Comunicação Oral

01/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO12.1 - Epistemologias da Saúde desde o Sul: Pensamento crítico latino-americano e a virada decolonial

46070 - “ESSE CONHECIMENTO TAMBÉM É VÁLIDO NOS DIAS DE HOJE”: VALIDAÇÃO SOCIAL DESDE O SUL E AS PRÁTICAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES EM SAÚDE
VINICIUS PEREIRA DE CARVALHO - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA, MARIA THEREZA ÁVILA DANTAS COELHO - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA, MARIA BEATRIZ BARRETO DO CARMO - UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA


Apresentação/Introdução
As Práticas Integrativas e Complementares traduzem uma diversidade de manejos e compreensões da saúde, visto que abrangem recursos provenientes de diferentes temporalidades e culturas. Ainda que as Práticas Integrativas estejam (re)emergindo na cultura contemporânea, a biomedicina exerce dominação de matriz colonial no campo da saúde, afirmando-se como o único caminho possível para validar os saberes e práticas. Nesse sentido, a biomedicina e a racionalidade científica moderna instrumental materializam as epistemologias do Norte nesse campo. O Norte pode ser caracterizado como a parcela geopolítica do globo que regula sistemas de dominação e violência sobre uma outra parte, denominada como o Sul. As epistemologias da saúde desde o Sul surgem da necessidade de reconhecer e legitimar as experiências de cuidado invisibilizadas e excluídas no processo de dominação colonial.

Objetivos
Objetivamos compreender as concepções de estudantes de um curso universitário da área da saúde sobre a validação social das Práticas Integrativas e Complementares.

Metodologia
Esta é uma pesquisa qualitativa baseada no diálogo entre compreensões ampliadas da saúde e epistemologias do Sul. Em relação às Práticas Integrativas, consideramos o abrangido na Política Estadual de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde da Bahia: racionalidades médicas, práticas corporais e vivências integrativas, práticas energéticas/vibracionais e meditativas/contemplativas, terapias baseadas em produtos naturais/plantas medicinais e práticas tradicionais e populares. Participaram do estudo graduandos com matrícula ativa em um curso superior em saúde de uma universidade federal na Bahia. Realizamos entrevistas semiestruturadas e as analisamos empregando a análise de conteúdo categorial temática. Neste trabalho, apresentamos os resultados da categoria “concepções sobre a validação social das Práticas Integrativas e Complementares”. O projeto foi aprovado por um Comitê de Ética. Com o intuito de manter o anonimato, os participantes foram identificados de acordo com a numeração atribuída às entrevistas.

Resultados e discussão
Segundo os estudantes, as Práticas Integrativas e Complementares possuem um arcabouço tradicional e popular que sustenta o seu reconhecimento na cultura contemporânea, sendo preciso questionar a conformação do que denominamos como ciência e o seu uso exclusivo na validação dos saberes e fazeres situados no campo da saúde: “[...] um conhecimento tradicional e esse conhecimento também é válido nos dias de hoje. Desde de pequeno que eu utilizo algumas ervas que minha avó cultivava. Minha avó é uma pessoa que nunca teve acesso a essa ciência [...]” (1); “[...] nem tudo tem que ser provado nesse paradigma que a gente tem de ciência ocidental. Acho que a ciência nem sequer tem uma ferramenta para questionar a si própria, então tudo que vem da ciência acaba sendo verdade absoluta [...]” (4). Os participantes apontam também que essas práticas possuem um embasamento científico porque “[...] diversas práticas têm resultado muito significativo para diversas pessoas e isso tem embasamento científico, basta pesquisar para ver [...]” (3). Esses resultados revelam que os estudantes acreditam que o modelo hegemônico de ciência não é o único meio para validação de saberes e práticas em saúde. A massificação representada pela monocultura do saber-fazer biomédico reduz as experiências de mundo e transpõe a dominação colonial, capitalista e neoliberal para as corporalidades e subjetividades no campo da saúde. Ao questionarem essa monocultura, esses estudantes corroboram com a visibilização das Práticas Integrativas e Complementares. As práticas tradicionais estão no Sul na medida em que ilustram um conjunto de fazeres que resistem nos territórios de cuidado diante da imposição colonial da biomedicina. Desse modo, quando consideramos a legitimação de Práticas Integrativas a partir dos conhecimentos tradicionais e populares que as originaram, o campo da saúde é aberto para a possibilidade de uma virada decolonial, contemplando intepretações sobre a saúde baseadas em diferentes culturas de cuidado, apontando assim para uma ecologia de saberes. Destacamos que as falas dos discentes não foram produzidas no contexto de negação da biomedicina, mas da atitude contra-hegemônica e em contraposição às monoculturas. Trata-se de reconhecer o cuidado produzido pelos povos e culturas subjugadas pelos dispositivos da colonização.

Conclusões/Considerações finais
A aproximação com diferentes formas de produção do conhecimento com o intuito de favorecer a superação da monocultura da biomedicina é um imperativo no campo da saúde. Os conhecimentos tradicionais e populares podem funcionar como ferramentas para o reconhecimento dos saberes que surgem das vivências em saúde e enredam os cuidados cotidianos em Práticas Integrativas e Complementares. Acreditamos que a recomposição do cuidado com a abertura institucional para essas práticas pode ser capaz de promover o exercício da democracia nos serviços e a solidariedade em saúde na América Latina.