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29958 - “O BRASIL AINDA TEM SAFRAS E ESTAÇÕES”: ALIMENTAÇÃO NAS CRÔNICAS DE RUBEM BRAGA ANA BEATRIZ GONZALEZ - FACULDADE DE CIÊNCIAS APLICADAS – FCA/UNICAMP, JULICRISTIE MACHADO DE OLIVEIRA - FACULDADE DE CIÊNCIAS APLICADAS – FCA/UNICAMP
“O BRASIL AINDA TEM SAFRAS E ESTAÇÕES”: ALIMENTAÇÃO NAS CRÔNICAS DE RUBEM BRAGA
INTRODUÇÃO
Comer é um ato social que expressa cultura. Segundo Contreras & Gracia[1], somos o que comemos e comemos o que somos, uma vez que o comer incorpora elementos que são intimamente ligados à condição humana. O comer e a comida são categorias históricas e transformam-se constantemente. O domínio do fogo, por exemplo, possibilitou o cozimento, alterou os modos de produção, preparo e consumo; além de estabelecer organização social e regras relativas à alimentação.[2,3] Com a globalização, o processo de produção e a alimentação rápida favorecem a padronização de gostos. Por conseguinte, Fischler & Masson[4] apontam a necessidade de reencantar a alimentação e valorizar o cultivo, a culinária, o gosto e o convívio na partilha.
Nas obras de Rubem Braga revelam-se interessantes diálogos entre literatura e alimentação, pois se observa a valorização da comida, a descrição dos sentimentos no processo de cultivo, seleção de ingredientes, preparo de refeições, partilha e relações sociais. Assim, o objetivo deste trabalho é compreender e analisar os sentidos do comer e da comida nas crônicas de Rubem Braga, especialmente no que tange à comensalidade e ao encanto pela comida.
MÉTODOS
Foram lidos e analisados 14 livros de Rubem Braga e selecionadas treze crônicas que explicitavam a comensalidade e encanto pela comida. Essas foram analisadas com base em referenciais teóricos das Ciências Humanas e Sociais.
Formatos e suportes necessários à apresentação
Mesa pequena para acomodação dos livros e crônicas impressas e suporte para a exposição de um banner.
Resultados e Discussões
Em O outro Brasil, Braga compartilha seu sonho de navegar pelo país:
“Houve um tempo em que sonhei coisas (...) apenas ir vivendo devagar a vida lenta dos mares do Brasil, tomando a cachacinha de cada lugar, sem pressa e com respeito. (...) Sim, entraria pelos rios lentamente, de canoa, levando aralém que poderia trocar por toscas amanteigadas, pamonha ou beiju, pois ainda há um Brasil bom que a gente desperdiça de bobagem, ir pelos caminhos que acompanham com todo carinho os lombos e curvas da terra, aceitando uma caneca de café na casa de um colono” [5]
Percebe-se o sonho de uma vida tranquila, na valorização de momentos, do diálogo e da apreciação dos sabores das cachaças e cafés. Podendo haver troca de mercadorias, porém na intenção de consumir uma comida simples, caseira e boa.
‘Não, eu não sou contra o progresso ("o progresso é natural") mas uma garrafinha de refrigerante americano não é capaz de ser como um refresco de maracujá feito de fruta mesmo — o Brasil ainda tem safras e estações, vazantes e piracemas com manjuba frita, e a lua nova continua sendo o tempo de cortar iba de bambu para pescar piau” [5]
A globalização é um processo consensual, e que determina novas práticas culturais priorizando a lógica de lucro do mercado.[6] Assim, temos novos modos de comer, especialmente dos alimentos rápidos, semi-prontos ou prontos para o consumo[7], como o refrigerante citado na crônica. Entretanto, Braga defende os prazeres de uma comida natural, da fruta colhida no pé em sua estação, da fruta fresca e saborosa.
Como discutem Fischler & Masson[4], a perda da sazonalidade das frutas, da localidade, do natural, a mudança na consistência e a redução da variedade dos alimentos é uma consequência da globalização. Assim, os cardápios se tornam cada vez mais padronizados e homogêneos. A tradição da espera relacionada a uma estação do ano foi perdida, assim como a valorização e apreciação dos alimentos.
CONCLUSÃO
A comensalidade e o encanto pela comida estão constantemente expressas nas crônicas e revelam sensibilidade, simplicidade e relevância da alimentação em determinados momentos, lugares e relações sociais. Podem assim, serem motes importantes para a compreender as relações pessoais e em grupo com o comer e a comida e, por consequência, com a promoção da saúde.
REFERÊNCIAS
1. Contreras Jesus, Gracia Mabel. Alimentação, sociedade e cultura. Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz; 2011. 496 p.
2. Lévi-Strauss C. O triângulo culinário. In: Cordier S, organizadores. Lévi-Strauss. São Paulo:Documentos; 1968. 102 p.
3. Lima, Romilda de Souza; Neto, José Ambrósio Ferreira; Farias, Rita de Cássia Pereira. Food and culture: the exercise of commensality. Rev. Demetra: alimentação, nutrição & saúde, N°10, 2005. pp. 07-522.
4. Fischler, Claude; Masson, Estelle. Comer: A alimentação de franceses, outros europeus e americanos. São Paulo, SP: Editora SENAC São Paulo. 2010. 356p.
5. Braga R. Crônicas do Espirito Santo. 3a Edição. São Paulo: Global, 2013.
6. Santos, Boaventura de Sousa. A Globalização e as ciências sociais. 4. ed. São Paulo, SP: Cortez, 2011. 572 p.
7. Corção, Mariana. Memória gustativa e identidades: de Proust à cozinha contemporânea. 2006. Disponível em: . Acessado em 28 de março de 2019.
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