28/09/2019 - 15:00 - 16:30 EO-11A - GT 11 - Trabalhos de Interesse Introdutório ao GT |
31002 - PERIFERIA, AGROECOLOGIA E CIDADE - TRABALHO COM JOVENS ARTISTAS DA ZONA NORTE CARIOCA PAULO CASTIGLIONI LARA - UFF/PPCULT
APRESENTAÇÃO: Relatarei aspectos da dissertação de mestrado em Cultura e Territorialidades: "Jogadas pela periferia - experiência com audiovisual junto a jovens artistas da zona Norte carioca", realizada entre 2016 e 2018. Atuando profissionalmente no campo da comunicação e saúde, na região conhecida como Complexo do Alemão, pude estabelecer contato com uma organização não governamental (ong) que coordena um pequeno grupo cultural de jovens moradores. Eles estavam voltados para ações de criação artística e ensaios de uma peça teatral, cuja narrativa conta fatos das lutas da ong pela preservação da vegetação da Serra da Misericórdia (maciço que predomina no relevo desta região). A peça foi produzida e encenada em parceria com a escola onde os jovens estudavam, na rede pública estadual, e no âmbito de projetos culturais da ong, especialmente voltados à difusão de atividades de produção e conceitos da agroecologia urbana.
OBJETIVOS: Frente à complexidade e à potencialidade destas experiências na periferia carioca, busco colocar em perspectiva algo dos percursos e falas dos jovens artistas - como sujeitos significantes do espaço/tempo - face às distintas atuações da ong e da escola. Viso assim, confrontar ambos - jovens, ong e escola - em suas polarizações com o discurso hegemônico, representado nas ações do Estado e na produção da grande mídia. No entrecruzamento de conflitos, negações e negociações construídos política, histórica e midiaticamente sobre o corpo da cidade e de seus moradores, faço 3 perguntas como guia da apresentação:
O que os jovens falam sobre seus percursos ou como se expressam sobre suas relações na cidade?
Que dramaturgia e papéis sociais aparecem construídos na peça teatral?
Que sentidos discursivos estão presentes em falas sobre "preservação do meio ambiente", "ecologia" e "agroecologia"?
METODOLOGIA: Registrei em vídeo diversas cenas durante o processo de criação e ensaios da peça teatral, gravando também diferentes ações individuais dos jovens, entrevistando-os em diferentes percursos pela cidade. Ao rever as mais de 20 horas de material bruto, fui selecionando trechos, montando pequenas sequências e apresentando-as aos próprios jovens, quando eles refletiam sobre as suas impressões diante dos vídeos apresentados. Tal metodologia permitiu que pudéssemos experimentar uma forma de edição compartilhada sobre os registros audiovisuais produzidos. Por outro lado, esta prática também facilitou meu trabalho de escolha das falas e diálogos dos jovens, permitindo a construção de comparações e analogias com as representações sobre o cenário e sujeitos da periferia presentes no discurso hegemônico. Assim, pude cotejar fatos, personagens e políticas da cidade, enfocando ações do Estado e também da mídia, colocando em análise elementos de narrativas audiovisuais produzidas ou veiculadas por grandes empresas, tais como em produtos da Rede Globo e do Google, além da Bayer, Basf e Walt Disney, com o objetivo de confrontar imagens e representações dominantes, face às táticas e subversões, jogadas pela periferia. Importante citar, como principais referências teóricas operadas na pesquisa, a aproximação com Michel de Certeau, na polaridade entre "estratégia e táticas", Norbert Elias entre "estabelecidos e outsiders", e na análise de discurso (AD) de Eni Orlandi, especialmente sobre os conceitos de "ideologia", "história" e "sujeito", que atuam sob a opacidade da língua e do que está em discurso.
RESULTADOS: As falas dos jovens refletem e acionam nossa ideia habitual de construção biográfica do "eu", conforme conceituação de Pierre Bourdieu. A escola, a ong e o bairro são referências concretas em suas redes de relações no espaço da cidade, onde situam suas linhas cronológicas de vida, entre passado, presente e futuro. Suas trajetórias dividem-se em atividades de estudo, trabalho e prazeres, vividos e administrados em conflitos e táticas, individuais e coletivas. As referências, os sonhos, os medos e as identificações passam por jogos de linguagem e universos imaginários que podem circular do esporte à música ou entretenimento. Ao acompanhar os ensaios da peça teatral e sua estruturação no gênero do melodrama, pude ampliar as associações e comparações com outros produtos midiáticos, do cinema à TV e publicidade da internet.
CONSIDERAÇÕES FINAIS: Dentre estas confrontações discursivas, destaca-se como o discurso de preservação do meio ambiente e o culto à existência de paraísos ecológicos aparecem atrelados à estética produtivista agroindustrial com argumentos numéricos fatalistas e estreitas visões cientificistas. Em campo semântico e tecnológico diametralmente oposto, a agroecologia traz propostas fundamentadas no fértil relacionamento entre conhecimentos tradicionais populares e tecnologias sociais alternativas que zelam pela reprodução da sociobiodiversidade. Importante considerar, por fim e princípio, como a comunicação e a saúde vivem bem com o poder de reproduzir e deslocar sentidos.
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