30/09/2019 - 15:00 - 16:30 CB-6C - GT 6 - Cidade, Subjetividade e Práticas em Saúde |
31300 - RACIONALIDADE NUTRICIONAL COMO EXPRESSÃO EPISTEMOLÓGICA DOS CONCEITOS DE ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL E SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL MÁRCIA REGINA VIANA - UFRJ MACAÉ, KENNETH ROCHEL DE CAMARGO JR. - UERJ, SHIRLEY DONIZETE PRADO - UERJ
A racionalidade nutricional e a segurança alimentar e nutricional são conceitos oriundos da crescente complexidade científica observada no campo de alimentação e nutrição: o primeiro refere-se ao exacerbado cuidado em manter a alimentação sob o equilíbrio de nutrientes. O segundo à condição de acessibilidade a alimentos nutritivos e adequados ao consumo sem o comprometimento de outras necessidades básicas. Destes conceitos decorrem situações que flutuam no entendimento tácito de que a ciência promove o progresso da sociedade, por oferecer soluções convenientes que, ao serem assimiladas pelo cotidiano, autoafirmam-se como necessárias. Percebe-se uma tendência à submissão das subjetividades ao discurso biologicista no âmbito do cuidado em saúde e corporeidade, sem considerar seus elementos antropológicos e socioculturais. Surgem os alimentos industrializados como soluções para a vida atribulada do sujeito comedor moderno, cujas inovações oferecem porções individuais com composição nutricional condizente aos anseios de uma prática alimentar racional e segura. Vemos nessa situação a relação de elementos importantes: 1) Ciência comprometida com a busca de soluções para a tríade saudabilidade-tempo-conveniência, 2) objetos a serem transformados pela Ciência, neste caso os alimentos in natura ou, porções alimentares “produzidas” em laboratórios de alta tecnologia; e por fim 3) a legitimação para que estas transformações dadas pelo processamento industrial sejam necessárias. Assim, este foi o cenário que motivou nosso estudo: a academia é a responsável pela produção e divulgação de ciência e tecnologia e, na esteira disso, do construto de soberania de seu discurso científico; mas, em contrapartida, a alimentação vê-se desconstituída de seu sentido político, enquanto lugar de convivialidade, e parece expressar-se apenas em ato da razão. Razão individualizada, cujo sentido dado ao ato de comer fica desvinculado de seus lugares de memória, alijando a autonomia do sujeito comedor ao cuidado de si. Isso por que o conhecimento científico tende a mostrar-se mais eficaz neste cuidado do que os saberes acumulados, em se tratando de seres existentes em um mundo habitado por outras subjetividades.
Esse trabalho investigou a tendência de consolidação do conceito racionalidade nutricional a partir da visão acadêmica, a qual assenta sua genealogia no modelo ocidental eurocentrado de produção do conhecimento, e foi a campo entrevistar in loco pesquisadores da área de alimentação e nutrição. Na pesquisa de campo utilizou-se o método de pesquisa qualitativo, com a técnica de entrevista semiestruturada e roteiro formado por três eixos investigativos: formação profissional, concepção de alimentação saudável e relação ciência/normatização/industrialização. Serviram como campo de pesquisa três programas de pós graduação em Nutrição - UERJ, UFRJ e UNIFESP/Baixada Santista. Foram entrevistados vinte e seis professores desses programas. As entrevistas foram transcritas e analisadas com base na análise de conteúdo de Lawrence Bardin. Resultados: a partir da análise das entrevistas, foram encontradas categorias representativas de seu conteúdo: 1) conveniência alimentar, que apresentou a intenção de considerar os alimentos industrializados como aliados na resolução de dificuldades do dia a dia; 2) prescrição/normatização alimentar, expressa a concepção de que alimentação saudável deva estar regida sob os princípios da Ciência da Nutrição; 3) cientificização do processo alimentar, que enseja uma visão do conhecimento técnico enquanto hegemônico e como garantia de verdade. Conclusão: A conclusão que se chegou é que a formação profissional ancora-se nas construções conceituais advindas de pesquisas relacionadas ao núcleo biológico da alimentação e nutrição, mais estreitamente ligado à racionalidade hegemônica. Acrescenta-se à essa reflexão a ideia de que a Segurança Alimentar e Nutricional não pode estar fundamentada na ideia de acessibilidade a produtos alimentares que não respeitem as lógicas situacionais do saber cuidar de si e do outro, próprios dos elementos existenciais intrínsecos aos processos de alimentação e nutrição, tais como a historicidade subjetiva e o patrimônio alimentar e culinário das diferentes culturas interativas presentes na sociedade brasileira.
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