30/09/2019 - 15:00 - 16:30 EO/CB-17E - GT 17 - Iniquidades em Saúde: Análise de Trajetórias de Vida, Formas Sistemáticas de Adoecimento e Intervenções Sobre os Seus Determinantes. |
31108 - CÂNCER E DENGUE NOS MUNICÍPIOS DO NORDESTE BRASILEIRO: UM PROBLEMA ESTRUTURAL DE SANEAMENTO AMBIENTAL JULIO CESAR BARRETO DA SILVA - UERJ, CARLOS JOSÉ SALDANHA MACHADO - FIOCRUZ, CRISTINA ARARIPE FERREIRA - FIOCRUZ, DANIELE GONÇALVES NUNES - UERJ
A realidade urbana nacional é caracterizada por históricos processos de crescimento desordenado, planejamento inadequado e investimentos em saúde. Por consequência direta, o saneamento ambiental se tornou um problema central diante do crescimento populacional, das ocupações irregulares que, em conjunto, aumentam exponencialmente riscos de infecções virais nas populações urbana por veiculação hídrica e consumo de alimentos (MACHADO, 2012). O presente trabalho evidencia, baseado na leitura quantitativa da realidade, por método de Pearson (MOORE, 2007), as relações entre Câncer de Colo de Útero (SISCAN) e Dengue (SINAN-Net), sobre 369 indicadores de saneamento (SNIS), nos 1794 municípios do Nordeste brasileiro (NEB), ano de 2017. Trata-se de uma questão estrutural em saúde pública, visto o alarmante número de diagnósticos confirmados sobre aquele tipo de câncer, 6.352.122 casos no país e 1.942.522 no NEB, comparados à dengue, 239.393 casos no Brasil e 83.602 no NEB, em 2017. Estas doenças apresentaram uma resposta média geral àqueles indicadores de 32,13% (câncer) e 22,93% (dengue). Há alta correlação da dengue, principalmente, com indicadores de resíduos domésticos (RDO) e de resíduos públicos urbanos (RPU): RPU coletados por agentes privados (CO113; 94,32%) e por todos agentes (CO115; 94,06%); RDO coletados por outros agentes (CO140; 94,15%), por todos agentes (CO111; 88,45%) e por privados (CO109; 85, 69%); RDO e RPU coletados por outros agentes (CO142; 93,92%) e por todos agentes (CO119; 78,04%; 79,79% para câncer); volume de água fluoretada (AG027, 87,10%; 30,11% para câncer); despesa dos agentes públicos com o serviço de varrição (FN2012; 76,73%); ligações ativas de água micromedidas (AG004; 75,63%; 77,64% para câncer). As correlações observadas sobre dengue corroboram com os achados de Silva e Machado (2019). Quanto ao câncer, destacaram-se indicadores relacionados à água: volume produzido (AG006; 87,04%), macromedido (AG012; 85,81%), faturado (AG011; 84,63%), micromedido (AG008; 83,71%) e consumido (AG010; 83,44%); despesa operacional direta (FN002; 85,70%) e total (FN001; 85,49%); extensão da rede de abastecimento (AG005; 85,31%) e ligações totais (AG021; 82,19%). Para além destes índices, a realidade observada evidenciou a questão da qualidade da água, especificada na resposta à quantidade de amostras para coliformes totais com resultados fora do padrão (QD027; 35,1% para câncer e 41,16% para dengue) e pelo uso abusivo de produtos químicos para tratamento da água, visto na relação com despesa com produtos químicos (FN011; 65,9% para câncer e 58,32% para dengue) e pela quantidade de amostras para cloro residual fora do padrão (QD007; apenas significativa para câncer a 27,65%). Todas as correlações citadas tiveram alto nível de significância (p-valor < 0,0001). Considerando-se os percentuais aqui encontrados e a relevância do tema tratado, os números apontam para uma realidade estarrecedora, pois leva o leitor a refletir sobre o quanto gastos inadequados com despesas para tratamento de água, com uso de produtos químicos indevidos, concorrem para os casos de câncer, uma doença que atinge milhões de brasileiros anualmente. Logo, reforça-se aqui a necessidade de investimento em educação e saúde, em especial, em pesquisas que visem disponibilizar informações sobre a qualidade da água para consumo humano. Principalmente, estudos que possam, em linguagem acessível, levar ao conhecimento da população quais são os riscos ambientais e os fatores, em se tratando de saúde, ligados aos componentes químicos usados para o seu tratamento. Propõe-se, entre outros objetivos, dar ênfase às iniquidades em saúde que envolvam doenças relacionadas a esta problemática, tanto no que tange às causas sociais quanto à conscientização dos riscos que se comprovam por meio de estudos epidemiológicos. Para isto, faz-se necessária uma política de assistência por parte da União e dos Estados que possibilite aos municípios, especialmente os de médio e de pequeno porte, a ampliação real das chances de adequação aos requisitos da Lei nº 11.445/2007, que trata da Política Federal de Saneamento Básico, de modo a consolidar, de forma definitiva, ações de saneamento efetivas, eficientes e eficazes, nos moldes dos princípios da universalidade, integralidade e equidade do SUS. De fato, avançar nesse sentido passa pela apropriação, por parte da sociedade, de instrumentos de participação e controle social (PITERMAN, HELLER & REZENDE, 2013). Segundo Machado et al. (2013), uma das premissas para a promoção da relação saúde-saneamento-cidade é as políticas públicas contribuírem para a redução de iniquidades como condição para uma sociedade sustentável; para isto, ações de ordem jurídica e administrativa precisam ser empreendidas e instituídas em relação aos atores-chave do processo, em especial, quanto à satisfação das necessidades sanitárias básicas, uma das principais fontes dos problemas de saúde pública, particularmente, em áreas urbanas.
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