46964 - DESIGUALDADES DE GÊNERO NA PANDEMIA: A ATUAÇÃO DE MULHERES NA LINHA DE FRENTE E EM CASA ANA PAULA ANA PAULA LOPES DE MELO - UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO / NÚCLEO DE SAÚDE COLETIVA DO CENTRO ACADÊMICO DE VITÓRIA (CAV-UFPE), THALIA VELHO BARRETO DE ARAÚJO - PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA – UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO (PPGSC-UFPE), CAMILA PEREIRA ABAGARO - PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA – UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO (PPGSC-UFPE), SANDRA VALONGUEIRO ALVES - PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA – UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO (PPGSC-UFPE)
Apresentação/Introdução Em cinco anos, o Brasil vivenciou duas grandes emergências sanitárias. Enquanto investigávamos os efeitos da epidemia de microcefalia/Síndrome da Zika Congênita (SCZ), fomos surpreendidos pela pandemia de Covid-19 que atingiu a população universalmente e, de forma demasiada a população brasileira. A gravidade da situação complexificou uma tríade de crises - política, econômica e sanitária - que já se desenhava sem precedentes, antes mesmo da chegada do novo coronavírus ao país. No contexto de emergência ocasionado por uma pandemia o processo de trabalho em saúde volta-se, quase que exclusivamente, para a doença, ficando de lado outras dimensões envoltas no ato de cuidar. Estudos estimaram que a pandemia mobilizou mais de 2 milhões de trabalhadores em saúde para dar conta dos atendimentos de Covid-19. Mulheres representaram quase 77% desse contingente.
Objetivos Trata-se da apresentação das reflexões apontadas em capítulo de livro escrito durante a pandemia de Covid-19 (no prelo) onde buscamos analisar, sob a perspectiva de gênero, as implicações da pandemia de Covid-19 para profissionais de saúde na linha de frente do cuidado.
Metodologia Foi realizada uma pesquisa documental livre e pesquisa bibliográfica narrativa realizada a partir da leitura de artigos científicos, livros, guias, manuais, e reportagens da mídia em geral, além de conteúdos de webinários sobre gênero e cuidado na pandemia de Covid-19.
Resultados e discussão Os resultados apontaram que a pandemia afetou de sobremaneira as mulheres. Assim como a SCZ e outras emergências sanitárias, a “Covid-19” trouxe impactos diferenciados para a vida das mulheres. Os efeitos da crise sanitária, associados às condições socioeconômicas, empurram as mulheres para formas arriscadas ou precarizadas de trabalho, aumentando sua exposição na dupla, às vezes tripla, jornada de trabalho, dada a responsabilidade de cuidar dos filhos, das pessoas doentes em casa e fora dela, além do já naturalizado trabalho doméstico.
Entre profissionais de saúde atuando da linha de frente, as mulheres foram aquelas que apresentaram o maior risco de infecção, sendo as auxiliares de enfermagem aquelas com risco ainda mais elevado. Dentre casos graves e óbitos, profissionais de saúde mulheres representavam cerca de 60%. Este cenário pode ser considerado a partir da interseção de outras categorias de análise agregadas à categoria gênero, tais como raça e classe. Estudos consultados ilustram bem essas configurações ao apontar que mulheres negras eram maioria entre o contingente de agentes comunitários de saúde e homens negros eram minorias entre profissionais de enfermagem e medicina.
Embora estivessem atuando na linha de frente, durante a pandemia profissionais de saúde dedicaram parte do seu tempo às atividades domésticas, sendo a maioria das mulheres as responsáveis por esse tipo de trabalho em suas casas e uma diferença de mais de 40 horas entre o tempo gasto pelas mulheres com essas atividades em relação ao tempo gasto pelos homens.
A pandemia trouxe riscos adicionais a gestantes trabalhadoras, considerando, inclusive, o atraso na liberação de vacinas para este grupo populacional. Esses riscos não se restringiam apenas aos ambientes de trabalho, como é o caso das profissionais de saúde, mas também aos deslocamentos necessários casa-trabalho (ônibus e metrôs lotados, por exemplo, impactando aquelas trabalhadoras com piores condições salariais). Ao se tratar de profissionais de saúde, há uma invisibilidade de outras categorias profissionais que também estão envolvidos na linha de assistência e cuidado, tais como equipe de limpeza, condutores de ambulância e maqueiros, pessoal da manutenção, de cozinha, dentre outros. Trazer à tona toda essa reflexão com foco nas profissionais de saúde mulheres não significa negligenciar a abordagem relacionada aos profissionais de saúde homens ou apresentar simplesmente diferenças entre ambos. Partir de uma perspectiva de gênero significa que as diferenças entre homens e mulheres, na sociedade e no contexto da assistência em saúde na pandemia, são decorrentes de desigualdades sociais, políticas, históricas, culturais e econômicas que colocam homens e mulheres em patamares diferenciados.
Conclusões/Considerações finais Analisar a situação das mulheres trabalhadoras da saúde na linha de frente durante a pandemia de Covid-19 demonstra a interseccionalidade das categorias sexo/gênero, raça e classe. Tal processo atravessou a existência delas, entre as esferas reprodutiva e produtiva. Urge, portanto, refletir sobre as desigualdades de gênero, como elas afetam mulheres e homens, nas suas variadas intersecções com outras categorias de opressão, seja na pandemia, seja no cotidiano. Isso pode permitir aos profissionais de saúde se situarem nessas estruturas e melhorar seu processo de trabalho, seu olhar e sua escuta, mas também contribuir com uma sociedade mais justa e menos desigual para todos.
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