28/09/2019 - 15:00 - 16:30 CB-5A - GT 5 - As interfaces entre os Movimentos Sociais e o Sistema Único de Saúde: legitimidade, defesa e construção do direito à saúde-comunicação breve 1 |
29996 - CORONELISMO E RELAÇÕES PESSOAIS DE DOMINAÇÃO: CONTRADIÇÕES DA DEMOCRATIZAÇÃO DO ESTADO E A IMPLANTAÇÃO DO SUS MARIA DE FATIMA SILIANSKY DE ANDREAZZI - UFRJ
O trabalho propõe estabelecer uma revisão de conceitos associados a ideia de um déficit democrático na condução do Estado brasileiro a partir da persistência do coronelismo enquanto uma categoria explicativa para mecanismos de dominação distintos do conflito de classes da moderna sociedade industrial.
A persistência desses fenômenos baseados na dominação pessoal é um tema crescente na literatura brasileira sobre a implementação do SUS. Estão associados, por exemplo, a pessoalidade nas condições de acesso da população aos serviços públicos e a interferência sobre a composição e processos de decisão dentro do controle social.
No sentido de entender o papel dessa forma específica de dominação centrada na pessoalidade nas diversas contradições que a política de saúde brasileira apresenta, especialmente naquilo que tem sido apontado como SUS legal versus SUS real, se insere esse trabalho de revisão. Especificamente, discutir a aplicabilidade da categoria coronelismo vis a vis as demais que compõem esse campo de estudo.
Como metodologia fizemos uma revisão bibliográfica na base de dados Scielo e periódicos CAPES sem estabelecer data de início a partir das palavras chave “coronelismo”, “clientelismo” e “patrimonialismo” e escolhemos como marcos teóricos sobre a formação econômico social brasileira o historiador Nelson W. Sodré e, da realidade latino-americana, José Carlos Mariátegui.
Carvalho (1997) foi uma referência fundamental pois ajudou a organizar os conceitos. Ele identifica o conceito clássico de coronelismo no Brasil a partir da obra de Leal de 1948, “Coronelismo, Enxada e Voto”. Para este autor, era um fenômeno da política nacional, datado e sistêmico,
“baseado em barganhas entre o governo e os coronéis. O governo estadual garante, para baixo, o poder do coronel sobre seus dependentes e seus rivais, sobretudo cedendo-lhe o controle dos cargos públicos,...O coronel hipoteca seu apoio ao governo, sobretudo na forma de votos. Para cima, os governadores dão seu apoio ao presidente da República em troca do reconhecimento deste de seu domínio no estado. O coronelismo é fase de processo mais longo de relacionamento entre os fazendeiros e o governo” (Carvalho, 1997, sem p.).
Mandonismo seria um conceito mais amplo, onde o coronelismo seria um caso particular, aproximado do conceito de caciquismo da literatura hispano-americana. Refere-se à existência local de estruturas oligárquicas e personalizadas de poder. Coronelismo e mandonismo têm sido utilizados expressando o mesmo fenômeno.
“O mandão, o potentado, o chefe, ou mesmo o coronel como indivíduo, é aquele que, em função do controle de algum recurso estratégico, em geral a posse da terra, exerce sobre a população um domínio pessoal e arbitrário que a impede de ter livre acesso ao mercado e à sociedade política”. (Carvalho, 1997, sem p.)
Já clientelismo expressa, antes que tudo, uma troca entre atores de poder desigual, embora reconheça que há debates importantes em torno do tema.
“De modo geral, indica um tipo de relação entre atores políticos que envolve concessão de benefícios públicos, na forma de empregos, benefícios fiscais, isenções, em troca de apoio político, sobretudo na forma de voto”. (Carvalho, 1997, s/p)
A relação entre coronelismo e clientelismo é identificada pelo autor como segue:
“Não há dúvida de que o coronelismo, no sentido sistêmico aqui proposto, envolve relações de troca de natureza clientelística” (Carvalho, 1997, s/p)
O autor visualiza o coronelismo/mandonismo como algo em declínio e de futuro desaparecimento, a medida em que os direitos civis e políticos alcancem todos os cidadãos. Já isso não ocorreria com o clientelismo por envolver relações de barganha entre políticos e eleitores.
Já o patrimonialismo surge de uma visão distinta da relação Estado e sociedade e que há uma centralidade do Estado na constituição de um capitalismo mercantilista, e a formação de um estamento burocrático dominante, minoria dissociada da nação, dele saindo a classe política, a elite que governa e separa governo e povo, Estado e nação. Tendo a obra de Raimundo Faoro, “Os donos do Poder” como seminal, identifica visões distintas que incorporam uma dialética Estado e senhoriato, em relações de complementariedade e antagonismo.
A síntese provisória desta discussão, à luz das referências teóricas citadas, é a associação destes modos de dominação a uma estrutura social não capitalista (e que se tornam subjacentes à estrutura capitalista que vai se sobrepondo no país). Base econômica, correspondendo uma classe que domina o Estado na visão coronelista/mandonista ou de um Estado que, partindo da formação política colonial-monárquica, e da constituição de um estamento burocrático, domina a sociedade, com ela estabelecendo relações patrimonialistas e clientelistas.
Referências
CARVALHO, José Murilo de. Mandonismo, Coronelismo, Clientelismo: Uma Discussão Conceitual. Dados [online]. 1997, vol.40, n.2. http://dx.doi.org/10.1590/S0011-52581997000200003.
|

|