28/09/2019 - 13:30 - 15:00 EO-32B - GT 32 - Crise, precarização do trabalho e políticas de saúde |
29767 - ESTRATÉGIA DE SAÚDE DA FAMÍLIA E GERENCIALISMO: ACS ENTRE AS METAS E O PADECIMENTO DO TRABALHO EM SAÚDE GUILHERME AUGUSTO BARCELLO COSTA - EPSJV, TAÍS FOLGOSA DA SILVA - SMSRJ, SIMONE DE SOUZA PIRES - SMSRJ, MÁRCIA CAVALCANTI RAPOSO LOPES - EPSJV
Introdução: O SUS tem a Estratégia de Saúde da Família (ESF) como escolha para expansão da Atenção Primária em Saúde no país. Os agentes comunitários de saúde (ACS) são profissionais com formação média, oriundo das comunidades onde trabalham, responsáveis pela conexão entre a equipe de Saúde da Família e a população residente nas comunidades assistidas, valorizando as relações com a comunidade, valores sociais e culturais, prevenindo doenças e promovendo a saúde. A Reforma dos Cuidados em Atenção Primária em Saúde (RCAPS) feita pela Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro entre 2009 e 2016, ampliou a cobertura da ESF, mas, ocorreu alinhada com recomendações neoliberais. Introduziu as Organizações Sociais no cenário da APS Carioca para a prestação de serviços do SUS, e aplicação do modelo gerencialista, que insere no serviço público elementos da gestão empresarial privada, como o trabalho com muita cobrança por resultados de indicadores e metas. O gerencialismo pode provocar mudanças/efeitos para os trabalhadores e aqueles que não conseguem se adaptar a elas podem desenvolver algum tipo de sofrimento ou mesmo adoecimento. Acreditamos que a aplicação desse modelo ao trabalho de profissionais ACS afete a qualidade do trabalho realizado na ESF e tenha efeitos para o trabalhador.
Objetivo Geral: Analisar as mudanças ocorridas no trabalho dos ACS a partir da chamada Reforma dos Cuidados em Atenção Primária em Saúde do Município do Rio de Janeiro.
Metodologia: Estudo exploratório qualitativo em 03 etapas. 1)Entrevista com servidora da APS para elaborar o cenário da APS do Rio de Janeiro antes da RCAPS; 2)Análise de documentos e artigos referentes à RCAPS, para elaborar cenário da APS do Rio de Janeiro com a RCAPS; 3)Entrevistas 03 ACS antigas (que iniciaram o trabalho antes da RCAPS) e mais 03 ACS recentes (que já iniciaram a carreira como ACS depois do início da RCAPS). As entrevistas foram analisadas com a técnica da análise de conteúdo.
Resultados: A análise das entrevistas das ACS indicou que as RCAPS ampliou o acesso das pessoas à ESF. Entretanto, deu o foco à oferta de procedimentos assistenciais, consultas médicas e exames, em detrimento das ações realizadas no território e as ações intersetoriais. Ou seja, reduziu o enfoque da vertente comunitária da Estratégia da Saúde da Família e tornando o processo de trabalho médico-centrado. Queixa das ACS antigas foi de com a reforma passaram a ter excesso de tarefas no interior das Clínicas da Família e tem menos tempo para as ações no território. Suas visitas domiciliares passaram a ser feitas apressadamente e com menor qualidade. As ACS recentes não se queixam de falta de tempo para as atividades no território e naturalizam a grande quantidade de atribuições que fazem no interior da unidade. Percebemos que ACS antigas sentem bastante os efeitos da RCAPS, estão insatisfeitas com o trabalho, sofrem pela percepção da queda de qualidade, e se sentem constantemente pressionadas para o alcance das metas. ACS recentes sentem a pressão e as cobranças, mas não tem parâmetros para comparar o trabalho realizado hoje com o que havia antes da reforma. ACS antigas avaliam que a obstinação com alcance de metas mostra que os gestores dão menor valor à qualidade que aos “números”. Já as agentes recentes demonstram cansaço com relação ao trabalho que realizam, se queixam da dificuldade de conseguir agendar consultas com os médicos para seus usuários. Isso nos faz pensar que as agentes recentes encontram-se mais bem adaptadas ao processo de trabalho (médico-centrado) e que em comparação às ACS antigas possuem um entendimento diferente do seu papel junto à comunidade.
Conclusões/considerações: A RCAPS introduziu mudanças que afetaram o trabalho do ACS. Acreditamos que a relação dos agentes com as pessoas da comunidade deveria promover discussões e reflexões sobre o seu modo de vida, o que ficou prejudicado no modelo adotado. Além disso, acreditamos que o modelo implementado no Rio de Janeiro se afasta da estruturação da ESF bem como se afasta de uma APS abrangente.
Referências:
GAULEJAC, V. de. Gestão como doença social: ideologia, poder gerencialista e fragmentação social. Tradução por Ivo Storniolo. Aparecida, SP: Ideias & Letras, 2007. (Coleção Management, 4).
PAULA, A. P. P. de. Por uma nova gestão pública: limites e potencialidades da experiência contemporânea. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2005.
PIRES, S. de S. A Política de Saúde em tempo de capital de fetiche: um estudo sobre a implantação das Clínicas da Família na cidade do Rio de Janeiro e a mudança no modelo de atenção primária no contexto de privatização da saúde. 2014. 130 f. Dissertação (Mestrado em Serviço Social). Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de janeiro, 2014.
SORANZ, D.; PINTO, L. F.; PENNA, G. O. Eixos e a Reforma dos Cuidados em Atenção Primária em Saúde (RCAPS) na cidade do Rio de Janeiro, Brasil. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro, v.21, n.5, p.1327-1338, Maio 2016.
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