47908 - A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E A TOMADA DE DECISÃO NA SAÚDE: UM ESTUDO PRELIMINAR DA CONCEPÇÃO DE UMA POLÍTICA NACIONAL DE INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL MARIANA MACHADO - USP, AUREA MARIA ZÖLLNER IANNI - USP
Apresentação/Introdução A portaria nº 4.617 de abril de 2021 do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), modificada em julho de 2021 pela portaria nº 4.979, instituiu a Estratégia Brasileira de Inteligência Artificial (EBIA) para nortear a ação do Estado brasileiro em relação à Inteligência Artificial (IA).
Como recurso tecnológico, a IA pode ser compreendida como um sistema técnico informacional com a capacidade de propor resoluções de problemas e tomadas de decisão através de grandes quantidades de dados e algoritmos. Sua definição permanece em disputa, podendo ser considerada uma simulação da capacidade humana de percepção ou um sistema independente de instruções humanas.
Sua implementação é agregada em ritmo crescente pelos setores privado e público, e seu uso na clínica, na epidemiologia e na gestão ganham destaque na saúde. Apesar de conferir importantes contribuições na produtividade e na qualidade de análises, contrapontos sobre aspectos éticos, legais, e sociais dessa tecnologia são suscitados.
A IA, como ferramenta de aferição de causalidade complexa, compartilha o conjunto de características de padronização, replicabilidade, alcance prognosticador e resolutividade do quadro comum científico. Na perspectiva das mudanças sociais contemporâneas, a constante tensão entre a radicalização da modernidade, vulnerabilidades e o desenvolvimento tecnocientífico gera, junto à produção contínua e sistemática de ferramentas preditivas, maiores incertezas e inseguranças no contexto da sociedade de risco. Segundo esse referencial, embora esses sistemas informacionais possam ajudar a mitigar alguns riscos conhecidos, podem também gerar dependência excessiva e novos tipos de riscos, criando vulnerabilidades invisíveis e causando efeitos sistêmicos, sociais e políticos, imprevisíveis.
Objetivos Analisar as portarias ministeriais nº 4.617/2021 e nº 4.979/2021 que instituem a EBIA entre os anos de 2018 e 2021, com foco nas estratégias para o setor saúde, considerando o referencial teórico da literatura sociológica contemporânea sobre tecnologia, risco e tomada de decisão.
Metodologia Trata-se de uma pesquisa de natureza exploratória e de abordagem qualitativa, realizada a partir de pesquisa documental, revisão bibliográfica e discussão teórica. O material coletado e tratado, será sistematizado e analisado com foco nas estratégias propostas ao setor saúde, fomentando discussão teórica com base em publicações do campo da saúde coletiva e da literatura sociológica contemporânea sobre tecnologia, risco e tomada de decisão.
Resultados e discussão A EBIA é organizada em nove eixos, a partir dos quais são enunciadas ações estratégicas. Nos eixos, são citados temas de: avaliação e gestão de risco, auditoria de inferência, democracia, direitos humanos e comitês de ética, responsabilidade legal, cooperação internacional, mercado de trabalho, literacia digital, capacitação técnica, adaptação do usuário, integração de IA e viés. Além do que é abordado em linhas gerais, a discriminação por parte de sistemas IA, os custos, o impacto ambiental e a adaptação da população ao uso são levantados como desafios para sua implementação em larga escala.
Diagnósticos e tratamentos em saúde são identificados como áreas de maior potencial de crescimento, com destaque para a redução de custos e erros operacionais, aumento de eficácia, flexibilidade e agilidade, e redução no tempo de trabalho em processos burocráticos e operacionais. Contudo, no que diz respeito a indicações de uso, cita apenas a IA na “assistência médica” e “na medicina” para diagnóstico médico, prevenção de surtos de doenças, desenvolvimento de novos medicamentos, ensino, exames automatizados, análises patológicas, imagens e microscópios de capacidade microcelular, e uso de drones para entrega de medicamentos, sem maior detalhamento ou discussão.
O projeto de lei que instaura o marco legal da IA no país foi aprovado em regime de urgência na Câmara dos Deputados em setembro de 2021, e aguarda apreciação do Senado. Especialistas criticam o projeto pela falta de diálogo, planejamento, diretrizes orçamentárias e aspectos éticos, alegando incoerência no caráter de urgência com o qual tramitou.
Conclusões/Considerações finais Dado que a Saúde Coletiva vem trabalhando de forma contínua na detecção, prevenção e em estratégias de controle de doenças, e atuando de forma hegemônica dentro dos marcos da modernidade reflexiva, é relevante analisar os projetos e execuções de IA no setor saúde, tendo em vista que sua natureza está ancorada na necessidade predição e contenção de riscos.
A EBIA não estabelece metas, planos de implementação, avaliação ou categorias para o detalhamento das ações estratégicas. Isto posto, o emprego da IA no setor deve ser avaliado por sua potencialidade para resolução de problemas, pela alteração na dinâmica distribuição de poder decisório e por sua existência enquanto produção tecnocientífica, considerando especialmente a carência de diálogo entre a EBIA e as particularidades do campo em questão.
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