47677 - ACERVO POHA ÑANA: CONSTRUÇÃO PARTICIPATIVA COM OS GUARANI ÑANDEVA E GUARANI KAIOWÁ NO CONE SUL DO MATO GROSSO DO SUL KELLEN NATALICE VILHARVA - UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS, JOÃO ERNESTO DE CARVALHO - UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS, CAMILA TENÓRIO FERREIRA - INSTITUTO AGGEU MAGALHÃES, FIOCRUZ, PE, APARECIDA BENITES - SECRETARIA DE EDUCAÇÃO DO MUNICÍPIO DE AMAMBAI - MS, LÚCIA PEREIRA - CIENTISTA SOCIAL INDÍGENA, JOHN TAYLOR CHAMORRO DE AQUINO - GRADUADO EM HISTÓRIA-UEMS, RAFAEL MATOS XIMENES - UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO, RENÉ DUARTE MARTINS - UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO, PAULO CESAR BASTA - ESCOLA NACIONAL DE SAÚDE PÚBLICA, ISLÂNDIA MARIA CARVALHO DE SOUSA - INSTITUTO AGGEU MAGALHÃES, FIOCRUZ, PE
Contextualização Os Guarani Nãndeva e os Guarani Kaiowá são povos indígenas do Mato Grosso do Sul, território onde há conflito territorial entre latifundiários e indígenas que estão retomando suas terras ancestrais, resultando na morte de inúmeros Guarani Ñandeva e Guarani Kaiowá, o que gera (e é gerado por) muito racismo e preconceito contra os indígenas daquele estado. Os povos indígenas possuírem saberes e conhecimentos que, ao longo dos séculos, despertaram interesses diversos (científico, industrial, tecnológico e financeiro). Pesquisas foram e continuam sendo realizadas envolvendo os conhecimentos de inúmeros povos indígenas, todavia em muitos casos não há o devido retorno para a comunidade detentora da fonte do saber explorado/pesquisado. Neste relato, apresentamos a como em um contexto adverso esse contexto vem sendo experienciado. Os Guarani Nãndeva e os Guarani Kaiowá, em sua medicina tradicional, possuem um vasto conhecimento relacionado à saúde, e esse conhecimento tem sido registrado no Acervo Pohã Ñana, projeto de pesquisadores indígenas e não-indígenas que já possui 10 anos de pesquisa.
Descrição Trata-se de um relato de experiência do projeto ‘Acervo Pohã Ñana: dividido em três principais etapas: a) processo de estruturação das coletas para a construção do livro; b) curadoria do acervo do projeto; c) construção de um jardim na aldeia Guapo’y, no município de Amambai-MS.
Período de Realização O projeto iniciou-se em 2013, direcionado à sistematização de informações a respeito do adoecimento dessas populações indígenas por tuberculose, entretanto a partir do ano de 2018, as pesquisas se ampliaram para o vasto conhecimento sobre o uso de plantas medicinais na cosmologia Guarani Ñandeva e Guarani Kaiowá, narrados pelas Ñandesy e Ñanderu (mestres tradicionais). A pesquisa se estende até o presente momento, direcionada para o diálogo sobre uso de plantas medicinais por estes povos indígenas, e ampliando o escopo do processo de cuidado -saúde-doença da tuberculose para o contexto da Medicina Tradicional Guarani Kaiowá e a intermedicalidade.
Objetivos Relatar a experiência de pesquisa-ação com um grupo de pesquisadores indígenas e não indígenas, registrando o conhecimento e saberes em cuidados da saúde do povo Guarani Ñandeva e Guarani Kaiowá.
Resultados Na primeira etapa do projeto, lançou-se em 2019 o documentário “Mboraihu-O espírito que nos une", que aborda temas sobre a saúde, bem-viver, práticas tradicionais de cuidados e a luta pela retomada dos territórios tradicionais e preservação cultural. Em 2020, foi lançado o livro bilíngue (Guarani e Português) ‘Pohã Ñana: Plantas medicinais: fortalecimento, território e memória guarani e kaiowá’, o livro contém as práticas tradicionais de cura e as plantas medicinais mais prevalentes entre os Guarani Ñandeva e Guarani Kaiowá. Fruto das discussões o grupo construiu o e-book bilíngue ‘Acervo Pohã Ñana: pesquisa participativa sobre o conhecimento tradicional associado do povo Guarani e Kaiowá’, que partiu da necessidade de elencar as etapas necessárias para as pesquisas em terras indígenas, explicitando diversas questões importantes, a exemplo do que é o Consentimento Livre, Prévio e Informado (CLPI). O grupo de pesquisadores indígenas passou por um treinamento de curadoria para a organização e manutenção do banco de dados existente, pois um acervo valioso sobre os Guarani Ñandeva e Guarani Kaiowá foi adquirido durante esses 10 anos de pesquisa, garantindo a preservação da memória do povo. Na terceira etapa, que vem sendo dialogada em reuniões periódicas, prepare-se a construção do Jardim com plantas descritas no Acervo Pohã ñana, na aldeia Guapoy, Amambai-MS.
Aprendizados Os povos indígenas possuem sua sabedoria e conhecimentos próprios de cuidados e saúde que precisam ser respeitados e integrados no sistema de saúde. Esse projeto demonstra que é possível construir um diálogo intercultural na área da saúde, levando em conta as crenças culturais e práticas terapêuticas indígenas na operacionalização do SASISUS, enquanto processo decolonial.
Análise Crítica A inserção, participação e escuta dos pesquisadores possibilitou a aproximação com os mestres tradicionais e acesso à informação que foi registrada e ficou disponível para os próprios indígenas. O processo de escuta destes mestres trouxe também uma demonstração e valorização de conhecimentos de uma população discriminada e que muitas vezes não possui voz dentro da sociedade. Esses 10 anos de trabalho demonstram como os saberes em cuidados da saúde estão presentes nas comunidades indígenas e que é possível um diálogo entre as ciências acadêmicas e ciências indígenas. Para alguns indígenas, o sistema de cuidado em saúde para estes povos funcionará a partir do momento em que se ampliar a interlocução entre os mestres tradicionais e os profissionais indígenas com as equipes de saúde, pesquisas e Universidades.
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