Clique para visualizar os Anais!



Certificados disponíveis. Clique para acessar a área de impressão!

Associe-se aqui!

Grupos Temáticos

30/09/2019 - 13:30 - 15:00
EO-6B - GT 6 - Cidade, Subjetividade e Práticas em Saúde

30690 - MEDO DA CIDADE, MEDO DO HOSPITAL: PRÁTICAS DE CUIDADO DA SAÚDE E VIVÊNCIAS DE MULHERES MIGRANTES RESIDENTES EM UMA OCUPAÇÃO DA CIDADE DE BUENOS AIRES, ARGENTINA
ANA MARIA RICO - ISC/UFBA, JORGE ALBERTO BERNSTEIN IRIART - ISC/UFBA


Introdução
No campo da Saúde Coletiva, estudos sobre migrações tencionam visibilizar iniquidades sociais na efetivação do direito à saúde, decorrentes de condições precárias de moradia, trabalho e acesso a serviços. O entrecruzamento entre migração e vulnerabilidade é destacado em relação às mulheres. Porém, algumas pesquisas salientam efeitos positivos da migração sobre a saúde, em sociedades cujos sistemas públicos facilitam o acesso ao atendimento, mediante a gratuidade e a capilarização territorial dos serviços através da estratégia de atenção primária.
Neste caso, abordaremos experiências de mulheres peruanas residentes em uma ocupação da Cidade Autónoma de Buenos Aires (CABA), focando nas reconfigurações das relações familiares e nas modalidades de cuidado à saúde praticadas, decorrentes da sua singular inserção na cidade como migrantes. Com base nos estudos sobre migrações e gênero, discutiremos a forma em que marcadores sociais como gênero, nacionalidade/etnia e geração conferem configurações singulares às experiências cotidianas em espaços específicos.

Objetivos
Analisar como a residência em uma ocupação na CABA, articulada ao gênero, à condição migratória, à nacionalidade/etnia e à geração, interfere nas experiências e no cuidado da saúde entre mulheres peruanas.

Metodologia
Estudo qualitativo de caráter socioantropológico baseado na análise de entrevistas com 15 mulheres peruanas de baixa renda entre 19 e 66 anos residentes em uma ocupação na CABA. Entrevistas semiestruturadas foram complementadas com observações registradas em diário de campo durante quatro meses em 2015. A organização do material foi auxiliada pela utilização do programa informático de processamento de dados não estruturados NVivo. A análise dos dados buscou uma aproximação aos significados e às práticas de cuidado, buscando construir sentido à luz da lógica e dos valores do mundo moral local das participantes.

Resultados e discussão
A ocupação está localizada em uma área privilegiada da CABA, caracterizada pela acessibilidade geográfica a serviços e bens públicos. Porém, o padrão de ocupação da cidade conforma enclaves de população de baixa renda e migrante com dificuldades de efetivação de direitos, dentre eles, à cidade e à saúde. O local constitui um “núcleo urbano segregado”, espaço onde a localização estratégica contrasta com a restrição à circulação das pessoas, seja por medo da violência do tráfico e policial, seja pelo tratamento estigmatizante da vizinhança.
Esta disposição espacial marca as experiências cotidianas dos residentes que, para além das condições precárias de moradia, têm limitada sua liberdade de circulação, gerando, no entanto, possibilidades singulares em relação ao cuidado da saúde. Mulheres que deixaram suas casas no Peru para cuidar dos netos enquanto seus filhos trabalham, especialmente as de origem rural, lamentam as condições de vida e a falta de autonomia atuais. À sensação de aprisionamento na casa e num bairro tido como perigoso, por sua vez localizado em uma cidade desconhecida, acrescenta-se a percepção de perda de autoridade, que contrasta com a posição de poder ocupada na família pelos “antigos” na tradição andina.
Nesse contexto, o acesso a outros espaços, dentre eles as instituições de saúde, ocorre sob controle da geração intermédia. Articulando receio da cidade e da biomedicina, foram recorrentes as menções ao “medo do hospital” entre entrevistadas idosas, voltadas para práticas tradicionais de cuidado. Porém, a localização estratégica do bairro e a gratuidade do sistema público de saúde argentino as encorajam a enfrentar essa apreensão e usufruir o que é considerado uma “oportunidade” a ser “aproveitada”. Diferentemente dos hospitais, os centros de atenção primária são valorizados pela acessibilidade e pela possibilidade de se estabelecer vínculos de confiança com profissionais de referência.
Na medida em que a idade decresce, o “medo do hospital” se dissipa e as práticas de cuidado tendem à adesão total à biomedicina, criticada pelas entrevistadas idosas, preocupadas pelo abandono das práticas ancestrais. Por sua vez, algumas jovens que moram na ocupação desde crianças também reclamam do isolamento: a proteção familiar restringe, de modo similar, seus movimentos dentro e fora do bairro.

Conclusões
A migração traz consigo a reconfiguração das relações de autoridade familiar, bem como restrições à circulação em espaços segregados da cidade, viabilizando, entretanto, o acesso ao sistema biomédico, com variantes geracionais.
A questão migratória é sensível a conjunturas econômicas, políticas e sociais, refletidas na busca pela integração ou pela restrição do fluxo de pessoas, entendido ora como direito, ora como problema de segurança pública. No atual contexto de ajuste econômico e de condicionamentos à democracia, a defesa dos direitos à cidade e à saúde, dentre outros direitos que remetem à noção de coletividade, deve ser preservada.

local do evento

Universidade Federal da Paraíba (UFPB)

Campus Central

A Universidade Federal da Paraíba é reconhecida pela sua excelência no ensino e em pesquisas tecnológicas e, atualmente, encontra-se entre as melhores Universidades da América Latina.

Campus I - Lot. Cidade Universitaria, João Pessoa - PB, 58051-900