28/09/2019 - 15:00 - 16:30 EO-11A - GT 11 - Trabalhos de Interesse Introdutório ao GT |
30005 - PRÁTICAS DE SAÚDE EM TERRITÓRIOS E SUJEITOS VULNERABILIZADOS EM SITUAÇÃO DE RUA: UMA ABORDAGEM SOBRE OS (NÃO) DIÁLOGOS EPISTEMOLÓGICOS EM CENÁRIOS DE EXCLUSÃO ROBERTA GONDIM - ENSP/FIOCRUZ, LEANDRO PIRES GONÇALVES - UFRJ, LUCAS FREIRE - MUSEU NACIONAL/UFRJ, LÍVIA NASCIMENTO - ENSP/FIOCRUZ, AMANDA RODRIGUES - ISC/UFF
Apresentação/Introdução: Correntes de pensamento decolonial contemporâneo têm contribuído para problematizar a “cumplicidade entre o projeto político, econômico e científico da modernidade europeia com as relações coloniais de poder estabelecidas desde o século XVI, e com os imaginários sociais construídos” (Grosfoguel, 2007). Envolve o entendimento dos espaços das ‘conquistas’ coloniais, como espaços do “não ser” e da não propriedade (Fanon, 1961). Um pilar desse poder é a classificação das populações do mundo a partir da noção de raça – “construção mental que expressa a experiência básica do domínio colonial e permeia o exercício do poder mundial eurocêntrico. Sustenta-se na imposição de uma classificação racial/étnica como pedra angular do poder, opera em planos materiais e subjetivos, configurando novas identidades societais da colonialidade: índios, negros, amarelos, brancos, mestiços” (Quijano, 2010). A produção de identidade pela sua negativa, pela subalternização e apagamento de sujeitos, limita e extermina formas e estar no mundo (Fanon, 1961). A ciência moderna elabora e institucionaliza modos de ordenação social e de produção de conhecimento: medição, objetificação do cognoscível, ordenamento dos espaços privados (Foucault, 1999). A Modernidade, como um projeto de colonização espaço-temporal de referência europeia embasa a produção de bases universalistas eurocêntricas “aqueles que adoptam o discurso da modernidade tendem a adoptar uma perspectiva universalista que elimina a importância da localização geopolítica.” (Maldonado-Torres, 2010). No passado atrelada ao projeto de colonização, hoje ao projeto da colonialidade, é entendida como opressão epistêmica, jurídica, política e econômica e das formas de estar no mundo” (Mignolo, 2003: 632). A biomedicina é parte da ciência ocidental moderna, seus dispositivos não são artefatos de uma neutra e padronizada aplicação do conhecimento científico, são influenciadas pelos interesses e pelo domínio sobre o mundo natural e universalização de seus postulados, reivindicando a legitimação da interpretação do que conta como verdade. O sucesso dessa ‘ciência’ em forma preponderante de conhecimento é explicada não só por razões epistemológicas, mas por fatores econômicos e políticos. A ‘acumulação seletiva de sucessos’ – ocultamento das controvérsias na construção do conhecimento e o epistemicídio – que inferioriza ou destrói demais formas de saberes em nome do processo de dominação, são importantes chaves analíticas. Objetivos: Problematizar políticas e práticas de saúde, vis a vis às noções de pobreza e vulnerabilidade, situando-a enquanto problema social. Buscou-se compreender limites e possibilidades das práticas de saúde junto à populações vulnerabilizadas, especialmente às que se encontram em situação de rua, sob a perspectiva do racismo e das necessidades em contraste com as diretrizes biomedicalizantes presentes em protocolos como o do tratamento poliquimioterápico para a tuberculose e o antirretroviral para AIDS. Metodologia: Etnografia realizada por pesquisadores das ciências sociais em quatro territórios e equipes de Consultório na Rua, ao longo de seis meses. Seguir os atores do cuidado significou estar em contato com a produção cotidiana de práticas de saúde em cenários de exclusão, precariedade, violência e morte. Realizou-se também entrevistas narrativas com gestores da política nas três instâncias de gestão da APS. Resultados e discussão: Práticas de saúde operadas por equipes de saúde nas ruas, os encontros por estas estabelecidas, representam o terreno sobre o qual o estudo debruçou-se, trazendo elementos importantes para repensar a possibilidade de pontes dialógicas entre normatizações, protocolos, dispositivos biopolíticos da saúde pública, conhecimentos situados e práticas emancipatórias em saúde. Percebe-se que os sentidos assumidos pelas práticas nas diferentes equipes, relacionam-se com os contextos nas quais estão inseridas, bem como com as concepções e racionalidades dos profissionais, conformando seus processos de trabalho. Cada equipe acompanhada atua de maneira diferenciada, dialogando mais aproximada ou distanciadamente tanto das diretrizes da política, quanto das necessidades colocadas pelo contextos sócio, territorial e subjetivos. Conclusões/Considerações Finais: O dispositivo do Consultório na Rua permanece na agenda governamental, apesar da conjuntura de desmonte das políticas sociais, em especial da APS. Ainda que as maneiras de atuar das equipes sejam diferenciadas e guardem relação com alguns elementos do contexto, entretanto,as práticas ainda mantêm registros ético-morais, além de reificar, no cotidiano do processo de trabalho, referências biomedicalizantes do cuidado. Essa leitura indica os limites nos diálogos (im)possíveis entre os sentidos da exclusão, do ‘estar na rua’, como pressuposto de corpos racializados e vulnerabilizados, e a imposição de diretrizes e métricas da matriz biomédica.
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