01/11/2023 - 13:10 - 14:40 CO26.1 - Racismo estrutural, violências institucionais e direitos humanos: quais vidas importam? |
47586 - DIREITOS HUMANOS E POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA EM MEIO À PANDEMIA DA COVID-19 NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. LIDIANE BRAVO DA SILVA - ENSP/FIOCRUZ, ROBERTA GONDIM DE OLIVEIRA - ENSP/FIOCRUZ, MARIANA VERCESI DE ALBUQUERQUE - ENSP/FIOCRUZ
Apresentação/Introdução A crise sanitária ocasionada pela pandemia da COVID-19 escancara as vivências vulnerabilizadas e precarizadas, que são produto da colonialidade e da reprodução do racismo à brasileira. Dentre os grupos mais afetados, encontram-se as pessoas em situação de rua - cujo contingente populacional sofreu aumento, de acordo com estimativa divulgada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, em fevereiro de 2023. A noção dos direitos humanos, construída sobre a perspectiva do sujeito universal - tendo como referência implícita o branco -, ratificada pelos marcos legais nacionais como a Constituição Federal de 1988, não contempla grupos populacionais racializados enquanto pardos e pretos - negros. Por conseguinte, tais sujeitos - alvos de desigualdades sociais e raciais - encontraram-se ainda mais à margem ou mesmo excluídos da garantia de direitos, sobretudo o direito à saúde e o direito à vida.
O presente trabalho é oriundo da pesquisa de dissertação, e compõe uma das estratégias de disseminação da pesquisa “Marcador social de raça, acesso e cuidado à população negra em situação de rua na APS”, integrante da Rede de pesquisa com foco na Atenção Primária do Programa de Políticas Públicas e Modelos de Atenção e Gestão à Saúde, da Vice-Presidência de Pesquisa e Coleções Biológicas, da Fiocruz.
Objetivos Analisar a resposta do Estado - gestão municipal do Rio de Janeiro - à saúde da população em situação de rua no contexto da pandemia de COVID-19, tendo por base as questões racial e de direitos humanos. Para tal, foram pensados quatro objetivos específicos: mapear as ações de prevenção e atenção à saúde da população em situação de rua; coletar a percepção da gestão sobre as medidas emergenciais desenvolvidas pelo executivo municipal; identificar dinâmicas de violação dos direitos humanos sobre a população em situação de rua do Rio de Janeiro; e discutir a ação/omissão do Estado, por meio de políticas públicas, no sentido de assegurar a cidadania e saúde das pessoas em situação de rua.
Metodologia O estudo utilizou-se de pesquisa documental efetuada no site oficial da prefeitura do Rio de Janeiro, portal Transparência Rio, onde reúne os atos normativos desenvolvidos, nos anos de 2020 e 2021, para o enfrentamento à emergência sanitária causada pelo Coronavírus. Foram identificados um total de 891 atos normativos, segregados nas seções: leis municipais; decretos municipais; resoluções e resoluções conjuntas; e portarias e outros atos. Deste montante foram identificados 34 atos normativos destinados às pessoas em situação de rua ou que, em alguma medida, contemplem as necessidades desse público. Parcela expressiva são orientações acerca da condução dos serviços, no âmbito da Assistência Social e da Saúde, voltadas para este grupo populacional.
Realizou-se também observação participante com o objetivo de analisar a implementação das medidas emergências previstas nos atos normativos, junto aos profissionais da equipe de Consultório na Rua de Manguinhos, área programática 3.1, acrescida de entrevista com ator-chave da gestão na área da saúde para a população em situação de rua, no âmbito da coordenação central da estratégia de Consultório na Rua.
Resultados e discussão Por meio do processo de sistematização dos dados coletados - a partir das categorias: serviços, abrigamento, orientações na área da Assistência Social e Saúde, alimentação, higiene, e benefícios de transferência de renda - e posterior análise, foi possível observar que as medidas emergenciais desenvolvidas pelo poder executivo municipal foram insuficientes para garantir os direitos à alimentação, à moradia, à cidade, à assistência social, à saúde, e sobretudo o direito à vida - assegurados pela Constituição Federal de 1988 e dispostos na Política Nacional para a População em Situação de Rua. A escassez de ações, bem como a não ação/omissão por parte do Estado, age de forma a expor as pessoas em situação de rua ao risco de morte pelo SARS-CoV-2. A possibilidade de manutenção da vida se deu, em parte, com a atuação da sociedade civil organizada, em parceria com profissionais, principalmente das áreas da saúde e da assistência social, por meio de doações de álcool 70%, máscaras, água e sabão para a prevenção da doença, bem como outros insumos para assegurar a própria sobrevivência.
Conclusões/Considerações finais Diante o exposto é possível concluir que esta população ganha visibilidade nos territórios da rua, dado o esvaziamento das ruas, e também na política/agenda pública, na gestão municipal. No entanto, as medidas emergenciais direcionadas a este público são insatisfatórias, o que resulta no negligenciamento da cobertura das ações, bem como na agudização da violação dos direitos humanos das pessoas em situação de rua. O que por consequência mostra-nos que determinados corpos - em sua maioria negros, que ocupam historicamente o território da rua no Brasil (NASCIMENTO, 2016) - cuja humanidade é negada (FANON, 2008), são expostos às políticas de morte operadas pelo Estado (MBEMBE, 2018) por meio das ações e das não ações/omissões.
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