28/09/2019 - 15:00 - 16:30 CB-36A - GT 36 - Eixo 1 – Aprender com Dona Maria: artes e espiritualidades populares na construção do bem viver. |
30995 - OUTSIDERS NA SAÚDE: OS CURADORES TRADICIONAIS AMAZÔNICOS E OS SABERES NÃO BIOMÉDICOS NA ZONA URBANA DE SANTARÉM, OESTE DO PARÁ. TEÓGENES LUIZ SILVA DA COSTA - UFOPA, ERICKSON MONTEIRO RAMOS - UFOPA, MARCIA GODINHO GUIMARAES - UFOPA, EMANUELLE ANDREA CORREA DE AGUIAR - UFOPA, DEYVIANE RAMOS ALVES - UFOPA, ZONILCE BRITO VIEIRA - UFOPA, PAOLA MARCELIA ACIOLY FERNANDES - UFOPA, ERIVALDO YORI MUNDURUKU - UFOPA, ELAINE CRISTNY EVANGELISTA DOS REIS - UFOPA
INTRODUÇÃO: Apresentamos resultados parciais de pesquisa em desenvolvimento que investiga saberes tradicionais em saúde no contexto sociocultural do Oeste do Pará, especificamente na cidade de Santarém. Expomos reflexões iniciais desenvolvidas a partir de projetos de pesquisa e extensão relativos aos conhecimentos em saúde não biomédicos. As evidências (Shanley e Luz, 2003) demonstram haver massiva procura por saberes e práticas tradicionais relativos aos processos de saúde-doença-cura, algo facilmente observável no contexto amazônico, por razões multiversas. Os antropólogos F. Laplantine e P. Rabeyron (1989), na obra Medicinas Paralelas, já apontavam para o paradoxo que envolve o continuo uso de medicamentos e/ou tratamentos não biomédicos em sociedades ocidentais modernas. Tal assertiva é observada mesmo em sociedades ditas economicamente desenvolvidas, a exemplo do contexto social analisados por eles, a saber, parte da Europa ocidental, especificamente a França, na década de 1980. Os pesquisadores chamaram atenção para o fato de amplos setores da sociedade europeia da época recorrer a tratamentos não biomédicos, denominados pelos pesquisadores por “medicinas paralelas”. Passadas mais de três décadas, as medicinas não científicas continuam a existirem e sendo amplamente procuradas por diversificados públicos. OBJETIVOS: Refletir sobre a “formação” de curadores tradicionais amazônicos. A questão que norteia a temática em tela é: como os curadores tradicionais se constituem enquanto tal? METODOLOGIA: Os dados aqui usados para subsidiar a discussão sobre os processos de saúde-doença-cura no oeste do Pará foram conseguidos a partir da participação de curadores tradicionais em um projeto de extensão que visa a publicizar os saberes e práticas tradicionais amazônicos relativos aos processos de saúde-doença-cura. O projeto convidou vários curadores tradicionais da região oeste do Pará que atuam em Santarém para exporem seus conhecimentos no espaço acadêmico. RESULTADOS E DISCUSSÃO: O fato de parte da população recorrer a curadores tradicionais abre diversos caminhos reflexivos, interessa-nos pensar a constituição/formação daqueles sujeitos. Dessa forma, a investigação se direciona a desvelar o universo desses indivíduos enquanto realidade a ser compreendida. Assim, participaram das ações de extensão, do projeto citado, cinco curadores não biomédicos: um parteiro; uma senhora que lida com fitoterapia; um jovem indígena em vias de se tornar pajé; uma “rezadeira”, um pai de santo e um senhor que se reconhece enquanto curandeiro. Interagir com alguns curadores tradicionais no espaço acadêmico nos possibilitou inferir que as trajetórias individuais possuem pontos semelhantes. De maneira geral, excetuando o parteiro (que detinha algum conhecimento biomédico), todos os demais curadores contatados apontaram como significativo o fato de serem curadores a partir de “dom” (MAUSS, 2003) recebido e aceitado. Tal dádiva foi facultada àquelas personagens ainda na infância, num contexto místico-religioso. Verificou-se que a formação destes sujeitos inicia-se, geralmente, ainda em tenra idade e desenvolve-se num processo relativamente longo (se é que se pode falar em “fim”). Há a presença de outros indivíduos (inclusive entidades metafisicas) que são figuras chave nesse processo, tais como anciãos e espíritos (CORDEIRO, 2017). CONSIDERAÇÕES FINAIS: Estes curadores tradicionais nos mostraram haverem outros sistemas usados para compreender os processos de saúde-doença-cura, objeto novo a ser estudado pelas disciplinas científicas. Dessa forma, curar, nesse contexto específico de saberes tradicionais não biomédicos, insere-se nas proposições da teoria da dádiva. Torna-se curador, como foi possível inferir, é resultado de complexos processos sociais, pode-se mesmo falar em “construção social” dos mesmos (CORDEIRO, 2017; BERGER & LUCKMANN, 1985).
BIBLIOGRAFIA
BECKER, H. Outsiders: estudos de sociologia do desvio. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.
BERGER, P. L. LUCKMANN, T. A construção social da realidade. Petrópolis, RJ: Vozes, 1985.
CORDEIRO, M. A de Souza. “A canoa da cura ninguém nunca rema só”: o se ingerar e os processos de adoecer e curar em Parintins (AM). Tese (Doutorado em Antropologia Social) – Universidade Federal do Amazona. Manaus, p. 282. 2017.
FILHO, Florêncio A. Vaz. Pajés, benzedores, puxadores e parteiras: os imprescindíveis sacerdotes do povo na Amazônia. Santarém: UFOPA, 2016.
LAPLANTINE, François; RABEYRON, Paul-Louis. Medicinas Paralelas. São Paulo; Ed Brasiliense, 1989.
MAUSS, Marcel. Ensaio sobre a dádiva – forma e razão da troca nas sociedades arcaicas. IN. Sociologia e antropologia. São Paulo: Cosac Naify, 2003.
SHANLEY, P.; LUZ, L. The impacts of forest degradation on medicinal plant use and implications for health care in eastern Amazonia. BioScience, 2003., Volume 53, Issue 6, 1 June 2003, Pages 573–584. Disponível em: .
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