30/09/2019 - 13:30 - 15:00 EO-7D - GT 7 - Cuidado em adoecimentos e condições crônicas complexas |
29255 - QUEM CUIDA DE QUEM CUIDA? : NARRATIVAS E ENCONTROS DE CUIDADORES FAMILIARES DE IDOSOS COM SÍNDROMES DEMENCIAIS CORINA LOPES RIBEIRO - PREFEITURA DE SANTOS, MARCIA MARIA PIRES CAMARGO NOVELLI - UNIFESP, ANDREA PEROSA SAIGH JURDI - UNIFESP
O aumento na expectativa de vida eleva a possibilidade da população ter que conviver com as doenças crônico-degenerativas. Dentre elas, as síndromes demenciais causam impacto socioeconômico, na estrutura familiar, na sociedade e no sistema de saúde, configurando-se um importante problema de saúde pública. Tais síndromes são as principais causas de incapacidade no envelhecimento, exigindo cuidados de terceiros, como o auxílio nas atividades instrumentais e atividades básicas da vida diária. O cuidado comumente é oferecido pela família, geralmente por um familiar do gênero feminino, e sofre influência das experiências pessoais e práticas socioculturais, além da ressignificação do idoso com demência pelo familiar. Esse cuidado é permeado por relações afetivas atravessadas por histórias de vidas, conflitos, afetos, interdições, valores, obrigações e esperanças compartilhadas. Para Heidegger, o Dasein (ser-aí) é essencialmente cuidado e tem o sentido da solicitude e da angústia, como possibilidades fundamentais e conflituosas. O ‘cuidado angústia’ (sorge) refere-se à luta de cada um para sobreviver e conquistar uma posição conveniente em relação aos outros seres humanos. O ‘cuidado solicitude’ (fürgsorge) retrata acalentar, voltar-se para, o interessar-se pela humanidade e pela Terra. Enquanto o cuidado como angústia move o homem na luta pela subsistência, o cuidado como solicitude mostra as potencialidades do humano. O objetivo desse estudo foi compreender o significado do cuidado para os cuidadores familiares de idosos com síndromes demenciais, identificando as dificuldades e potencialidades da relação entre os cuidadores familiares e os idosos. Utilizou-se o método qualitativo com a realização de entrevista semiestruturada, delimitando-se cinco questões norteadoras para a produção de dados e construção de narrativas de história de vida. Participaram da pesquisa seis cuidadores familiares de idosos usuários do Ambulatório de Especialidades Médicas de uma cidade do litoral de São Paulo. A análise de dados foi realizada por meio de comentários e interpretações, baseados nos pressupostos de Heidegger e da Daseinsanalyse a partir das narrativas de história de vida. As cuidadoras relataram a angústia diante da perda das possibilidades do idoso com a progressão da doença. Sentem-se sozinhas e sobrecarregadas ao realizar o cuidado e, independente do tipo ou quantidade de ajuda realizada, há dificuldade em perceber a colaboração de terceiros. Em contrapartida, demais familiares são descartados ou desresponsabilizados por desenvolverem outras atividades como o trabalho ou cuidado com os filhos. Percebe-se um conflito entre o cuidado idealizado e o cuidado possível, como a obrigação de ter paciência constantemente. Foram atribuídos ao cuidado significados como obrigação, dívida, dever, satisfação pelo bem estar do idoso e consequentemente o próprio bem estar, retribuição e amor. As histórias de vidas revelaram relações anteriores de afetos e distanciamentos, em que o cuidado possibilitou um novo sentido, como a aproximação entre cuidadora e idoso e a intensificação de sentimentos como o amor. O cuidado também se desvelou como uma oportunidade de descoberta de si mesmo e crescimento. A doença acarretou a restrição do idoso e dos cuidadores, ao limitar a existência e o modo de ser-com-os-outros. No decorrer do processo de adoecimento surgiram dificuldades em como lidar com a progressão da doença; a busca de informação e apoio se dava por meios de sites, filmes ou reportagens dessa temática ou pela troca de experiências com pessoas próximas que vivenciavam a mesma situação. A rede de cuidado precisava ser ampliada, envolvendo a abordagem de outros profissionais de saúde e outros modos de cuidado, não se restringindo apenas às consultas, mas possibilitando o atendimento integral do idoso e da família. Os dados da pesquisa motivaram a constituição de um grupo para cuidadores familiares. Desde outubro de 2018, o grupo “Quem cuida de quem cuida?”, realizado no mesmo local da coleta dos dados, favorece a troca de experiências, expressão dos sentimentos e informações entre os participantes e profissionais de saúde, na busca de outras possibilidades em relação ao cuidado com o idoso e consigo mesmo. No decorrer dos encontros, os cuidadores relatam a importância do grupo para compartilharem as dificuldades de ser cuidador, sentindo-se acolhidos e expressando o que sentem, sem a preocupação de serem julgados. As experiências dos outros participantes e as reflexões coletivas são relevantes para o cuidado consigo mesmo e na jornada de cuidado com o seu familiar. O grupo, como dispositivo de cuidado, procura romper com o saber especializado, valorizando a experiência do usuário e seus familiares, lançando outras possibilidades de cuidado e coexistência entre os cuidadores familiares e os profissionais de saúde.
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