30/09/2019 - 13:30 - 15:00 EO-5D - GT 5 - As interfaces entre os Movimentos Sociais e o Sistema Único de Saúde: legitimidade, defesa e construção do direito à saúde- exposição oral 1 |
30687 - CAMINHOS DE VIDA E DE RESISTÊNCIA DE UMA AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE (ACS) DA CIDADE DE JOÃO PESSOA-PB: DO MOVIMENTO COMUNITÁRIO AO MOVIMENTO POPULAR DE SAÚDE DA PARAÍBA JOCINEIDE MARIA CAJUEIRO - MOPS-PB, EDGAR DA SILVA FONTES - UFPB, PEDRO JOSÉ SANTOS CARNEIRO CRUZ - UFPB
O presente trabalho abordará as vivências de luta, de resistência e de construção de Jocineide Maria Cajueiro, agente comunitária de saúde (ACS) e coordenadora do Movimento Popular de Saúde (MOPS) da Paraíba. Será enfatizada, especialmente, sua trajetória tanto nos processos de atuação de movimentos comunitários e de práticas de educação popular em saúde, em experiências dedicadas a constituição de bases para aprimoramento do bem viver das pessoas. A sistematização da experiência é narrada em primeira pessoa, mas foi apoiada na organização da redação por um estudante e por um docente da Universidade Federal da Paraíba, com os quais Jocineide convive e trabalha cotidianamente em atividades de extensão.
Tenho 47 anos, três filhos e três netos. Iniciei como trabalhadora de saúde através de um processo seletivo para ACS do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) no final de 1993, com atuação na comunidade que atualmente chama-se Maria de Nazaré.
Tudo era muito novo, tanto para mim quanto para a comunidade. Ninguém nunca tinha ouvido falar sobre o ACS, nosso serviço era atrelado à campanhas políticas. Com isso, havia muita resistência das pessoas em fornecer os dados para preenchimento de fichas de cadastramento. Com o tempo, fui conhecendo melhor a minha comunidade e criando vínculo com as famílias, as quais eram muito carentes do ponto de vista econômico e social, com problemas de saúde alarmantes. Naquele cenário, a assistência à saúde por parte de profissionais de nível superior, como médicos, enfermeiros e odontólogos era muito precária. Mesmo atuando com afinco em minhas atribuições de ACS, vendo essa situação precária de saúde e de vida da comunidade, julguei ser necessário buscar ajuda.
Nessa conjuntura, tive o prazer de conhecer o professor Eymard Mourão Vasconcelos, que era coordenador da residência de Medicina Preventiva e social da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), no Grotão, que fica bem próximo à comunidade Maria de Nazaré. Logo pedi ajuda a ele, o qual foi conhecer a comunidade e propôs trazer alguns estudantes para desenvolver um trabalho voluntário conosco. Foi o início de um Projeto de extensão popular precursor de muitos outros, existente até hoje, o Projeto Educação Popular e Atenção à saúde da família (PEPASF). Através dele, os estudantes chegaram na comunidade, nos reuníamos aos sábados, na minha residência, para visitarmos famílias em situação de vulnerabilidade, as quais os estudantes acompanhavam semanalmente com ações de atenção a saúde e de apoio social supervisionadas pelo professor e por outros docentes que foram se inserindo aos poucos nesse trabalho.
A inserção do PEPASF nos fortaleceu enquanto movimento comunitário para melhoria em nosso território, como na aquisição de uma creche e de um Centro de Inclusão Social e Produtiva Maria de Nazaré (CRISPMAN). Outra grande conquista foi a organização comunitária através da criação da Associação Comunitária Maria de Nazaré (ACOMAN). Nesse espaços de luta e de resistência cresci e me fortaleci tanto como profissional de saúde e quanto pessoa. Mediante meu trabalho, com o agir criativo e o vínculo com a comunidade, me tornei uma referência comunitária na questão saúde. Nesse sentido, travamos muitas lutas para a chegada da Unidade de Saúde da Família (USF) para o território da comunidade, o que conseguimos aproximadamente 10 anos depois da implantação do PACS.
Em 2012, fui acometida por um câncer de mama. Passei pelo tratamento oncológico, e nesse processo, me senti acolhida pelos protagonistas do PEPASF, que foi um grande apoio para vencer essa etapa triste e dolorosa. Nessa ocasião, tive a oportunidade de me aposentar, mas preferi mudar de função e estou atualmente como agente administrativo responsável por uma sala de coleta da USF do Grotão. No período de tratamento contra o câncer, comecei um curso universitário e hoje sou formada em Serviço Social. Sinto-me uma vencedora, uma guerreira.
Junto com o PEPASF e meu trabalho como ACS, atingi outros horizontes, e pude conhecer os movimentos sociais dos quais sou militante, enquanto coordenação do Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM) e também do Movimento Popular de Saúde da Paraíba (MOPS-PB), que é um movimento nacional e, na Paraíba, vem sobrevivendo e resistindo às adversidades.
Em suma, amo o que faço, sou uma eterna ACS e tenho o sonho de um dia poder publicar minha biografia com detalhes desses 25 anos como ACS em prol da saúde comunitária. O grande aprendizado que tenho de toda minha experiência de vida é a capacidade do fazer diferente, do fazer criativo. Assim, onde quer que estejamos podemos agir criticamente em prol da mudança social e coletiva. Isso posto, fica nítida a potência da articulação entre o ACS e outros trabalhadores em saúde, o serviço de saúde, a Universidade e a comunidade, trazendo resolutividade na saúde comunitária. E, assim, lutar contra as injustiças, resistir às contrariedades do caminhar, e sempre nos fortalecer coletivamente.
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