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Grupos Temáticos

29/09/2019 - 13:30 - 15:00
EO-11B - GT 11 - Fronteiras epistemológicas e teórico-metodológicas

30429 - DESCOLONIZAÇÃO DO SER, ECOLOGIA DE SABERES E SAÚDE COLETIVA
MARIA BEATRIZ LISBÔA GUIMARÃES - UFPE, MARTA PIMENTA VELLOSO - ENSP/FIOCRUZ, JOÃO ARRISCADO NUNES - CES/UC


Este trabalho visa contribuir para o diálogo entre as abordagens pós-coloniais e o campo da Saúde Coletiva. Constitui-se em estudo de natureza teórico-conceitual com o objetivo de aprofundar as reflexões da produção do conhecimento sobre a descolonização do ser.
A colonização do ser foi pensada, em princípio por Fanon e Maldonado-Torres, a partir da relação entre a modernidade e a experiência colonial. Ao adotar uma perspectiva universalista, o discurso moderno fixou as identidades e subjugou umas às outras, conferindo ao colonizador branco europeu o topo da hierarquia, uma vez que as colônias foram declaradas vazias ou desabitadas de gente, sem donos (na medida em que possuem uma cultura que não tem entendimento do que seja a propriedade privada), que não têm valores espirituais e, por isso, são privadas de “racionalidade”. A modernidade nunca existiu, nem pode vir a existir, sem a dimensão colonial que cria essas zonas de não-ser, segundo o termo de Fanon.
Em contraposição à essa perspectiva, ainda presente atualmente, que não considera as diferenças étnicas, subalterniza e invisibiliza os povos indígenas e negros, a descolonização do ser procura valorizar a interculturalidade, permitindo que os sujeitos possam construir e ver reconhecidas suas identidades de acordo com os seus contextos e possam se fortalecer na interlocução.
Um bom exemplo de descolonização do ser e de afirmação e respeito às relações interétnicas vem do movimento indígena do Bien Vivir, que culminou com a refundação do Estado Nacional como Estado Plurinacional na Bolívia e representou a ruptura com o Estado oligárquico - com sua visão colonial e homogênea. Viabilizou-se uma perspectiva que favoreceu a diversidade étnica na descentralização e na reorganização do poder local, formalizando de forma constitucional os direitos coletivos. Tais direitos, que advém do termo Pachamama (Mãe Terra), constituem a base para as relações de poder que colocam em xeque a apropriação privada de recursos vitais como a água, a terra, os minerais e as plantas. Para o povo andino, esses recursos naturais estavam lá antes da presença humana e continuam a ser a base da sobrevivência humana em todos os sentidos. Assim, o que está sendo proposto é a reciprocidade entre os seres humanos e a natureza pensada a partir da prioridade do bem comum e da revalorização da prática comunitária.
Para avançarmos no sentido da descolonização do ser no campo da Saúde Coletiva é importante considerar outros saberes e práticas de cuidado à saúde afinados com a perspectiva interétnica, ecossocial e vitalista. A noção de vitalismo abrange diferentes correntes que têm em comum a referência a um princípio vital indissociável do espírito, e que governa os fenômenos da vida. A saúde é concebida de forma holística como o resultado da harmonia ou equilíbrio entre o corpo e o espírito e entre o sujeito e o seu meio ambiente. A dimensão subjetiva da existência humana é valorizada. O processo de adoecimento é apresentado como uma oportunidade para que o organismo se reequilibre. Por isso é crucial o estímulo à participação ativa do sujeito frente a sua doença e ao processo de autoconhecimento.
Em consonância com esses princípios, de acordo com a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PNPIC) e para além dela, propomos a incorporação da religiosidade/espiritualidade e das artes ao campo da Saúde Coletiva, na medida em que se constituem em práticas terapêuticas. A experiência religiosa/espiritual, além de produzir mutações no campo da subjetividade e de estar, em muitos casos, associada à busca de autoconhecimento, é em si mesma produtora de significados, quando se compreende a experimentação como uma questão central que articula os pontos de vista ético, cultural, religioso e político. Semelhante ao mito Pachamama, diversas religiões de matriz afro-brasileira, como a Umbanda, o Candomblé e a Barquinha, e outras pertencentes à cultura indígena, como a União do Vegetal e o Santo Daime, possuem uma cosmovisão ecológica que associa Deus à Natureza e valorizam as relações interétnicas em prol do bem comum.
A arte é necessária para o indivíduo sentir-se pleno. O seu desejo recalcado pode ser expressado ou libertado por meio da criação da obra. Assim o indivíduo percebe que só pode atingir sua plenitude ao apoderar-se das experiências alheias que potencialmente lhe dizem respeito ou que poderiam ser dele. A arte é o caminho imprescindível à interação do indivíduo com o todo – ela reproduz a imagem da infinita capacidade humana para associações, circulação de ideias e experiências.
Dos encontros e articulações dessas dimensões emerge a ecologia de saberes que abre caminho à descolonização na saúde. A Saúde Coletiva tem um papel central a desempenhar nesse processo, mas falta ampliar a sua concepção de saúde incorporando a sua diversidade e pluralidade de saberes – científicos e não-científicos – e práticas sociais.

local do evento

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