28/09/2019 - 13:30 - 15:00 EO-12A - GT 12 - Cenários, Questões e Pontos de Partida |
29979 - AS MÍDIAS LOCAIS E A TRAGÉDIA DA VALE EM BRUMADINHO: MOBILIZAÇÃO E CONSTRUÇÃO DE SENTIDOS. VALDIR DE CASTRO OLIVEIRA - PPGICS/FIOCRUZ
As mídias locais e a tragédia da Vale em Brumadinho: mobilização e construção de sentidos.
Os atuais fenômenos comunicacionais tem ganhado dimensões não pensadas nos estudos convencionais de comunicação e que algumas de suas dimensões atuais não são estranhas a vários autores que estudaram a comunicação na perspectiva não hegemônica. Este é o caso de Walter Benjamin que os chamou de narrativas a contrapelo, ou seja, as modalidades de comunicação utilizadas pelos grupos subalternos utilizadas para afirmar determinados princípios ou sentidos dentro de uma estrutura social hegemônica (Walter Benjamin, Obras escolhidas, Editora Brasiliense, São Paulo, 1994).
Este é o caso também do alentado estudo feito por John D. H. Downing intitulado Mídia Radical: rebeldia nas comunicações e movimentos sociais (Editora Senac, 2002) no qual mostra de que maneira o potencial da música, da poesia, do teatro, entre outras modalidades comunicacionais, se transformam em sentidos mobilizadores contra o preconceito, a violência e o poder das classes dominantes deslocando o centro hegemônico de significação do mundo.
Também o estudo de Henry Jenkins intitulado a Cultura da Convergência (Editora Aleph, 2009) faz uma instigante discussão sobre as transformações da comunicação na sociedade contemporânea e de que maneira as várias plataformas da comunicação, ao invés de destruírem umas às outras, como o rádio em relação a televisão e essa em relação ao cinema, como pensaram anteriormente muitos estudiosos da comunicação, elas convergem entre si da mesma forma que a internet não suprime as conversações sociais e que, devido a importância que ganha na sociedade contemporânea precisa ser melhor estudada.
Embora o conjunto da arquitetura da comunicação na sociedade contemporânea proporcione a emergência de diferentes fenômenos políticos e sociais, como o populismo, o autoritarismo ou a intolerância, ela proporciona também a pluralidade democrática e a construção de narrativas a contrapelo, como sugerido por Walter Benjamin, o que dependerá não apenas desta arquitetura, mas também das propostas dos operadores dos dispositivos comunicacionais nela existentes para promover a comunicação não hegemônica tal como foi sugerido por Boaventura de Souza Santos (Renovar a Teoria Crítica e reinventar a emancipação, Editora Boitempo, 2007).
E diante destas questões consideramos relevante invocar aqui o estudo de Michel de Certeau (A invenção do cotidiano, artes do fazer, Editora Vozes, 1994) sobre as maneiras de como as pessoas, em condições de subalternidade, escapam da ordem de poder que a elas se impõe mediante a inventividade tática, estudo este que, ao lado dos que foram anteriormente citados, podem trazer instigantes questões a respeito das potencialidades da comunicação e da mobilização na sociedade contemporânea envolvendo tanto as formas tradicionais de comunicação quanto aquelas que são hoje proporcionadas pelas novas tecnologias e, em particular, pela Internet.
Neste sentido considero que o conceito de “tática” proposto por Michel de Certeau pode ser ricamente apropriado pela teoria da comunicação para explicar de que maneira segmentos sociais politicamente em desvantagem ou às margens do poder hegemônico agem impondo politicamente a sua presença evitando se se defrontar diretamente com a parte mais forte. Esta questão nos remete imediatamente ao conceito de mídias táticas, ou seja, aquelas mídias que são utilizadas comumente, de forma pensada ou intuitiva, pelos grupos subalternos nos confrontos entre grupos sociais e políticos desiguais e assimétricos nos quais a parte mais “fraca” tem que se aproveitar das oportunidades presentes em determinados espaços para produzir um discurso contrário a uma determinada ordem de poder e criar situações de “empoderamento” (empowerment).
Foi a partir destas ideias que estudamos alguns dos processos comunicacionais após a tragédia da Vale S.A. em Brumadinho depois do rompimento da barragem do Córrego do feijão no dia 25 de janeiro de 2019 que matou quase trezentas pessoas e provocou incalculáveis prejuízos ambientais, psicológicos e sociais a população local.
Para isto estudamos, por um lado, de que maneira, poucos meses antes desta tragédia, a Vale forjou um discurso competente para a população assegurando a segurança de suas barragens e tecendo loas a mineração na região través de boletins por elas publicados e, por outro lado, analisamos de que maneira, após esta tragédia, determinados grupos de Brumadinho se valeram tanto das redes sociais quanto das mídias locais para forjar um outro tipo de inteligibilidade sobre este acontecimento se contrapondo ao discurso competente da Vale e suas redes de poder.
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