29/09/2019 - 13:30 - 15:00 EO-32F - GT 32 - Trabalho, saúde e estratégias de formação |
30811 - TRABALHO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL DOS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE NO MUNICÍPIO DO RECIFE: O QUE ESTA EXPERIÊNCIA TEM A NOS ENSINAR? LÍVIA MILENA BARBOSA DE DEUS E MÉLLO - UFRB, PAULETTE CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE - FIOCRUZ/PE, NILCEMA FIGUEIREDO - UFPE
A história do Agente Comunitário de Saúde (ACS) no Brasil se imbrica com a história de lutas pelo direito à saúde e com a trajetória da instituição do Sistema Único de Saúde (SUS) a partir do Movimento da Reforma Sanitária Brasileira. Estando o SUS em disputa permanente para consolidar-se enquanto projeto universal, equânime e integral, depende da ação dos seus trabalhadores e, portanto, da formação destes, na medida em que esta reorienta atitudes e práticas diante da sociedade.
A recente reformulação da Política Nacional de Atenção Básica em 2017; a aprovação da Lei 13.595/2018 que reformula as atribuições dos Agentes Comunitários de Saúde e o anúncio de que haveria direcionamento de recursos públicos para a formação dos mesmos enquanto técnicos de enfermagem através do Programa de Formação Técnica para Agentes de Saúde; recolocam o debate dos rumos deste trabalhador no sistema de saúde brasileiro e reforçam a necessidade de estudos que tratem da conclusão da formação destes enquanto Técnicos em Agente Comunitário em Saúde.
O estudo é fruto de dissertação de mestrado realizado através de um estudo de caso, de abordagem qualitativa e caráter histórico cujo objetivo geral foi descrever e analisar a trajetória da formação profissional dos ACS no município do Recife, através do Curso Técnico de Agentes Comunitários de Saúde (CTACS), realizado entre 2005 e 2012, em três etapas, conforme preconiza o Referencial Curricular Nacional estabelecido pelos Ministérios da Saúde e Educação em 2004.
Revela-se nesta trajetória contextos políticos favoráveis de um longo período de investimento nas políticas de gestão do trabalho, garantindo mesa permanente de negociação com trabalhadores da saúde, efetivação estatutária dos ACS e valorização profissional através de plano de carreira, além de modelos de saúde centrados na atenção primária à saúde, com incentivo à educação permanente nas equipes de saúde da família e projetos de educação popular em saúde, conduzidos prioritariamente por parte dos ACS.
Sob a ótica das disputas inerentes ao Estado e suas classes antagônicas, foram apresentadas as visões de diversos sujeitos na definição da agenda da formação técnica dos ACS assim como no processo de formulação e implantação do curso. Os gestores municipais do Recife, na contramão do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde, apoiaram a formação técnica, garantindo aporte financeiro próprio e equipe técnico-política para condução do processo. As instituições formadoras, a partir das pactuações e contrapartidas exigidas pelo município na agenda da integração ensino-serviço, apoiaram com estrutura e formação político-pedagógica dos professores. Os ACS, através de suas organizações sindicais, atuaram frente aos canais de negociação existentes para cobrar e garantir a formação na agenda dos governos municipais, além de comporem as instâncias colegiadas do curso quando estas foram instituídas.
O conteúdo do curso, em suas duas etapas, abrangeu aspectos do Referencial Curricular Nacional do CTACS e demandas do município, de acordo com os modelos técnico-assistenciais em implantação e perfil sócio-epidemiológico local.
Houve ênfase na formação dos ACS enquanto educadores populares em saúde e no seu papel de mobilização social. Foram desenvolvidas habilidades para a vigilância em saúde, incluindo a prevenção de doenças dirigidas a indivíduos e grupos específicos e doenças prevalentes. Na dimensão do cuidado, foram ofertadas oficinas para uma aproximação, resgate e despertar dos mesmos quanto às práticas integrativas e complementares no fazer profissional na comunidade. Foram realizadas oficinas de constelação familiar, práticas corporais, atentividade (meditação), parto humanizado, fitoterapia, alimentação saudável na comunidade, arteterapia, sexualidade e corpo, além de terapia comunitária.
Algumas lacunas foram identificadas pelos entrevistados tais quais: A lógica produtivista que o modelo de metas quantitativas impõe ao processo de trabalho e a incorporação desta discussão no curso; A insuficiência da discussão de saúde do trabalhador diante de uma categoria profissional que adoece muito pelo tipo de trabalho que desenvolve; A distância entre a formação de educadores e promotores de saúde com o que o cotidiano do trabalho proporciona de possibilidade de praticar; O tempo reduzido e pouco aprofundamento das práticas integrativas e complementares trabalhadas no curso.
O estudo buscou contribuir com reflexões a respeito da formação profissional em saúde, sua relação com o trabalho e a importância do caráter público e estatal do SUS, que aposta na formação dos trabalhadores, na perspectiva da efetivação do direito à saúde, como foi a proposta do município do Recife neste caso.
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