29/09/2019 - 15:00 - 16:30 CB-26A - GT 26 - Tecnologias, Programas e Serviços de Saúde |
30004 - A MEDICALIZAÇÃO DA NUTRIÇÃO: O CASO DA POLÍTICA PÚBLICA NUTRISUS NATÁLIA PEREIRA SILVA - UNICAMP, JULICRISTIE MACHADO DE OLIVEIRA - UNICAMP, ROBERTO DONATO DA SILVA JÚNIOR - UNICAMP, RAFAEL DE BRITO DIAS - UNICAMP
APRESENTAÇÃO
O NutriSUS é uma política pública formulada com o objetivo de solucionar problemas de ordem nutricional na infância, como o déficit de micronutrientes e a anemia nutricional. Trata-se, resumidamente, da inserção de micronutrientes em pó nas refeições de crianças de seis a 48 meses de idade, em creches participantes do Programa de Saúde na Escola.
Para analisá-la é importante que haja diálogos entre as ciências sociais e da saúde, possibilitando a compreensão do seu alcance e efetividade. No caso do NutriSUS, devem ser consideradas questões para além dos parâmetros biológicos, esses já evidenciados como eficazes pela produção científica do campo da Nutrição. Assim, amplia-se a compreensão da questão, em âmbito científico e farmacológico10, 8, a partir do processo de medicalização da vida e do conceito de biopoder de Foucault11,7,3. Outras possibilidades podem ser elencadas para solucionar problemas, no caso o déficit de micronutrientes e a anemia, dos quais as causas primárias nem sempre são de caráter médico-biológico-nutricional, e sim associados a problemas estruturais e de cunho social.
OBJETIVOS
Discutir a política NutriSUS a partir do processo de medicalização da vida inserido no conceito de biopoder de Foucault.
METODOLOGIA
Trata-se de um estudo de caso, no qual a política pública NutriSUS, bem como seu referencial científico do campo da Nutrição, serão analisados e compreendidos a partir do processo de medicalização da vida, vertente inserida no conceito de biopoder de Foucault3,4,5,7.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Como resquício da normalização das funções em medicina, a autoridade é exercida diante dos indivíduos, doentes ou não, a partir do século XX6. Tal autoridade é descrita por Foucault (1978) como não correlacionada simplesmente aos saberes dos médicos, mas como uma autoridade social que toma decisões em instituições, bairros, cidades, o que o autor denomina de medicina do Estado (apud9, p.102).
O conceito de biopoder é delimitado por Foucault em suas obras, desde a década de 70. Para o autor, o poder é executado diante de conhecimentos e saberes. O campo social estabelece a relação de forças em perspectiva multifatorial, onde estão inseridos indivíduos de instituições como família, escola, hospitais e clínicas. Nesse caso, a realidade biológica é essencial para compreender o termo sob a perspectiva da política contemporânea7.
A população torna-se alvo de um objeto de saber e poder composto pela racionalidade médica que congrega essa população em um grupo de consumo, a partir do seguimento de cura e processos terapêuticos por meio das práticas desenvolvidas pela indústria farmacêutica, exemplificada no presente estudo pelo sachê contendo micronutrientes em pó. Dessa forma, os “doentes” fazem parte de um processo econômico que impulsiona o mercado farmacêutico, o qual se fortalece em meio ao discurso médico tangido pela ideia tecno-científica da medicalização como solução de qualquer problema referente a nutrição2.
A política NutriSUS, ao privilegiar uma visão fragmentada do nutricional, trata a comida, elemento identitário que expressa cultura, como um mero veículo de nutrientes manipulado pela indústria farmacêutica. Evidencia-se, assim, a medicalização e a farmacologização da nutrição10,8.
CONCLUSÃO
Apesar da eficácia do NutriSUS ser evidenciada por estudos disciplinares da Nutrição, a efetividade da superação dos déficits de micronutrientes e anemia nutricional requerem compreensões que estão para além do processo imposto pela medicalização.
REFERÊNCIAS
1. CASELAS, J. Figuras contemporâneas do biopoder. Saberes: Rev. Interd. de Filos. e Ed., 2010.
2. FOUCAULT, M. Microfísica do Poder. 3.ed. RJ: Graal, 1982.
3. FOUCAULT, M. Em defesa da sociedade: curso no Collège de France 1975-6; trad. Maria Ermantina Galvão. SP: Martins Fontes, 1999.
4. FOUCAULT, M Segurança, Território, População. Ed. Martins Fontes, 2008.
5. FOUCAULT, M. Crise da medicina ou crise da antimedicina. Verve, 2010; 18:167-94.
6. FURTADO, R. N; et.al. O conceito de biopoder no pensamento de Michel Foucault. Rev. Subj., Fortaleza, 2016; 16:34-44.
7. KRAEMER, F.B; et.al. O discurso sobre a alimentação saudável como estratégia de biopoder. Physis: Rev. de Saúde Coletiva; 2014: 24:1337-60.
8. SANTOS, P.M. Profissão médica no Brasil. Ed. FIOCRUZ, 1995, p. 97-117.
9. VIANA, M.R; et al. A racionalidade nutricional e sua influência na medicalização da comida no Brasil. Ciênc. saúde coletiva, RJ, 2017; 2:447-56.
10. ZORZANELLI, R.T.; et.al. Um panorama sobre as variações em torno do conceito de medicalização entre 1950-2010. Ciênc. Saúde Coletiva. 2014; 19:1859-68.
|

|