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Grupos Temáticos

28/09/2019 - 13:30 - 15:00
EO/CB -17A - GT 17 - Iniquidades em Saúde: Determinantes ou Determinação Social

31466 - INVISIBILIZADOS E EXCLUÍDOS: O (SOBRE)VIVER NAS RUAS DE PORTO ALEGRE, DE 2015 A 2018
DAIANA SILVA DOS SANTOS - UFRGS


Este relato surge por consequência das minhas observações e vivências atuando como educadora social, diretamente com a população em situação de rua, entre os anos de 2015 a 2018 no município de Porto Alegre. Quando passei a compor a equipe de abordagem das zonas Norte/Noroeste, no projeto Ação Rua, responsável pela abordagem e mapeamento da situação de rua naqueles territórios. Quem efetua as abordagens e pensa nos fluxos de atendimento e nos acompanhamentos, são as instituições parceiras, essas têm a responsabilidade em organizar, efetuar, executar e sistematizar cada uma cada das abordagens, pensando em todos os fluxos e considerando a especificidade de cada indivíduo ou coletivo. Sinto, como profissional, que as parcerias estabelecidas entre o município e as instituições não priorizam a qualidade, e o reflexo dessas prioridades inevitavelmente se dá no desenvolver das ações. Traço uma reflexão sobre as trajetórias percorridas por esta população que é heterogênea, e a sua inserção na rua varia. São dinâmicas de vidas marcadas pela falta de reconhecimento social, pela situação de vulnerabilidade e pelo racismo. Nesse sentido, o acesso às políticas sociais também varia, compreendo que as mesmas não dão conta da complexidade das especificidades desta população. Aqui, os diagnósticos demonstram que a população de rua aumentou de forma significativa, última pesquisa efetuada no município entre Setembro e Outubro de 2016, apontam que estavam em situação de rua 2.115 adultos, homens, autodeclarados negros, que sobreviviam da reciclagem. Mais de uma vez, presenciei o acesso á unidade de saúde ser negado, ou então pediam para que o usuário aguardasse no lado de fora, em decorrência do cheiro forte, das roupas sujas e rasgadas. Eu realmente não conseguia compreender, se existem políticas específicas então é possível considerar que essas práticas são excludentes e discriminatórias? Como pensar em integralidade se o preconceito está envolto às ações e diz quem deve e quem não deve ser sujeito de direitos que são garantidos a todos? Em cada uma das vezes que percebi que o atendimento foi negado, levei a informação para a minha equipe de trabalho e para o estabelecimento onde ocorreu a situação. Queria, com isso, evidenciar que o próprio serviço coloca barreiras que o distancia muito do que consta nas portarias e normativas do SUS. O que pode ser feito para garantir o atendimento? Para que serve a Política da Humanização? Devemos pensar na complexidade das ações, mas, principalmente, que a produção de saúde tem que ser considerada nos mais diversos contextos, sem preconceito, sem exclusão. A realidade crescente dessa população e as necessidades de cuidado com a saúde implicam a construção de novas práticas que não somente as protocolares de viés normatizador e controlador desses corpos. É uma situação crítica, vejo os indicadores diante dos olhos, pessoas reais, palpáveis, estigmatizados e tão fortes, vidas que resistem. Muito já ouvi falar em urbanização, estética das cidades, globalização e, então, eu me pergunto: para quais pessoas realmente estão sendo pensadas estas ações? Qual o lugar que a sociedade reserva para essas pessoas? Desconsiderar a importância de uma vida e selecionar pautas para luta e fatores de “merecimento” à empatia, faz com que todos nós sejamos responsáveis pela situação caótica que se instala na porta das nossas casas. Você consegue ser indiferente ao ver pessoas dormindo no chão? Nunca entendi quais os critérios são utilizados para que algumas vidas sejam priorizadas. A estética da pobreza dói aos olhos, mas, para, além disso, ela fere o que há de mais íntimo e traz à tona o assunto do qual, nem sempre, estamos dispostos a falar o preconceito que é pessoal e individual, reflete na coletividade, silenciosamente. Traz em sua justificativa a plasticidade do belo e do aceitável, como compreender a relação da miséria com uma sociedade capitalista? Falo de respeito à dignidade humana, em uma sociedade cada dia mais perversa e individualista, que se utiliza de um discurso meritocrático para justificar sua incompetência, o desemprego é contabilizado aos milhões e a economia é quem regula os valores da sociedade. A população, desde sempre, aprende a competir na lógica do ter para ser. É preciso mais do que lamentar e contabilizar o genocídio diário desse povo que perpassa a falta de acesso aos direitos. Não podemos naturalizar um problema social, as relações socioeconômicas organizam e ditam formas de viver. Essa regra moral que nos conduz, quase que invisivelmente, a deliberar, punir, organizar e vigiar práticas, não produz efeito sobre essas realidades e a desigualdade só aumenta. Saúde é um direito e não podemos negociar. Finalizo relatando a força de uma rua que nem todos conseguem ver, que é solidária. Onde existe superação, transformação e muita vida, pulsante que nem cabem nestas linhas.

local do evento

Universidade Federal da Paraíba (UFPB)

Campus Central

A Universidade Federal da Paraíba é reconhecida pela sua excelência no ensino e em pesquisas tecnológicas e, atualmente, encontra-se entre as melhores Universidades da América Latina.

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