29/09/2019 - 13:30 - 15:00 EO-8E - GT 8 - Processo de Trabalho, Saberes e Praticas na Saúde |
31044 - REPRESENTAÇÕES DO ENVELHECIMENTO DO PROFISSIONAL DE SAÚDE E A NOÇÃO DE SI DE IDOSOS EM UMA UNIDADE BÁSICA DE SAÚDE DO CENTRO DA CIDADE DE SÃO PAULO JEANE LIMA E SILVA CARNEIRO - USP, JOSÉ RICARDO DE CARVALHO MESQUITA AYRES - USP
Introdução: O Brasil passa por um processo de envelhecimento de forma rápida e intensa. Anualmente 650 mil idosos são incorporados à população, formando um contingente de 30 milhões de idosos no Brasil (14,6% da população). Nas ciências da saúde o envelhecimento é definido como um processo sequencial, irreversível, de deterioração de um organismo maduro, tornando-o menos capaz de lidar com os estresses do meio ambiente. Segundo a Organização Mundial de Saúde o idoso é definido como o indivíduo com 65 anos ou mais, para os países centrais, e 60 anos ou mais, para os países periféricos. Contudo, a idade não é um parâmetro absoluto e o envelhecimento não se dá de forma homogênea, devendo-se tal diversidade majoritariamente a fatores ambientais e sociais, mostrando-se sobredeterminantes aos fatores genéticos. Segundo alguns autores, é a auto definição do sujeito pesquisado que orienta a determinação de qual etapa da vida em que se encontra. Desde os anos 1980 há um crescente interesse mundial nos idosos, com o desenvolvimento de políticas focadas primordialmente no bem-estar e no envelhecimento saudável. Contudo, a percepção do envelhecimento por parte do sujeito e dos profissionais envolvidos no cuidado é essencial para o sucesso prático do encontro terapêutico. Objetivos: Identificar a percepção de profissionais da saúde e de idosos e acompanhados em uma Unidade Básica de Saúde do centro da cidade de São Paulo quanto ao ser idoso e ao envelhecimento. Metodologia: Investigação qualitativa, utilizando como ferramenta a entrevista semi-estruturada sob perspectiva epistemológica desdobrada da hermenêutica filosófica de Gadamer e procedimentos compreensivo-interpretativos baseados na proposição de Ricoeur. Resultados e discussão: foram entrevistados 16 profissionais de saúde (7 Agentes Comunitários de Saúde, 2 técnicos de enfermagem, 3 enfermeiros, 2 médicos de família e comunidade, 1 geriatra e 1 assistente social) e 5 idosos. Apenas um dos idosos entrevistados considerou-se idoso. Para os demais, “O idoso é sempre o outro”, como apresentado por Debert. A auto-definição como “não idoso” foi sempre justificada pela afirmação de capacidade para realização de certas tarefas, em especial domésticas, mesmo pelos entrevistados do sexo masculino, como visto no processo de “feminização” do homem velho. Ao mesmo tempo, relatos de impossibilidade de realizar tudo o que quer (por limitação física ou imposta por familiar) indicavam que sentiam-se idosos em outros momentos. O único participante que se sentiu idoso, justificou o fato pela mudança da aparência física ocorrida em processo recente de adoecimento. Quanto ao envelhecimento bem-sucedido, para as idosas o fator de maior impacto é a presença de bons relacionamentos familiares e, para os homens idosos, a de recursos financeiros. Para os profissionais de saúde, o critério etário não é o único determinante para a identificação do sujeito como idoso. A longitudinalidade no cuidado, possibilitando identificar as alterações fenotípicas características do envelhecimento, bem como o declínio da capacidade funcional foram fatores frequentemente apresentados, condizente com o entendimento de envelhecimento das ciências da saúde. Um dos profissionais apresentou também a associação da velhice com a ligação com o passado e ausência ou minimização de possibilidades de futuro, como na perspectiva fenomenológica. Em geral, para os profissionais que moram na comunidade e visitam com maior frequência os usuários, também foram indicativos de envelhecimento o isolamento, o sofrimento e a presença maior de queixas. Nos discursos de profissionais da saúde e idosos, o ser “velho” está ligado a perdas e deterioração e não tido como um processo natural da vida, já que quando não há essa deterioração de funções, o indivíduo não é visto ou não tem noção de si como idoso. A compreensão do sentido do ser idoso deve, então, ser colocada em perspectiva histórica e temporal. Cultura, tempo histórico, classe social, trajetória de vida pessoal, educação, estilo de vida, gênero, profissão, etnia e diversas outras dimensões da vida variam para formular as heterogêneas experiências de velhice e envelhecimento. Conclusões: A noção de si como idoso, como identidade, não é permanente e nem constante. O indivíduo nota-se idoso em algumas circunstâncias e não em outras. A manutenção de realização de atividades está atrelada a valor de vida na terceira idade e representa o processo de resistência ao envelhecer. A solidão e o isolamento social são marcadores do envelhecimento no discurso dos idosos, além de ser uma das principais dificuldades encontradas pelas equipes de Saúde da Família para realização do cuidado. O entendimento de como se dá o processo de envelhecimento e as formas de resistência a esse processo são particulares a cada indivíduo e deve ser contabilizado nas propostas assistenciais quando se visa uma co-construção de práticas de saúde que sejam conciliadoras com a vida.
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