29/09/2019 - 13:30 - 15:00
EO-29B - GT 29 - Saúde e privação de liberdade |
31637 - SAÚDE MENTAL E REDUÇÃO DE RISCOS E DANOS ENTRE ADOLESCENTES EM CUMPRIMENTO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO: A EXPERIÊNCIA DO PROGRAMA FORTALECE, NA CASE SALVADOR
ANDRÉ LUÍS PEREIRA GUIMARÃES - UFBA
Devendo seguir o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA e a Lei do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – SINASE, entre outras disposições legais, uma Comunidade de Atendimento Socioeducativo – CASE da Fundação da Criança e do Adolescente – FUNDAC, no estado da Bahia, semelhante a outros estados, se caracteriza como uma instituição total, na qual adolescentes e jovens adultos cumprem medida socioeducativa de internação por atribuição de ato infracional análogo a crime previsto no Código Penal Brasileiro.
O Programa Fortalece surgiu como iniciativa de resposta a demandas psicossociais cada vez mais complexas ligadas aos contextos sociocomunitários de origem de muitos dos jovens que cumprem medida socioeducativa na CASE Salvador. A priori, é perceptível que o contexto social periférico de grande parte dos municípios do estado da Bahia está atualmente marcado pela proliferação de facções criminosas que, para além das atividades delituosas, ganham destaque por marcas distintivas expressas através de símbolos, saudações verbais e gestuais, além de alta rivalidade e violência entre grupos. Nesses contextos sociocomunitários, a exposição a sociabilidades violentas, ao tráfico e consumo de substâncias psicoativas constitui um conjunto de múltiplas práticas e sentidos que se articulam na formação identitária de muitos membros dessas comunidades, desde à infância. Atos infracionais praticados por adolescentes, não raro, estão relacionados ao uso problemático ou abusivo de substâncias psicoativas e/ou ao tráfico e práticas correlatas, no contexto de facções criminosas.
Diante das tramas que hora se apresentam, o Programa Fortalece foi concebido a partir da demanda por promoção de saúde mental e redução de riscos e danos para jovens vulneráveis a contextos de violência, tráfico e consumo de substâncias psicoativas. A partir de um Espaço de Convivência da terceira fase da medida socioeducativa, mais próxima do desligamento, tendo como facilitador o psicólogo de referência, foram compostos três grupos de até oito jovens, com o objetivo realizar em torno de dez sessões com periodicidade semanal, de no máximo duas horas. Cumprindo as orientações para a construção de “oficina em dinâmica de grupo”, tomou-se a prerrogativa de que a participação fosse voluntária e o planejamento das sessões fosse flexível e pautado nas necessidades e decisões do coletivo, tendo como foco o pós-medida. Os temas geradores a serem trabalhados na sequência de encontros, relacionados com a demanda do grupo e com o foco da oficina, foram sugeridos pelos jovens no primeiro encontro do grupo. O período de realização teve início em maio de 2019 e encontra-se em andamento. O objetivo geral definido para o Programa Fortalece foi articular junto aos jovens a produção de estratégias de promoção e proteção da saúde mental e da vida, com ênfase na redução de riscos e danos em contextos de exposição à violência, ao tráfico e consumo de substâncias psicoativas.
Tendo como premissa o reconhecimento das habilidades e saberes locais dos jovens, potencializando a articulação com novos saberes e práticas para possíveis contextos futuros, o trabalho já iniciou com resultados positivos. A programação das sessões foi construída de modo participativo e horizontal possibilitando fenômenos associados à dinâmica de grupo como a coesão grupal, o vínculo, o pertencimento, o compartilhamento de informações, a cooperação, o aprendizado interpessoal etc., também produzindo sentimentos compartilhados de estima, confiança e respeito. A cada sessão, se passou a produzir uma síntese, cujo conjunto pretende-se compilar em produtos finais de cada grupo. Foi planejada e iniciada a produção de folders com informações sobre substâncias psicoativas e estratégias de redução de danos com base em conhecimentos técnicos pesquisados. Técnicas de relaxamento foram inseridas no início de cada sessão como meio de demonstrar um modo de cuidado de si, propiciando o destensionamento físico e emocional, bem como facilitando a concentração e a assimilação dos temas discutidos.
Tem sido possível promover o acesso dos jovens a novas informações científicas e culturalmente diversas consoantes à promoção e proteção de saúde mental e da vida, com ênfase na redução de riscos e danos, a partir das atividades em grupo. Com o intercâmbio entre os saberes locais dos jovens e os saberes técnicos e culturalmente diversos reconhecidos em grupo, tem sido possível fomentar a produção de estratégias pessoais e coletivas de proteção e bem-estar, para cada jovem e o seu entorno, com vistas ao pós-medida.
O desafio, no entanto, é fortalecer a rede de conhecimentos que está se formando, de modo que não se perca pelos futuros caminhos desses jovens. Nesse sentido, a ideia de gerar um ou mais produtos finais, impressos ou em formatos diversos, a serem levados por cada jovem coautor do grupo, pode ser uma alternativa de fixação dos novos saberes produzidos.
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