Comunicação Oral

01/11/2023 - 13:10 - 14:40
CO33.2 - APS_ESF_ACS e comunidades tradicionais e contaminação ambiental

46786 - PRODUÇÃO DO CUIDADO E RELAÇÕES INTERPESSOAIS DE TRABALHO EM UMA USF: NOTAS ETNOGRÁFICAS A PARTIR DA COZINHA DA UNIDADE DE SAÚDE
CÍNTIA MARIA SOUZA DE SÁ - UEPA, CRISTINA PEREIRA DE SOUZA - USF MUCAJÁ, ALDER MOURÃO DE SOUSA - UEPA


Contextualização
O trabalho em saúde, coloca os membros da equipe multiprofissional da Estratégia Saúde da Família (ESF) diante de situações pessoais e familiares de saúde e de doença, assim como alegrias e dores vivenciadas por um grupo familiar ou comunidade.
O tempo prolongado na realização das atividades laborais, em alguns casos, tem produzido efeitos negativos evidenciados pelo desgaste emocional e na saúde mental de alguns profissionais, como os agentes comunitários de saúde (ACS).
O momento pandêmico produziu e, em alguns casos, acentuou questões pessoais e de saúde individual, além das coletivas, gerando reflexos no distanciamento entre profissionais e usuários e nos cuidados em saúde à população.


Descrição
A experiência que possibilita esse relato parte da realização das atividades do estágio curricular de atenção à saúde do curso de Saúde Coletiva de uma Universidade pública em uma Unidade de Saúde da Família (USF), em um bairro popular, em uma capital da região Norte do País.
A edificação em que se localiza a USF é uma casa adaptada para funcionar como serviço de saúde. Quartos se transformaram em consultórios, salas de estar em salas de espera ou de procedimentos. Mas a cozinha manteve sua função original, pelo menos em parte, pois hoje é um cômodo híbrido, que contém armários com conteúdo de trabalho dos ACS, outros com utensílios domésticos, e duas grandes mesas redondas, visualizadas como agentes não-humanos em que se realiza parte importante da produção de saúde neste espaço de trabalho.
Neste cômodo em que se toma café e almoça, também se realizam importantes atividades para a produção do cuidado realizado pelos profissionais. É em torno dessas mesas que conversas, negociações, reuniões são realizadas, assim como trabalho administrativo e planejamento de visitas domiciliares.

Período de Realização
Março a junho de 2023.

Objetivos
Relatar elementos da produção do cuidado, das relações interpessoais e da convivência entre de profissionais da ESF com discentes e docente, proporcionada por um estágio curricular de atenção à saúde.

Resultados
O referido componente curricular, baseado na interação ensino-serviço, promove o encontro de graduandos com profissionais da ESF e os usuários deste serviço de saúde. Oportunizando a construção deste relato a partir da construção coletiva de uma ACS, uma graduanda e um docente.
No período de cada subgrupo no campo de estágio realizou-se atividades cotidianas dos ACS, como visitas domiciliares, atividades que geraram discussão dos casos visitados com o grupo discente e com os membros da equipe de saúde quando oportuno. A discussão dos casos facilitou a construção do genograma e ecomapa da família, posteriormente registrados no prontuário. Realizou-se também atividades de educação permanente com a equipe de saúde a partir de temas indicados por ela. Além de ação educativa em sala de espera.

Aprendizados
Toma-se como aprendizado desta interação ensino-serviço que os espaços de produção de cuidado e de saúde vão além dos consultórios, em que consultas individuais são realizadas. A cozinha vista como espaço de convivência, se mostra além de um local onde são realizadas as refeições, torna-se um importante espaço de relações entre os alunos e os profissionais, em que a andragogia assume um sentido relacional entre aqueles que estudam e os que trabalham.
A reflexão sobre essa experiência também oportuniza a identificação deste espaço na USF como local de socialização e afeto, valioso para as relações de trabalho, também importante para a produção do cuidado integral, onde o alimento físico e o trabalho em papel e digital se cruzam, compartilhando o mesmo cômodo.

Análise Crítica
A vivência no cotidiano da USF para os discentes, e a convivência com diferentes subgrupos para os trabalhadores, perfazem e mantém a teia de relações ensino-serviço e possibilitam trocas mútuas de experiências, com construção coletiva do conhecimento e de afetos que regem os cuidados a respeito do corpo, do ambiente e do bem-viver.
As vivências compartilhadas, as formas de escuta e o diálogo coletivo entre os trabalhadores e os discentes, vêm como valorosa ferramenta de desenvolvimento do estudante inserido na realidade da unidade. À troca de experiências, observou-se a necessidade de um trabalho de resgate das relações interpessoais, por ora desgastas, trazendo um ambiente mais harmônico, a se refletir tanto nas interações entre os profissionais quanto com os usuários.
Neste estágio buscou-se valorizar o cuidado como ética, como dádiva e prática da solidariedade, com vistas a descolonizar ideias depreciativas sobre atenção primária à saúde, como inferior aos outros níveis de atenção e de que o cuidado produzido em conjunto no SUS tem menos qualidade.
Acredita-se que esta experiência tenha contribuído para a formação de futuros sanitaristas engajados politicamente com o fortalecimento do SUS e que tenha aprimorado a visão da equipe da ESF sobre as atividades realizadas por esse profissional, principalmente entre os que circulam ao redor das mesas da cozinha da USF.