Comunicação Oral

01/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO6.1 - Colonialidade nas políticas de saúde

47059 - O QUE VEM DEPOIS DA IMPLEMENTAÇÃO DA RESERVA DE VAGAS PARA PPP NOS CONCURSOS? ENCRUZILHADAS PARA A CONSTRUÇÃO DE ESTRATÉGIAS ANTIRRACISTAS NO SUS
SOPHIA ROSA BENEDITO - FESAÚDE/IMS-UERJ, RENATA PORTO - FESAÚDE, ADRIANE FABLÍCIO - SMS NITERÓI, ALEXANDRA DA SILVA GOMES - FESAÚDE, ANA PAULA ALVES GREGÓRIO - FESAÚDE, DÉBORA RAFAELA DE CARVALHO FELIX - FESAÚDE, RAYSSA GALDINO MARINHO DA SILVA - FESAÚDE, ANA LUIZA PEREZ DA COSTA - FESAÚDE, CASSIO LUIS PASIN DO COUTO - FESAÚDE


Contextualização
A formação sócio-cultural brasileira se deu a partir da colonização exploratória, genocídio indígena, escravismo de povos africanos, miscigenação forçada e políticas de branqueamento que perpetuaram o "mito” da democracia racial. Apesar disso, a construção de políticas públicas como o SUS foram forjadas a partir de sujeitos universais não racializados.
Essa não racialização foi e é produzida pelo pacto narcísico da branquitude, operado por um acordo tácito entre os brancos de não se reconhecerem como parte essencial na permanência das desigualdades raciais no Brasil, buscando evitar uma responsabilização por suas diferentes dimensões de privilégio (BENTO,2002).
Apesar disso, a maior parte da população brasileira é negra (50,6% IBGE, 2010; 55,8% IBGE, 2022), além de representar a maioria entre os usuários que dependem exclusivamente do SUS para acessar a assistência à saúde. A despeito disso, autores da Saúde Coletiva (WERNECK, 2016; BATISTA, BARROS, 2017; ANUNCIAÇÃO et al, 2022), identificam que a formulação de políticas de saúde não dá acenos contundentes para enfrentar as expressões do racismo no SUS, nem de reconhecer os efeitos da branquitude em suas estruturas.

Descrição
O município de Niterói/RJ, teve em 2019, o maior índice de segregação racial (IBGE). Considerando a importância de agir por ações afirmativas rumo à reparação deste processo, inclusive nas estruturas das políticas de saúde, a Fundação Estatal de Saúde de Niterói (FeSaúde), foi a primeira instituição no âmbito público a aplicar a Lei municipal nº 3110/2014, que instituiu a reserva de vagas para pessoas pretas e pardas (PPP) nos concursos públicos.
Do total de 49.163 inscritos, 11,3% se autodeclararam PPP. Entre as 708 pessoas inscritas como PPP, 77% tiveram autodeclaração confirmada, e 23% foram consideradas inaptas (faltas e não reconhecimento de características fenotípicas). Dos admitidos em 2022, 20,6% ingressaram pelas vagas para PPP (BENEDITO, et al, 2022).
A efetividade desta reserva de vagas gerou um enegrecimento dos trabalhadores do SUS em Niterói. Por consequencia, evidenciou-se, nos cotidianos do processo de trabalho, a necessidade de ações institucionais que passam pela elaboração de políticas alinhadas à gestão pública e ao SUS.

Período de Realização
Entre 2022 e 2023

Objetivos
Descrever o mapeamento de necessidades geradas a partir da implementação da reserva de vagas para PPP em concurso público e analisar as encruzilhadas para a efetiva construção de políticas que colaborem com um SUS antirracista.

Resultados
Dentre as necessidades mapeadas, pode-se elencar: 1) a aplicação da heteroidentificação nos processos seletivos simplificados para as funções sem cadastro de reserva no concurso; 2) monitoramento das condições de permanência dos que ingressaram pela reserva de vagas; 3) promoção de ações de gestão de pessoas com foco na área de Diversidade, Equidade e Inclusão (DE&I); 4) ações de educação permanente e continuada para o letramento racial e uma formação antirracista em saúde; 5) aquisição de insumos e contratação de prestação de serviços que contribuam para a promoção da igualdade racial; 6) garantir a representação diversa nas peças de comunicação interna e externa; 7) fomentar o preenchimento do quesito raça/cor nos cadastros e nos sistemas de informação; 8) apoiar as equipes no desenvolvimento de um cuidado equânime a população negra; 9) garantir o alinhamento à cultura institucional incorporando na governança, fluxos nítidos que descrevam as consequências para práticas discriminatórias; e 10) garantir uma estrutura de gestão para executar, monitorar e avaliar as políticas de promoção da DE&I.

Aprendizados
Parte importante das necessidades mapeadas dialogam com as estratégias de gestão para a implementação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN). Esta constatação evidencia que a reserva de vagas é estratégica para a sua efetivação, na medida em que enegrece mais o SUS a partir da presença de trabalhadores negros oriundos de um processo consciente de reparação. Além disso, ganham visibilidade, dimensões não descritas na política, como o fluxo de apuração de consequências para práticas discriminatórias, a aquisições de insumos e prestação de serviços, assim como nas políticas de comunicação.

Análise Crítica
A estrutura do SUS pressupõe historicamente um corpo de trabalhadores universais à semelhança de sujeitos brancos, como efeito do pacto da branquitude (BENEDITO,2022). Recentemente, na medida em que se evidenciam as estruturas raciais que visibilizam a branquitude e se avança na discussão racial, fortalece-se as condições de implementar estratégias descritas pela PNSIPN. Para tanto, é um desafio mobilizar os diversos atores, para incluir tal agenda como prioridade, no contexto de implementação de um novo modelo de gestão, como é o caso da FeSaúde, com o intuito de viabilizar formas de investimento para que tais ações mapeadas possam se converter em políticas institucionais.