29/09/2019 - 15:00 - 16:30 CB-20B - GT 20 - IST/HIV/Aids, prevenção, diagnóstico e tratamento |
31063 - GERAÇÃO INDETECTÁVEL: ESTUDO ANTROPOLÓGICO SOBRE O TRATAMENTO COMO PREVENÇÃO (TCP) COM PESSOAS VIVENDO COM HIV NA CIDADE DE JOÃO PESSOA GEISSY DOS REIS FERREIRA DE OLIVEIRA - UFPB, MÓNICA LOURDES FRANCH GUTIÉRREZ - UFPB, LUZIANA MARQUES DA FONSECA SILVA - UFPB
Iniciada em agosto de 2018, e ainda em execução, esta pesquisa tem por foco a implementação do Tratamento como Prevenção (TcP) no Estado da Paraíba, a partir da observação do cotidiano de um dos hospitais de referência em tratamento para o HIV/Aids no Estado: o Complexo Hospitalar de Doenças Infecto-Contagiosas Clementino Fraga, em João Pessoa. A pesquisa faz parte de um projeto maior que se propõe investigar o uso cotidiano das técnicas preventivas baseadas no uso de antirretrovirais (TARV) - PEP, PrEP e TcP. Este projeto surge a partir das inquietações que o campo do HIV/Aids nos provoca enquanto antropólogos, e das possibilidades analíticas desta questão, tendo em vista o modo como o HIV/Aids se insere na vida cotidiana na contemporaneidade. Escolhemos nos debruçar sobre as novas tecnologias preventivas por entendermos que a prevenção constitui um dos terrenos onde tem se concentrado boa parte das inovações científicas, bem como as esperanças e polêmicas, na última década.
No recorte aqui tratado, nos propomos a investigar se o TcP é adotado como estratégia de prevenção, e se sim, de que forma, o que implica conhecer o ponto de vista de médicos infectologistas e demais profissionais e trabalhadores de saúde do Hospital Clementino Fraga acerca da TcP e averiguar até que ponto essa perspectiva está presente em suas orientações junto aos usuários. No decorrer da pesquisa, Investigaremos também as experiências de pessoas HIV+ atendidas no Complexo Hospitalar de Doenças InfectoContagiosas Clementino Fraga e que estão em TARV faz, pelo menos, cinco anos em relação ao uso cotidiano do medicamento. Trata-se de perceber qual a dimensão do TcP na vida destas pessoas. No tempo da pesquisa de campo, entrevistando atores-chaves no campo do HIV/Aids no Estado da Paraíba e realizando observação participante no Hospital Clementino Fraga, temos nos deparado com a ausência do Termo Tratamento como Prevenção ou sua sigla TcP. O que não implica dizer que ele não aconteça neste serviço, embora não esteja presente nominalmente, nem entre funcionários/as do referido serviço de saúde, nem no discurso da Gerência de IST’S/AIDS/Hepatites Virais do estado. No último Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Manejo da Infecção pelo HIV em Adultos, do Ministério da Saúde (2018) o “TARV (Tratamento antirretroviral) como Prevenção”, é brevemente apresentado como uma tecnologia preventiva que “pode reduzir significativamente a transmissão sexual do HIV”, a que se segue forte recomendação do uso da camisinha, e orientações aos profissionais de saúde na possível transmissão desta informação às pessoas que vivem com HIV/Aids que atendam ao seguinte perfil: adesão ao tratamento, indetecção para o HIV há no mínimo seis meses, e ainda, não apresentar outra IST. Assim se apresenta, então, o discurso oficial acerca do TcP ou TARV como Prevenção. Entre os profissionais de saúde do Ambulatório de Infectologia do Clementino Fraga, participantes desta pesquisa, uma quarta condição tem emergido na observação como requisito implícito para para que a pessoa vivendo com HIV seja informada a respeito do TARV como Prevenção, é que “sejam pessoas bem entendidas, [logo] não é para qualquer pessoa”. O que significa ser essa “pessoa bem entendida” não fica explícito, no entanto, aparência e nível educacional (questões indissociáveis de classe social) parecem ser seus pilares.
Este cenário nos coloca a seguinte questão: por que o TcP não é uma política preventiva democrática e posta, inclusive, a pessoas que não vivem ou convivem com HIV, tendo em vista seu potencial de redução do estigma e demais impactos nas vidas de pessoas viventes? O referido protocolo, o citado manejo dos profissionais de saúde, e as entrevistas com atores-chaves, igualmente receosos, nos dão alguns indícios sobre a complexidade envolvida na efetiva implementação do TcP; a cautela na compreensão do TcP como uma medida preventiva, de fato, na medida em que acreditam “poder reduzir” a transmissão sexual por HIV, mas não eliminar completamente o risco de infecção, compreensão que difere da campanha internacional Indetectável = Intransmissível; o receio de que a informação seja compreendida só parcialmente, fazendo com que as pessoas deixem de aderir ao TARV e ao uso da camisinha, ou ainda dando ensejo para entendimentos "errados" como a "cura da Aids" que terminariam por estimular comportamentos de risco para a própria saúde a de eventuais parceiros.
Tem-se mostrado evidente que o TcP, nominalmente, não se constitui como uma política de prevenção ao HIV/aids do Complexo Hospitalar Clementino Fraga. Comparativamente, é a PrEP, além do método tradicional da camisinha, que tem se mostrado o método preventivo por excelência no enfrentamento à infecção por HIV neste momento, o que nos leva a pensar que, em matéria de prevenção e HIV/aids, os métodos que implicam em mais (mais medicalização, mais insumos, mais farmacologização) são preferidos aos que apregoam menos.
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