Comunicação Oral

01/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO20.1 - Direitos reprodutivos: aborto e contracepção

46062 - PERMANENTES E PERSISTENTES DESAFIOS DA CONTRACEPÇÃO NA JUVENTUDE: O QUE NARRAM AS/OS ENTREVISTADAS/OS?
ELAINE REIS BRANDÃO - IESC/UFRJ, ANDREA TRUJILLO RODRÍGUEZ - FSP/USP, CRISTIANE SILVA CABRAL - FSP/USP


Apresentação/Introdução
O trabalho reúne alguns resultados de pesquisa multicêntrica socioantropológica coordenada pela FSP/USP, com apoio financeiro do CNPq, intitulada: “Juventude, sexualidade e reprodução: um estudo sobre mudanças e permanências nas trajetórias sexuais e reprodutivas de jovens brasileiros no cenário de relações sociais mediadas pelas redes sociais”. A investigação faz uma profunda imersão em questões atinentes à sexualidade, aos direitos reprodutivos e à sociabilidade juvenil, buscando compreender como se dão as formas de aproximação afetivo-sexual entre adolescentes e jovens no atual contexto de relações mediadas pelas redes sociais e como elas se associam a momentos de vulnerabilidade destes sujeitos em relação à ocorrência de uma gravidez imprevista.

Objetivos
Apresentar alguns resultados referentes às práticas contraceptivas destes adolescentes e jovens, contemplando os desafios impostos pelos marcadores sociais da diferença – pertencimento de classe, raça/etnia, gênero, regiões do país, contextos metropolitanos ou interioranos/ribeirinhos, apoio familiar ou de pares – para o enfrentamento do planejamento reprodutivo seja pelo Sistema Único de Saúde (SUS) ou via serviços de atenção médica privados.

Metodologia
Pesquisa multicêntrica socioantropológica, de abordagem qualitativa, realizada em 2021-2022, em diferentes regiões do país (AM, BA, SP, RJ, MG, RS), em cidades da capital e do interior, que possuem marcas socioculturais distintas e acesso diferencial às tecnologias digitais, serviços de saúde e educação. O material empírico congrega entrevistas individuais em profundidade com 200 jovens (em ambiente remoto ou presencial), a maioria deles cisgêneros, com idade entre 16 e 24 anos, de ambos os sexos, com experiências prévias de gravidez ou não, compondo um conjunto social e culturalmente diversificado, em termos étnico-raciais, de filiação de classe social, com práticas sexuais fluidas, que se conjugam e se complementam no repertório de experimentações sexuais possíveis com distintos parceiro/as (homo, hetero e bissexuais). A análise dos dados foi realizada a partir do software NVivo, tendo sido selecionado para este trabalho os aspectos atinentes às experiências contraceptivas destes adolescentes e jovens. A pesquisa foi submetida e aprovada nos respectivos Comitês de Ética em Pesquisa das universidades públicas participantes (USP; UFRJ; UFMG; UFBA; UFRGS).

Resultados e discussão
O perfil geral dos/as participantes do estudo nos ajudará a situar os respectivos contextos social, racial, regional e de pertencimento territorial dos jovens abordados, iluminando os contrastes encontrados em suas experiências contraceptivas. Elegendo a esfera das decisões e negociações entre pares para a efetivação da contracepção, com apoio ou não de profissionais de saúde e de serviços públicos, analisam-se os desdobramentos da utilização de métodos hormonais em corpos jovens, que sofrem com os muitos efeitos colaterais, sem muitas opções de métodos alternativos seguros e com menor impacto nos organismos femininos. Há uma expressiva alternância entre métodos naturais (coito interrompido, tabelinha), de barreira (preservativo masculino) e hormonais (injetáveis, pílulas, contracepção de emergência), na tentativa de se encontrar aquele método que mais se adeque ao momento vivido pelo casal/mulher, com menor impacto na saúde e corpo das mulheres. Essas sucessivas trocas e interrupções do método em uso, em razão de mal-estares, ganho de peso, dores de cabeça, perda de libido, etc. terminam abrindo espaço para momentos de vulnerabilidade e desproteção, advindo uma gravidez imprevista. Esse rol de experimentações e usos mal sucedidos dos métodos naturais e/ou hormonais conduz as jovens a desejarem precocemente uma solução “definitiva” ou menos provisória para a gestão reprodutiva. Assim, com a interdição do aborto e acesso restrito ao misoprostol (o qual circula em redes clandestinas de tráfico de medicamentos e outras substâncias), a ligadura de trompas ou o dispositivo intrauterino (DIU) – de cobre ou hormonal, nem sempre acessível no SUS – terminam sendo as opções preferenciais, sempre adiadas, em razão dos muitos trâmites burocráticos, das exigências institucionais que mediam tais procedimentos, da discordância e desrespeito por parte de profissionais de saúde à autonomia das jovens para decidirem o que desejam como método contraceptivo que melhor lhes satisfaça e gere segurança para desfrutarem da sexualidade sem medos, traumas ou intercorrências de saúde.

Conclusões/Considerações finais
Acreditamos que tais elementos possam fornecer pistas analíticas e evidências científicas para a retomada do debate público no Brasil da necessária reformulação de políticas de saúde e de educação voltadas a esse segmento geracional, contemplando suas necessidades e seus modos peculiares de sociabilidade em redes digitais.