28/09/2019 - 13:30 - 15:00 EO-36B - GT 36 - Eixo 1 – Aprender com Dona Maria: artes e espiritualidades populares na construção do bem viver. |
31257 - A TERRA COMO CURA: SABERES E FAZERES TRADICIONAIS SOBRE O SISTEMA TERRA E SAÚDE MAIRA LARISSA RAMOS DA ROSA - UFBA, ANA VIRGÍNIA ALVES DE SANTANA - UFBA
Contextualização: A construção do conhecimento, ao longo da história da humanidade, assumiu diferentes formatos em diferentes contextos, variando conforme a organização da sociedade e tempo histórico. Em se tratando de comunidades tradicionais, seus saberes e fazeres sempre foram subalternizados, e que não passam pelo crivo científico, já que conforme Santos (2009), estão “do outro lado da linha” e somente os que estão “deste lado da linha” são passíveis de serem julgados como verdadeiro ou falso, numa perspectiva cartesiana. A Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNASPI), em 2002, já reconhece que indígenas possuem conhecimentos próprios sobre saúde e que esses conhecimentos devem ser respeitados na organização dos serviços de saúde, daí a necessidade de aproximar esses saberes desde a formação na universidade. Descrição: Relato de experiência produzido a partir da monitoria de uma Ação Curricular em Comunidade e Sociedade (ACCS) intitulada ‘A Terra como Cura: transversalidades entre os conhecimentos geológicos e os saberes e fazeres tradicionais‘, atividade integrante de um projeto em construção. A disciplina preconizou três momentos: pré-vivência, vivência e pós-vivência. No primeiro momento, optou-se por desenvolver os conteúdos através de rodas de conversas em sala de aula contemplando as temáticas Terra, Saúde, Epistemologias e Ciências Sociais na Saúde, além de estratégias para o estímulo do sensível. A vivência, em si, foi realizada em Aldeia Velha, comunidade indígena Pataxó localizada em Arraial D’ajuda, em caráter de imersão por dois dias. Finalizou-se com o terceiro momento, em que compartilhou-se as experiências de maneira crítica, seguiu-se a elaboração de uma revista com a sistematização de criações individuais que refletissem a participação no componente curricular e encerramento da ação com a promoção de um evento aberto sobre o tema. Período de realização: A disciplina foi ofertada no primeiro semestre letivo, de fevereiro a julho de 2019. Objetivo: Identificar diálogos que permitam a construção de uma articulação entre o conhecimento técnico e científico - calcado nas Ciências da Terra - e os saberes e fazeres, associados às rochas e minerais e amplamente utilizados para promoção de saúde em povos tradicionais indígenas. Resultados: Houve uma boa adesão da turma na maioria das aulas teóricas e era perceptível o cuidado para os trabalhos a serem desenvolvidos na comunidade, por conta das especificidades de uma população marginalizada. Além disso, as e os discentes que se matricularam na referida ACCS, oriundos de nove cursos, mostravam-se inquietas e inquietos com a conformação da universidade ainda hoje, apesar de reconhecer os avanços, por exemplo, nas discussões sobre o objeto saúde a partir de uma lógica não biomédica. As práticas de meditação proporcionaram um ambiente mais acolhedor para o exercício de reflexão durante as aulas. Principalmente, o convívio em comunidade com as e os indígenas Pataxós permitiram ampliar a visão sobre o objeto saúde contextualizando-o numa determinada cultura, agentes e tempo histórico. Aprendizados: A utilização do barro para cura, como se viu, não é nenhuma novidade entre comunidades tradicionais, entretanto, o reconhecimento dela e com o devido prestígio ainda hoje é muito custoso. Para eles e elas, é também de uma força espiritual, enérgica, porque os antepassados também passaram por esse ritual e, portanto, é uma ligação reavivada. Não somente ao nível espiritual a argila tem função, a cerâmica de produção artesanal por exemplo é também fonte de renda, sobrevivência e resistência para os pataxós. Isso quer dizer então que, pensar saúde é para além de tudo pensar as raízes e como elas foram sendo influenciadas pelo contato com o não indígena ao longo da história. Análise Crítica: A despeito das políticas públicas destinadas à saúde desta população é necessário um maior entendimento dos itinerários terapêuticos adotados por eles e elas, a exemplo destacado das gestantes que se referenciam na pajé da comunidade para seu acompanhamento, e sobretudo, o reconhecimento da pluralidade da concepção de saúde, aqui entendendo a relação intrínseca de cura com a terra e seus modos de cuidados baseados também nas práticas integrativas e complementares, como a geoterapia e a fitoterapia. Ainda assim, adequar os sistemas de saúde às reivindicações das populações indígenas de forma que uma narrativa historicamente inferiorizada não passe novamente pelo apagamento e pela demonização de suas crenças em detrimento de uma cultura e fé de uma colonialidade, questionando os limites da interculturalidade. Por fim, entende-se que este tipo de ação pode representar uma forma de construção contra-hegemônica do saber e coloca as envolvidas e os envolvidos no compromisso de atuar como multiplicadoras e multiplicadores dos aprendizados que esta ponte entre universidade-comunidade proporcionou.
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