Comunicação Oral Curta

02/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC12.1 - Epistemologias da Saúde desde o Sul: Virada decolonial e construção compartilhada de conhecimento

46748 - FORMAÇÃO EM PRÁTICAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES EM SAÚDE: UM REFERENCIAL TEÓRICO-CONCEITUAL PARA DECOLONIZAR AS PRÁTICAS DE SAÚDE NO SUS
LAURA IUMI NOBRE OTA - USP, YARA MARIA DE CARVALHO - USP


Apresentação/Introdução
A Residência Multiprofissional em Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (RMPICS) da Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo pretende uma formação em saúde a partir das bases filosóficas e conceituais das racionalidades médicas, de maneira a contribuir para a integralidade e humanização do cuidado. É uma residência que se auto caracteriza como contra-hegemônica e está em constante transformação.
Este trabalho é um recorte de uma pesquisa de mestrado que analisou o projeto formativo dessa Residência, com foco na contribuição da formação para atuação no SUS. Nesse sentido, apresentamos a concepção de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) que norteia a RMPICS, à medida que ela efetivamente tem possibilitado a ampliação de espaços e cenários para intervenção e emancipação na saúde pública brasileira.

Objetivos
Apresentar o conceito de PICS da Residência e os efeitos, ou as decorrências desse enfoque teórico-conceitual nas mudanças da formação e, especialmente, nas práticas de saúde no SUS.

Metodologia
A pesquisa de mestrado trabalhou com a sistematização de experiências de Oscar Jara Holliday. A pesquisadora acompanhou entre os meses de março e agosto de 2022 as reuniões dos “Cenários de Prática” da Residência que ocorreram mensalmente e eram constituídas por coordenadores, preceptores e representantes discentes. As reuniões foram transformadas em documentos e deixadas à disposição em um drive para qualquer contribuição do coletivo, tanto em relação aos conteúdos das reuniões como outras problematizações que pudessem surgir a partir desta exposição organizada. Os documentos foram analisados e ordenados a partir de temas. Um dos temas, objeto-recorte deste trabalho, é justamente a concepção de PICS na Residência. Toda a dinâmica foi desenvolvida coletivamente visando a reconstrução do processo vivido e a compreensão da lógica que subsidiou esse processo e as relações pedagógicas do projeto formativo. A análise do processo - ampliado e dinâmico - permitiu rever as nossas próprias práticas de saúde considerando a realidade e repensar as práticas pedagógicas, pontuando limites e potencialidades do pensar-fazer com foco na formação em saúde com vistas a transformar o cuidado e a formação no SUS.

Resultados e discussão
A sistematização de conhecimentos produzidos no cotidiano dos serviços exige da formação no SUS uma reconfiguração dos processos de pesquisa e produção de conhecimento, de maneira que a complexidade da pluralidade das vidas e territórios esteja presente no cuidado à saúde e consequentemente na investigação. As PICS, como outras cosmopercepções de mundo, incitam a repensar a produção de conhecimentos e verdades e transformar os processos de cuidado.
No projeto formativo da RMPICS, as PICS defendem o cuidado compartilhado, um cuidado que escuta os desejos e as vontades individuais e coletivas e integra a pessoa, sua família, as redes de cuidado e apoio, a comunidade, o território, de maneira a construir junto as formas de agir em saúde. Assim, o programa propõe em seu projeto pedagógico a reorganização dos processos de cuidado no SUS, na qual as PICS são os pilares para a formação em defesa de um SUS mais horizontal e coletivo.
As práticas que são legitimadas pela PNPIC são de um universo “branco” ou “amarelo branqueado” letrado, que já foram apropriadas pelas profissões da saúde. Entretanto, o projeto da RMPICS, mesmo trabalhando com essas práticas, compreende as PICS como formas alternativas de pensar-fazer o cuidado e, para não reproduzi-las com base na “bio-lógica”, procura resgatar a sua essência, de forma a nos mover com a natureza, para um cuidado coletivo e compartilhado. Desse modo, na Residência, as PICS procuram diálogo com as Epistemologias do Sul.
Como corpos no Sul, procuramos transcender a norma colonizadora e trazer para o debate da produção do conhecimento e da verdade de autoras da Améfrica Ladina e a amefricanidade, nos permitindo voltar para o vivido na América, de maneira a reconhecer influências culturais de diversos povos e legitimar os dispositivos criados nas tensões e lutas contra a dominação colonial e racial. Assim, para uma formação para o SUS e legitimação da linguagem de outras epistemologias, precisamos reavaliar as práticas de cuidado e formação, de maneira que as nossas ações reflitam aquilo que defendemos como política.

Conclusões/Considerações finais
Ao sistematizarmos as experiências pedagógicas da RMPICS, pudemos pensar a realidade na qual nos encontramos imersos. Isso nos possibilita contrapor a cultura de dominação, procurando perceber o nosso fazer em saúde e interrogar nossas formas de estar e agir relativos às PICS. Ao construirmos espaços nos quais podemos transformar de forma reflexiva, crítica e propositiva o trabalho em saúde, produzimos auto-interrogações e análises das nossas práticas. Dando visibilidade a processos, de maneira a não reproduzirmos formas de opressões no cuidado em saúde, nos posicionando ética, política e esteticamente em defesa de um SUS decolonial e emancipador.