29/09/2019 - 15:00 - 16:30
CB-7B - GT 7 - Os serviços de saúde e os adoecimentos de longa duração: práticas no hospital, no domicilio e na atenção básica |
30648 - A “DOR DA ALMA” VISTA PELA ATENÇÃO PRIMÁRIA A SAÚDE: RELATO DE EXPERIÊNCIA
LIGIA MOURA DE SOUZA - CSEB/FMUSP, RENEIDE RODRIGUES RAMOS - CSEB/FMUSP, ALESSANDRA DO CARMO PIMENTA - CSEB/FMUSP, YESSAME MARIA GREGORIO CORREA - CSEB/FMUSP, KELLY CRISTINA MARCANDALLI - CSEB/FMUSP
CONTEXTUALIZAÇÃO:
Relato de experiência vivenciado em um serviço escola vinculado à Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, inserido no Programa de Atenção à Saúde do Envelhecimento (PASE). Este programa pretende atender o idoso de forma integral com olhar para suas demandas, necessidades de saúde e valorizando sua história de vida e vínculo familiar. O objetivo deste trabalho foi entender a dor física, considerando a saudade e o sofrimento de longa duração trazidos por uma usuária atendida nesta Unidade Básica de Saúde.
DESCRIÇÃO:
MDS, 76 anos, natural do Piauí, negra, viúva, sem filhos, residente em São Paulo há 50 anos e usuária do serviço desde 2005. Apresenta quadro recorrente de dores lombares, abdominais e torácicas, que persistiram, sem melhora, por todos os atendimentos clínicos realizados. Este quadro exacerbou-se após um acidente doméstico: uma queimadura corporal, identificado pela usuária como um evento marcante em sua vida, devido às limitações para atividades laborais. Diante deste contexto, a Equipe de Enfermagem do PASE percebeu que ao longo do tempo as queixas de dores relatadas pela usuária tinham relação com sofrimento, tristeza e solidão. Há de se considerar que a mesma teve uma perda significativa em 2010, morte de seu cônjuge, a qual a impulsionou solicitar ajuda para reencontrar sua família, que não tinha contato há duas décadas, com o intuito de ter amparo e fortalecimento para resignificar sua vida.
A pouca resposta ao tratamento clínico para as dores apresentadas por MDS, fez a equipe do PASE perceber que o reencontro da usuária com seus familiares poderia melhorar significativamente seu quadro e iniciou uma mobilização para encontrar a família que mora no Nordeste.
Através de contato telefônico com uma rádio do Piauí, que a usuária referiu ser próxima à casa de seus parentes e que fez um anúncio público, obtivemos a resposta de um familiar. Este relatou que a família também estava à procura de MDS e colocou a equipe em contato com familiares que residem em São Paulo para promover o encontro e reaproximação entre as partes.
O encontro foi realizado durante um atendimento de enfermagem na unidade de saúde, sem que a usuária tivesse conhecimento da presença de sua sobrinha e sobrinha neta, moradoras em São Paulo. Este encontro foi de muita emoção, sentimentos aflorados e resgate de uma família distanciada pela vida por décadas. MDS verbalizou que a dor da alma que sentiu durante tantos anos devido à saudade e solidão foi suprimida por este encontro familiar que trouxe alegria, alimento para sua alma e resgatando a vontade de viver.
PERÍODO DE REALIZAÇÃO:
Atividade desenvolvida de janeiro de 2018 a dezembro de 2018.
OBJETIVO:
Entender a dor física considerando a saudade e o sofrimento de longa duração.
RESULTADOS:
A reaproximação da usuária a seus familiares fez com que a equipe observasse que a dor física ficou reduzida e foi menos valorizada por MDS. Percebeu-se também uma melhor auto-estima, alegria e que o sentimento de vazio e solidão foi substituído pelo pertencimento a uma família.
APRENDIZADO:
Com esta experiência a equipe do PASE percebeu que as queixas físicas muitas vezes estão vinculadas ao lado emocional, e que a escuta, acolhimento e valorização da história de vida de cada ser humano torna-se fundamental para o atendimento integral. Identificou-se também que o sentimento de pertencer a uma família pode preencher o vazio trazido pela solidão.
ANÁLISE CRÍTICA:
Durante o atendimento na Atenção Primária a Saúde, temos como objeto de trabalho o indivíduo, a família e a comunidade onde vive e este eixo integrador deve ser levado em consideração por todos os profissionais envolvidos no cuidado.
Faz-se necessário conhecer a história de vida de cada usuário e suas diversas demandas para além das queixas clínicas, de modo que possa se propor um cuidado mais integrador, valorizando a subjetividade, sofrimentos vivenciados e experiências acumuladas como fatores facilitadores para a atuação da Atenção Primária.
|
