30/09/2019 - 13:30 - 15:00 EO-8J - GT 8 - Medicina, Médicos e Direito à Saúde |
29768 - DIREITO À SAÚDE E O RECRUTAMENTO DE MÉDICOS ESTANGEIROS: ANÁLISE DOS ARRANJOS EMPREENDIDOS POR BRASIL, ANGOLA E PORTUGAL NO RECRUTAMENTO DE MÉDICOS CUBANOS SANDRA MARA CAMPOS ALVES - FIOCRUZ E UNB, MARIA CÉLIA DELDUQUE - FIOCRUZ E UNB, PAULA LOBATO DE FARIA - UNIVERSIDADE NOVA DE LISBOA
Apresentação/introdução: A saúde, reconhecida enquanto direito humano social, tem, nas prestações positivas do Estado, seu conteúdo nuclear e, para a sua concretização um dos elementos a ser considerado pelos Estados são os recursos humanos em saúde (RHS), em quantidade adequada e distribuídos de forma equilibrada pelo território. As evidências demonstram que prover médicos é um dos grandes desafios enfrentados pelos Estados, sejam eles defensores de sistemas de saúde universais ou seletivos.
Os países que apresentam déficit de médicos, tem buscado, no recrutamento internacional, um mecanismo para mitigar os vazios assistenciais, e Cuba tem se apresentado como pais ativo na cooperação médica em saúde.
Os contornos dessa intervenção estatal são delimitados pelo arcabouço jurídico-legal de cada país, de modo a não se configurarem osbstáculos a execução das ações projetadas.
Nesse contexto é que se desenvolveu a investigação sobre os arranjos efetivados por Portugal, Brasil e Angola, países com sistemas de saúde e situação sócio demográfica e epidemiológica distintas, e que adotaram o recrutamento de médicos cubanos para atuar na atenção primária em seus países, dada a escassez desse profissional em determinadas áreas.
Objetivo: Identificar os arranjos jurídico-político-institucionais utilizados por Angola, Brasil e Portugal, necessários à implementação da estratégia de recrutamento de médicos cubanos para suprir vazios assistenciais, no âmbito da atenção primária
Metodologia: Tratou-se de estudo de caso múltiplos apoiado na triangulação de dados, a partir da coleta de informações em fontes múltiplas de evidência (pesquisa documental, entrevistas focadas e observação direta).
A pesquisa documental abrangeu a legislação em saúde e processo de validação de diplomas de medicina estrangeiros, além dos acordos de cooperação firmados com Cuba.
As entrevistas, em um total de 30, foram realizadas no período de junho/2017 a outubro/2018, com roteiros distintos para os grupos selecionados: a) gestores de saúde do nível central; b) técnicos responsáveis pelos acordos de cooperação; c) médicos cubanos; e d) outros informantes que não se encaixaram nas categorias anteriores. A amostragem bola de neve (snowball) foi utilizada para compor os grupos. A pesquisa foi previamente aprovada nos comitês de ética dos 3 países. A organização e análise dos dados foi feita a partir do estabelecimento de categorias suscitadas com base na análise documental, literatura, e articulados com o objetivo da pesquisa.
Resultados e discussão: O recrutamento dos médicos cubanos realizado por Angola, Portugal e Brasil por meio de cooperação médica com Cuba se configura como importante intervenção estatal com vistas a propiciar a realização das obrigações de saúde desses estados, que apresentavam número insuficiente de médicos, especialmente na área da atenção primária, em regiões mais carenciadas e/ou vulneráveis. Contudo, os acordos bilaterais apresentam condições distintas, conforme as nações participantes.
A escolha pelos médicos cubanos, em que pese ter sido observada uma forte dimensão política nesse aspecto, nos 3 casos analisados, mostrou-se acertada, pois esses profissionais são especialmente forjados para atuar nesse tipo de missão, em que a solidariedade é o componente principal, mostrando-se colaborativos e verdadeiramente implicados com o resultado final da intervenção.
A formação médica em Cuba é a responsável pela concepção desse profissional mais voltados aos aspectos da promoção e prevenção, que se difere das escolas médicas tradicionais, que enfatizam o paradigma biomédico. Como resultado, nos processos de recrutamento, os médicos cubanos alcançaram a aprovação dos utentes, sendo especialmente referenciado o estabelecimento do vínculo médico-paciente.
Foi observada em Portugal e no Brasil, forte movimentação da classe médica contrária à vinda dos cubanos, com discurso de baixa qualidade na formação, não compreensão dos aspectos epidemiológicos, barreira linguística, a falta de liberdade do médico cubano, em diversos aspectos, especialmente no financeiro e no direito de ir e vir.
Contudo, há de se compreender que o médico cubano é forjado em realidade política, social e cultural distinta. Sendo, o aspecto da solidariedade, componente importante na sua atuação profissional, e no seu papel enquanto cidadão, corresponsável pela manutenção das políticas públicas ofertadas por Cuba por meio do seu trabalho.
Sobre o exercício da medicina pelos médicos estrangeiros, foram identificados arranjos distintos nos 3 países, mais ou menos flexíveis, de modo a não divergir da legislação vigente, mas também não inviabilizar/atrasar a atividade profissional desses médicos.
Considerações finais: O recrutamento de médicos estrangeiros por si só, não teria a eficácia pretendida se não fossem realizados os arranjos jurídico-político-institucional que propiciaram exequibilidade a proposta.
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