46240 - ENFERMAGEM NA ATENÇÃO PRIMÁRIA NO RIO DE JANEIRO-RJ: CRISE, TERCEIRIZAÇÃO E A REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA NO PROCESSO DE TRABALHO DAS PROFISSIONAIS AMANDA DE LUCAS XAVIER MARTINS - UERJ, HELENA MARIA SCHERLOWSKI LEAL DAVID - UERJ
Apresentação/Introdução Nas análises de Ricardo Antunes (2009, 2010a, 2018), dois aspectos são centrais para entender os efeitos da crise e reestruturação produtiva no contexto concreto do trabalho: 1) a manifestação da “era da precarização estrutural do trabalho” no setor serviços e 2) a adesão aos “novos métodos de gestão organizacional” nos processos de trabalho no setor. Antunes (2018) indica a expansão do capital e ampliação da exploração e extração de mais valor através dos processos de terceirização entre empresas, mas, também por dentro dos serviços públicos com práticas privatistas. O Rio de Janeiro – RJ adotou as Parcerias Público-Privadas para prestação de serviços na área da saúde a partir da lei municipal nº 5026, de 2009. A ampliação da cobertura dos serviços de Atenção Primária no município foi acompanhada pela terceirização da gestão. O município conta com cerca de 20 Organizações Sociais (OS) (PREFEITURA DO RIO DE JANEIRO, 2021) que prestam serviços na rede pública de saúde. Na mesma rede, há uma miríade de contratos precários que vão desde a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) à Pessoa Jurídica (PJ). A Reforma Trabalhista em 2015 criou as condições de trabalho intermitente e a ampliação irrestrita da terceirização.
Objetivos Analisar a reestruturação produtiva nos aspectos da organização do processo de trabalho, relacionados a intensificação do trabalho da enfermagem na Atenção Primária.
Metodologia Este estudo é fruto da tese de doutorado da autora e apoia-se no materialismo histórico-dialético para se debruçar sobre o objeto de estudo relacionado a crise no trabalho da enfermagem na Atenção Primária como momento e parte de uma totalidade social. Realizado pesquisa de campo no Rio de Janeiro-RJ durante o ano de 2020. A coleta de dados aconteceu em três unidades de saúde (2 Centros Municipais de Saúde e 1 Clínica da Família) entre as “ondas” de incidência da pandemia, de agosto e setembro. Aplicado questionários semiestruturados, entrevistas e observação participante por 60h com 48 profissionais entre enfermeiras (14), técnicas/auxiliares de enfermagem (31) e gestoras (3) na zona oeste do município do Rio de Janeiro-RJ.
Resultados e discussão Participaram 17 enfermeiras e 31 técnicas/auxiliares de enfermagem, distribuídas em unidades de modelos distintos: uma do “tipo A” apenas ESF e duas do “tipo B”, ESF e o formato tradicional. Após a demissão de equipes inteiras e fechamento de Clínicas de Família em 2017, o Rio de Janeiro-RJ reorganizou os serviços de Atenção Primária, redimensionando o número de equipes e reconfigurando o processo de trabalho nas unidades, visando aumentar a produtividade através da aplicação do modelo de gerenciamento do trabalho do lean production a partir da articulação de engenheiros de produção com a Subsecretaria de Promoção da Saúde Atenção Primária e Vigilância de Saúde (SUBPAV, 2018). Para as profissionais as mudanças representaram graves retrocessos nas condições de trabalho: [...] foi começando a reduzir, reduzir, reduzir… reduziu equipe, reduziu funcionário, foi reduzindo. Atrasos salariais de greve. [...] Então, assim, muita coisa ficou muito enrolada e até hoje vai ficar enrolada por conta dessa questão, né, de troca, de redução, enfim de tudo (Enf. 17 BR)No momento da realização da pesquisa estava em andamento a troca de gestão das OS e ouvia-se que os contratos dos profissionais seriam renovados, não mais pela CLT, mas por PJ para enfermeiras e médicos: Agora ser pessoa jurídica agora... todos os médicos estão aqui, por exemplo, falaram que não vão ficar. Tem enfermeiro que também que já falou que não vai ficar, tem técnico que falou que também não vai ficar... Então você vai perder isso... A gente já está esperando que a cada dois, três meses vem um profissional para começar tudo de novo aquilo que você já estava levando bem. (Enf. 9 BR)[...] infelizmente essa mudança aí do contrato da OS que deixou toda essa insegurança, porque a gente está vendo, aliás a gente está acompanhando, que a gente está ficando sem médico, né, sem profissional médico, né, nas equipes pra poder atender. (Enf. 12 BR). O processo de trabalho intensificado é permeado pela assistência aos muitos casos clínicos que surgem para atendimento. Quanto mais usuários atendem, melhores os resultados de produtividade, devendo ser em um tempo reduzido, pela pressão das demandas nas unidades.[...] a população aumenta e não aumentam as unidades. Agora fecha as clínicas da família, então aquilo vai sobrecarregando uma outra unidade, então fica muito, tem bastante trabalho. Mas, ainda tá dando pra gente levar, mas que tem bastante trabalho, tem. (Tec. Enf. 29 BR)
Conclusões/Considerações finais A precarização estrutural, que precedeu e prosseguiu nos serviços na pandemia, foi, por assim dizer, fatal para as profissionais de enfermagem durante o enfrentamento da pandemia: desgastadas e desprotegidas nos cenários dos serviços de Atenção Primária para lidar com a gravidade do que representou a pandemia do Covid-19 no município.
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