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29/09/2019 - 15:00 - 16:30
EO-11D - GT 11 - Fronteiras epistemológicas e teórico-metodológicas

31076 - O SABER-CORPO E A BUSCA PELA DESCOLONIZAÇÃO DA SAÚDE COLETIVA
FLÁVIA DE ASSIS SOUZA - INSTITUTO DE MEDICINA SOCIAL/UERJ


Tem sido cada vez mais debatido, no âmbito acadêmico, os inúmeros efeitos produzidos pelo evento da colonização dos povos imposto pelos países europeus a partir do século XVI, seja no âmbito econômico, cultural, político ou social. Neste ensaio faço uma reflexão a respeito do ‘’legado’’ da colonização europeia tanto quanto no que se refere aos reflexos deixados no ‘inconsciente’ coletivo da existência de um corpo que chamo de ‘ideal’, quanto ao questionamento sobre quem está autorizado a produzir o conhecimento. Aníbal Quijano cunhou dois conceitos que nos ajuda a entender esses dois aspectos. O de colonialidade do poder que, segundo o autor, promoveu uma classificação da população mundial, ancorada na noção de raça. E o segundo conceito que é a colonialidade do saber, que está ligado a quem tem legitimidade para produzir saberes e quais saberes são legitimados. Parto do princípio de que o corpo é fonte de produção de saberes, pois, carrega as marcas de inúmeras estruturas de opressão que se incide sobre ele. O presente trabalho, ao fim e ao cabo, visibiliza o debate sobre três questões interligadas. A primeira é sobre a criação de corpos ideais arquitetado pelo colonialidade do poder, em outras palavras, como corpos brancos cisheterossexuais se transformaram na norma, ou no corpo ‘ideal’. O segundo aspecto discutido é o que nos informa sobre quem tem legitimidade de produzir conhecimento e quem não tem. E a terceira questão a ser discutida é sobre os corpos considerados fora da norma. Reflito o quanto a existência de um constructo de corpo ‘ideal’ influencia nas políticas e práticas de Saúde Coletiva. Em resumo, como esses corpos fora da norma são tratados no Sistema Único de Saúde (SUS)?
E, por que a virada decolonial no pensamento sanitário é importante? Porque, dessa maneira, assumiríamos que o evento da colonização introduziu a ideia de raça como elemento estrutural das relações políticas, econômicas e sociais no país. E, a partir daí, instaurou a ideologia de raça superior e inferior, estabelecendo o racismo e outras formas de opressão como o modus operandi do Estado, das instituições, das leis e das relações sociais como um todo. Tendo o racismo e a cishetronormatividade como estruturas que organizam a vida na sociedade brasileira, o sistema de saúde, e por consequência, as políticas de saúde, não passaram ilesas quanto a ingerência dessa estrutura.
A minha proposta assenta-se, portanto, na emergência de pensarmos políticas e práticas de saúde a partir de um sujeito que passou pelo evento da colonização sob o signo da violência, ou seja, negros e índios. E isso é importante porque a raça ganha centralidade em nossas elaborações de políticas de saúde. Ou seja, a base para pensarmos saúde estaria na raça tendo no horizonte a totalidade do sujeito que integraria questões como gênero e sexualidade. A classe, a meu ver, não se descola da raça, no caso do sujeito colonizado racializado, raça é classe, como nos adverte Angela Davis13.
O segundo movimento imprescindível no sentido da virada decolonial no campo da Saúde Coletiva está relacionada à descolonização dos saberes e corpos. Significa dizer que é necessário imprimir mudanças na formação acadêmica dos pensadores da saúde. Apesar da aguda crítica que o campo da Saúde Coletiva faz a medicina, a grade curricular dos cursos da pós-graduação ainda é muito branca. Temos poucas disciplinas que pautam relações étnico-raciais, isto é, ainda persiste nas grades curriculares disciplinas cujas referências são preponderantemente de autores europeus. Estou dizendo que não se tem discutido, nas disciplinas do curso de pós-graduação em Saúde Coletiva, o quanto a raça molda diferentes maneiras de olhar o mundo. E o quanto é rica as reflexões de autores negros sobre os efeitos do racismo em corpos e mentes desse sujeito. Autores que revolucionaram o pensamento sociológico como: Frantz Fanon, Clovis de Moura, Abdias do Nascimento, Lélia Gonzalez, Beatriz do Nascimento, entre muitos outros, que trouxeram o ponto de vista do negro para o interior do pensamento político brasileiro, mas que, infelizmente, ainda não alcançaram as bibliografias do campo da saúde. Estudantes passam pelos cursos de Especialização, Mestrado e Doutorado sem sequer ouvir falar de obras essenciais desses autores. Por outro lado, ninguém sai do curso de pós-graduação em Saúde Coletiva sem entrar em contato com textos de autores como: Marx, Foucault e Weber.
Em síntese, trilhar o caminho rumo à descolonização do campo da Saúde Coletiva, e consequentemente, das políticas e práticas em saúde, significa repactuar o projeto de nação que foi introjetado pelo colonizador europeu há, pelo menos, quinhentos anos. Práticas racistas que até os dias hoje acontecem nos sistemas de saúde é encoberta pelo mito da democracia racial, e que precisa urgentemente ser derrubado.

local do evento

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