Comunicação Oral

01/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO16.1 - Temas de Saúde Reprodutiva

48155 - GESTAR, PARIR E MATERNAR: UMA EXPERIÊNCIA AUTOETNOGRÁFICA
VITA GUIMARÃES MONGIOVI - FPS


Contextualização
No Brasil, segundo país com maior realização de cesáreas no mundo, equivalente a 57% dos partos e 87% no setor privado, a pandemia de Covid-19 demandou a reorganização da rede de assistência e ressaltou tendências culturais cesaristas1,2. A experiência do ciclo gravídico-puerperal pode ser desafiadora diante do cenário cultural hegemônico, biomédico, intervencionista, manipulador do processo reprodutivo e dos corpos femininos3, somado ao contexto pandêmico.
Com 35 anos, primigesta, gestação de risco habitual, foi em busca de uma assistência humanizada à gestação, parto e puerpério convergente com o ideal do respeito ao protagonismo da mulher, resgate da subjetividade, parto natural e garantia dos direitos da gestante4,5. Estes ideais, já estabelecidos em documentos oficiais e resguardados na legislação brasileira, mas nem sempre cumpridos na experiência real6,7.
Foi utilizada uma escrita nos moldes de uma autoetnografia para relatar uma experiência individual objetivando a construção de uma análise de cunho coletivo e cultural, do micro ao macro, sobre a experiência feminina no gestar, parir e maternar8-10. Destaca-se o lugar de fala da pesquisadora, mulher, nordestina, branca, classe média, nível superior, enfermeira, com privilégio de conhecimento técnico, ético-legal e político sobre o tema, que possibilitou a análise enquanto gestante, parturiente, puérpera, mãe, coexistindo com a enfermeira e pesquisadora.

Descrição
O acompanhamento inicial com um obstetra de perfil biomédico, trouxe procedimentos rotineiros injustificados para uma gestação de risco habitual, de medicalização à suposição de uma cesariana eletiva. O sentimento de vulnerabilidade perante a força das orientações médicas pode enfraquecer a gestante, por isso, com 20 semanas de gestação foi necessário reavivar o protagonismo e buscar mudanças no acompanhamento profissional.
A mudança da equipe de saúde foi decisiva para o desfecho positivo, com acompanhamento alternado entre médico e enfermeiras obstetras, e com a doula fisioterapeuta. A partir daí, o acolhimento respeitoso à família, resgate da autonomia, tomada de decisões compartilhadas, escuta atenta, estímulo à participação do pai no pré-natal, construção cuidadosa do plano de parto e o respeito aos direitos da gestante possibilitaram uma experiência positiva de gestação e parto. As Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) foram usadas como Terapia floral, Homeopatia, Auriculoterapia, Fitoterapia e Hatha yoga, trazendo benefícios. Os desafios do percurso como uma contaminação por Covid-19, hipertensão gestacional e a indicação de indução do parto com 38 semanas, foram contornados pela equipe.
A presença da doula, das enfermeiras obstetras e dos acompanhantes, pai e avó da criança, no trabalho de parto, desde o domicílio, e da equipe médica no hospital, trouxeram acolhimento e segurança. Foi um parto natural humanizado, com o mínimo de intervenções, sem uso de ocitocina, sem episiotomia, sem analgesia. Com respeito a hora de ouro e apoio à amamentação exclusiva.
Com a experiência exitosa do parto e a descoberta transformadora da maternidade, se iniciou o puerpério com novos desafios, dores, oscilações hormonais e de humor, privação de sono, demandas da amamentação exclusiva, novo papel social de mãe. Se faz relevante a rede de apoio familiar nuclear, extensa e extrafamiliar no puerpério e para retorno materno às atividades sociais e laborais.

Período de Realização
De Abril de 2022 a janeiro de 2023.

Objetivos
Relatar os êxitos e desafios de uma experiência de gestar, parir e maternar, a partir de uma autoetnografia.

Resultados
Em análise, se destaca positivamente a postura da equipe de saúde escolhida capaz de atuar na interprofissionalidade, com assistência humanizada e desfecho de sucesso no parto11. Bem como, os benefícios do uso de PICS enquanto recursos terapêuticos, possibilitando um parto com o mínimo de intervenções e o bem-estar no puerpério12. É fundamental destacar a rede de apoio familiar, em colaboração às demandas existentes de suporte à mãe, cuidados ao bebê e rotina domiciliar13.

Aprendizados
Dos desafios, cabe refletir sobre um cenário social enfraquecido de apoio à parentalidade, e a insuficiência da legislação trabalhista para licença maternidade que diverge no tempo da recomendação para o aleitamento materno exclusivo.

Análise Crítica
Urge refletir sobre o rompimento social com uma cultura e formação biomédica, intervencionista e controladora, que banaliza condutas violentas e inibe o protagonismo da mulher na sua experiência reprodutiva. Tal contexto dificulta o processo e restringe a assistência humanizada a um pequeno grupo de profissionais realmente comprometidos, para que se alcance resultados positivos na experiência intensa do gestar, parir e maternar, com impactos na vida da mulher e da criança.