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Grupos Temáticos

30/09/2019 - 13:30 - 15:00
EO-27E - GT 27 - Gestão autonoma e participativa da medicação

31213 - USO DE PSICOTRÓPICOS E COGESTÃO DO CUIDADO: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA
TALITHA DEMENJOUR SILVA - UFRJ, EROTILDES MARIA LEAL - UFRJ


Sabemos que, desde o nascimento da Medicina Social, nos finais do século XVIII, houve uma socialização da medicina, principalmente a partir do viés capitalista, com o intuito de controle dos corpos e do processo de morrer/viver.
Segundo Canguilhem (1966), a partir do século XIX houve uma dogmatização sobre a realidade dos fenômenos vitais normais e patológicos, que, se aparentemente são tão diferentes, as experiências humanas deram valores opostos. Essa oposição e significação de ambos como bom versus mal, mocinho versus vilão, fez com que, durante o tempo, o ser humano percorresse uma busca implacável pela cura e a medicina foi vista como soberana em sua prática e saberes. À grosso modo, houve uma normalização da prática e do saber médico e, em consequência, uma apropriação do sofrimento humano pela medicina.
A partir da década de 1950, a indústria farmacêutica faz uma aliança com a medicina, principalmente com a psiquiatria e, surge o que chamamos de medicalização do sofrimento psíquico. Em 1971, Thomas Szasz já demonstrava que com o tempo, as tradicionais fronteiras entre a normalidade e o patológico foram desaparecendo e, com isso novos comportamentos e formas de sofrimento psíquicos passaram a serem incorporados ao campo de assistência em saúde. Com isso, maior fabricação de doenças e consequentemente, maior fabricação de cura através da medicalização. Chamamos esse fenômeno de “Fabricação da doença mental” (FREITAS; AMARANTE, 2015)
Com o tempo, houve um aumento no uso de substâncias psicotrópicas e grande preocupação mundial sobre o seu consumo excessivo, principalmente em relação aos benzodiazepínicos. Dá-se a responsabilidade desse crescimento ao aumento da frequência de diagnósticos de transtorno psiquiátrico na população, à introdução de novos psicofármacos no mercado farmacêutico e as novas indicações terapêuticas dos já existentes. (MOURA; PINTO et al, 2016)
Sendo assim, este relato visa contar a experiência sobre o uso abusivo de psicotrópicos e a autonomia do usuário em relação ao seu adoecimento/tratamento vivenciada em uma Unidade de Saúde da Família (USF) no município de Piraí/RJ e iniciada em janeiro de 2018 e ainda não finalizada. Uma das autoras do estudo é enfermeira de família nesse munícipio e, desde a sua entrada na USF, observou que havia um numero significativo de pacientes em uso de psicotrópicos. Quando observado os prontuários eletrônicos desses pacientes, pode-se perceber que, na maioria deles, não havia uma descrição sobre o real motivo de terem iniciado esses medicamentos, apenas repetição da receita e, muitas das vezes, na ausência do usuário. Durante as consultas, ao indagar aos usuários sobre o uso dos psicotrópicos, notou-se que a maioria deles não sabiam seus diagnósticos e justificavam o uso dos medicamentos a sintomas específicos que tinham como: dificuldade para dormir, ansiedade, sentir-se deprimido, entre outros. Por isso, houve um interesse em compreender melhor como que se dava esse fenômeno em torno do uso de medicamentos psicotrópicos.
Os resultados que estão sendo encontrados durante esse período de observação desses usuários é que, na maioria dos casos, o médico que prescreve a medicação pouco fala sobre os possíveis efeitos colaterais, riscos e sintomas que o medicamento pode gerar, principalmente em relação ao seu uso a longo prazo e que, quando há espaço de dialogo sobre a experiência de adoecimento do usuário, este é limitado e há pouca escuta ativa por parte do profissional. Em relação aos usuários, eles não se sentem acolhidos o suficiente para relatar sua experiência com a medicação então faz uso dela da forma que acredita ser a melhor, nem sempre seguindo a prescrição médica. Pode-se observar também que há um perfil desses usuários e que a grande parte são mulheres, negras, com baixo poder aquisitivo e faixa etária diversificada. Sobre os medicamentos usados, a maioria compreende-se por benzodiazepínicos e antidepressivos.
Na saúde da família, uma das melhores maneiras de estabelecer um vinculo e sucesso no tratamento com o usuário é escuta-lo e acolhe-lo. Infelizmente, grande parte dos profissionais esquecem dessa potente ferramenta e possuem uma postura inflexiva e pouco dialógica com o usuário, o que acaba acarretando, por vezes a não adesão do mesmo ao tratamento. A dificuldade de compreensão da experiência de adoecimento do individuo tem como consequência diagnósticos e prescrições medicamentosas equivocadas, o que pode acarretar em um abuso dessas substancias e, por vezes, prejuízos maiores do que os causados pelos próprios sintomas do usuário.
É importante que os profissionais de saúde aprendam a lidar com as questões de adoecimento dos indivíduos entendendo-os como um corpo ativo em todo o processo. Invariavelmente, essas pessoas vão tomar suas decisões de cuidado de acordo com suas próprias crenças, sendo assim, é muito mais potente para o tratamento que este seja tomado em decisão compartilhada entre o cuidador e quem está sendo cuidado.

local do evento

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