UFRN, parte se volta para a vivência de pessoas com artrite reumatóide (AR) para pensar os saberes, práticas, significados e itinerários terapêuticos através da ótica da interseccionalidade, tendo como principal locus etnográfico o Hospital Universitário Onofre Lopes (HUOL).
Objetivos
Compreender a experiência da artrite reumatóide na trajetória de vida de mulheres a partir das narrativas, significados e práticas no desenvolvimento da AR.
Analisar os itinerários terapêuticos para compreender quais os recursos procurados e disponíveis.
Investigar as realidades sociais que abordadas aqui, sob a ótica da interserccionalidade, refletindo, com base em marcadores sociais da diferença como gênero, classe, raça, geração e local, as narrativas sobre a experiência da doença (LANGDON, 1995) e do cuidado.
Suscitar uma investigação sobre direitos e identidades que emergem no decorrer dessa experiência, principalmente no que tange ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), analisando sobre a experiência dessa doença na vida cotidiana assim como no âmbito das políticas públicas.
Metodologia
Essa é uma pesquisa antropológica que se baseia na investigação etnográfica a partir da análise das trajetórias de vida, tomando o itinerário terapêutico como eixo para investigar a experiência da doença. Para tanto foi feita a observação participante em diferentes planos de inserção etnográfica como no ambiente de espera e nos consultórios do Hospital Universitário Onofre Lopes (HUOL) localizado em Natal/RN, enquanto um serviço formal de saúde que recebe a demanda de todo o estado do Rio Grande do Norte (RN) de média e alta complexidade, realização entrevistas semi-estruturadas, com gravação e transcrição dos áudios, assim como diálogos através do ambiente virtual por meio das redes sociais como Facebook e Instagram que promovem discussões de questões essenciais à essa pesquisa, além de utilizar a técnica de amostragem bola-de-neve (snowball) como um recurso para alcançar sujeitos sociais, que não se encontram nos locais em que realizei a pesquisa - seja porque recorrem à serviços privados de saúde ou porque não fazem desses espaços formais o ambiente de tratamento - como forma de alcançar itinerários terapêuticos diversos.
Resultados e Discussão
Partindo das reflexões de Kimberlé Crenshaw (1994) vê-se que determinadas situações são decorrentes de um sistema de dominação que atinge as mulheres como uma classe, e torna-se perceptível que tal dimensão da violência é efetivada tanto na experiência de vida, quanto da doença, englobando também as práticas do cuidado ou situações de descaso. Então, atenta-se para o fato de que a supressão de determinadas diferenças pode ocultar as violências latentes, “fundamentalmente porque a violência que muitas mulheres experimentam é muitas vezes moldada por outras dimensões das suas identidades, como raça e classe.” (Idem, 1994, p.1). Com a análise das trajetórias de vida e dos itinerários terapêuticos das interlocutoras notou-se que além da dificuldade para obtenção do diagnóstico da doença, que para algumas levou anos, há também a dificuldade para a realização do tratamento e para o retorno trimestral ao médico, fatos perpassados pela realidade social que vivenciam.
Ademais, nenhuma delas hoje tem acesso ao BPC, uma parte teve o benefício cortado entre 2017 e 2018 e a outra parte fez o requerimento, mais de uma vez, mas não conseguiu acessar esse direito. Tal contexto remete ao que Davis (2018) pontua sobre o corte nas políticas socioassistenciais que ocorreram em 1980 durante o governo de Ronald Regan nos EUA, que afetou diretamente mulheres e crianças, negras e pobres, e nos permite perceber que pensar a interseccionalidade é também refletir como os marcadores sociais da diferença revelam os grupos diretamente atingidos pela atenuação do investimento em políticas públicas.
Considerações Finais
Através da análise interseccional pode-se perceber como é heterogênea e complexa a experiência da doença, perpassada por processos de saúde, adoecimento, terapias e cuidado. Assim, o debate da interseccionalidade mostra como gênero não é uma categoria que responde por si só as realidades sociais das pessoas com artrite reumatóide. E a partir da percepção do "sistema de diferenças" que Piscitelli (2009) desenvolve pode-se perceber que esse entrelaçamento das distinções raciais, sexuais, de classe, geração com o gênero, dentro de um contexto social mais amplo, leva à um cenário de vulnerabilidade social, no qual o itinerário terapêutico perpassado pela demora ao acesso às consultas, lento processo diagnóstico da doença, grande dificuldade na manutenção do tratamento com os medicamentos de alto custo fornecidos pelo SUS e no acompanhamento periódico preconizado.
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