29/09/2019 - 13:30 - 15:00 EO-29B - GT 29 - Saúde e privação de liberdade |
30362 - REFLEXÕES SOBRE O DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA NO SISTEMA PENITENCIÁRIO FEMININO DA PARAÍBA LUCIANA MARIA PEREIRA DE SOUSA - ANEPOP; UFRN, CLÁUDIA HELENA SOARES DE MORAIS FREITAS - UFRN; UFPB
O Direito Humano à Alimentação Adequada diz respeito a todas as pessoas ter acesso regular, permanente e irrestrito a alimentos em quantidade e qualidade adequadas e suficientes. De acordo com a Constituição Federal do Brasil, esse direito deve garantir condições necessárias para que todos os seres humanos, de forma igualitária e sem nenhum tipo de discriminação, existam, desenvolvam suas capacidades e participem plenamente e dignamente da vida em sociedade. Um contexto desafiador para a realização do direito à alimentação é o cenário do sistema prisional brasileiro. Nos últimos anos houve um grande crescimento da população feminina em situação de cárcere no Brasil, representando um aumento de 656% em relação a década anterior e no estado da Paraíba um aumento superior a 90%, que amplia a chance de exposição a precárias condições e dificultam o acesso dessa população à alimentação de qualidade, efetiva e equânime, representando assim um problema relevante quando tratada no âmbito da saúde pública. O objetivo desse estudo é analisar a promoção do direito à alimentação em mulheres no sistema penitenciário feminino da Paraíba. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, desenvolvida no primeiro semestre de 2019, nas quatro penitenciárias que recebem mulheres em conflito com a lei no estado da Paraíba: O Centro de Reeducação Maria Júlia Maranhão em João Pessoa, a Penitenciária feminina de Campina Grande, a Penitenciária Feminina de Patos e a Penitenciária Feminina de Cajazeiras. Os sujeitos da pesquisa são representantes da Secretaria de Administração Penitenciária da Paraíba, diretoras das penitenciárias femininas do estado, mulheres em situação de cárcere, em regime fechado há no mínimo um ano e as mulheres em situação de cárcere que desenvolvem atividade laboral nas cozinhas de cada penitenciária onde o estudo foi realizado. O instrumento de coleta de dados foi através de entrevista semi-estruturada e foi utilizada a hermenêutica-dialética, como proposta metodológica para a análise dos dados. Os resultados são apresentados através das categorias: 1- contextualização do cenário do caso; 2- acesso à alimentação no sistema prisional de mulheres na Paraíba; 3- significado da alimentação para as mulheres privadas de liberdade; 4- alcances e limites da realização do direito à alimentação. O sistema prisional da Paraíba apresenta perfil semelhante ao contexto nacional. A maioria das mulheres em situação de cárcere são mulheres em idade fertil, com baixa escolaridade, oriundas de trabalho informal e de situação de baixa renda. Esse perfil pode influenciar na percepção das mulheres quanto ao significado da alimentação e a forma como estas avaliam a realização do direito a alimentação no sistema prisional, quando parte das colaboradoras referem que antes do período em cárcere não tinha condições de adquirir alimentos e garantir ao menos três refeições diárias. Todas as colaboradoras referem a alimentação como condição muito importante para garantir a vida. O acesso a alimentação no sistema prisional da Paraíba acontece através da aquisição de alimentos para todas as unidades prisionais e preparação das refeições realizada por detentas que trabalham como cozinheiras nos presídios. Além disso, outra forma de acesso a alimentos é através das visitas que as detentas recebem, apesar de muitas mulheres não receberem visitas nas penitenciárias. As principais queixas com relação a alimentação ofertada nas penitenciárias refere-se a rotina com pouca variedade no cardápio e a falta de alimentos hortifruti. A potencialidade apontada por parte das colaboradoras diz respeito ao fato de que algumas mulheres hoje fazem refeições diariamente e quando moravam “nas ruas” não tinham certeza de quando podiam realizar três refeições ao dia. Observamos que o contexto do encarceramento dificulda a inviabiliza a realização do direito à alimentação em sua plenitude, no que se refere a disponibilidade de alimentos, adequação, acessibilidade e estabilidade do fornecimento. A condição da mulher encarcerada sob uma perspectiva crítica dos direitos humanos, com enfoque ao direito humano a alimentação, fere a dimensão do direito à alimentação que se refere à alimentação adequada. O DHAA não deve ser interpretado em um sentido restritivo, que considera como recomendações mínimas de energia ou nutrientes. A alimentação para o ser humano deve ser entendida como processo de transformação da natureza em gente saudável e cidadã. Para isso, é fundamental que práticas que promovam o DHAA considerem os princípios que se relacionam com esse direito e, assim, superem práticas discriminatórias e autoritárias.
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