28/09/2019 - 15:00 - 16:30 EO/CB-17B - GT 17 - Habitos, Comportamentos em Saúde: Um Reflexo das Iniquidades? |
31431 - OS SIGNIFICADOS DO ESTILO DE VIDA SAUDÁVEL: O PARADOXO DA FORMAÇÃO EM SAÚDE FRANCILENE BATISTA MADEIRA - UESPI, JÚLIA APARECIDA DEVIDÉ NOGUEIRA - UNB
Os estilos de vida (EV) são hegemonicamente interpretados na literatura científica como comportamentos modificáveis. Ao refletir sobre EV e saúde é importante considerar que estes podem resultar de habitus - ações coordenadas de indivíduos conectados; rotinas pessoais que se fundem em uma forma agregada e representativa de grupos e classes específicas. Este estudo explorou os significados do EV saudável para estudantes dos cursos de saúde em uma Universidade pública da centro-oeste do Brasil. Realizamos um estudo de abordagem qualitativa, com a utilização de seis grupos focais compostos por 54 estudantes dos cursos de Educação Física, Nutrição e Saúde Coletiva da Universidade de Brasília. Utilizamos um roteiro de perguntas semiestruturado para dinamizar as sessões e garantir similaridade na condução dos diálogos. O processo de organização e categorização das falas foi realizado com auxílio do software ATLAS.ti 7.0 (Qualitative Research and Solutions). Para proceder à categorização das informações, tomamos como referência a análise de conteúdo temática proposta por Bardin. A maioria (72%) dos participantes era do sexo feminino, com idade média de 21,3 (DP± 2,1) anos, da raça/cor da pele parda (44%), não trabalhava (96%), matriculado em períodos intermediários do curso (83%) e pertencente ao nível socioeconômico da classe B (67%). Das percepções dos estudantes sobre os significados de ter um EV saudável emergiram relatos que relacionam o EV aos comportamentos normatizados socialmente, tais como atividade física, nutrição e sono. No entanto, foram mais recorrentes os relatos que destacam a relação do EV com os determinantes sociais de saúde. Na sequência, ao tentar compreender se a condição de estudante de um curso de saúde contribuía para um EV saudável, emergiu a categoria que remete a um paradoxo entre a formação em saúde e ser saudável. Os universitários reconhecem a contribuição dos cursos de saúde para a aquisição de conhecimentos teóricos sobre o EV saudável, no entanto, destacam que fatores do contexto universitário, da rotina acadêmica de seu curso e de suas condições de vida influenciam suas escolhas de EV. Quanto ao significado de “ter um EV saudável”, as narrativas dos estudantes sugerem a presença das duas abordagens, comportamental/individual e abordagem social/coletiva, também observadas na literatura científica e nas práticas sociais em saúde. Críticas à abordagem comportamental de EV advêm por não adotarem um olhar complexo sobre o tema de modo a considerar aspectos sociais, como o modelo econômico e a cultura, incidentes na construção coletiva das práticas. O referencial teórico da promoção da saúde apresenta o conceito ampliado de saúde e de determinação social, agregando outros níveis ao modelo centrado no sujeito biológico para pensar a relação entre EV e saúde, destacando fatores, econômicos, políticos, ambientais e culturais como determinantes ou condicionantes dos processos de adoecimento e destaca o poder de coletividades empoderadas na construção de EV saudáveis. Quanto ao questionamento segundo o qual o fato de ser estudante de um curso de saúde contribuía para a adoção de EV saudáveis. Em suas narrativas, os graduandos foram quase unânimes em reconhecer que têm um conhecimento aprofundado sobre saúde, todavia, os fatores relacionados à vivência acadêmica e outros relacionados às suas condições de vida influenciam decisivamente para que não consigam adotar práticas sociais saudáveis. Tal achado ajuda a explicar por que a maioria das pesquisas sobre EV e saúde de estudantes dos cursos de saúde apresentam resultados similares a outras populações universitárias. A rede de significados entrelaçados nas vozes dos estudantes dos cursos de saúde da UnB mostra que convivem, de forma por vezes conflitiva, diferentes visões sobre EV e saúde. Sobre esse aspecto conceitual, é preciso considerar que o campo científico é um espaço de conflitos e de concorrências, onde os participantes rivalizam com o intuito de estabelecer um monopólio sobre determinado tipo de capital. Os relatos evidenciaram que a formação está contribuindo para uma percepção ampliada do significado do EV saudável, no entanto, os aspectos da rotina acadêmica, do contexto universitário e das condições de vida dos estudantes influenciam em suas escolhas de práticas sociais saudáveis. Uma Universidade verdadeiramente promotora da saúde será realidade quando todas as políticas, currículos, cursos e estratégias considerarem as demandas inerentes às vulnerabilidades sociais imbricadas nas condições de vida dessa população. Os resultados aqui apresentados podem fornecer as bases para análises mais aprofundadas, dos processos de formação, das práticas de saúde e da produção científica sobre tema tão relevante na contemporaneidade
Palavras-chaves: Estudantes de Ciências da Saúde; Ciências Humanas e Sociais em Saúde; Pesquisa Qualitativa
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