Comunicação Oral Curta

02/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC15.1 - Direito humano fundamental à saúde: identidade, dignidade e acesso ao sistema de saúde pela população LGBTQIAPN+

46406 - IMPORTÂNCIA DOS RELACIONAMENTOS FAMILIARES E INTERPESSOAIS NA EXPRESSÃO DA SEXUALIDADE DE JOVENS LÉSBICAS, GAYS E BISSEXUAIS
FLÁVIO MURILO REGINATO - UNESP, ELEN ROSE LODEIRO CASTANHEIRA - UNESP


Apresentação/Introdução
Minorias sexuais e de gênero sofrem processos de exclusão social, violência, discriminação e preconceito em função de sua orientação sexual e/ou de gênero, o que influencia diretamente em suas condições de saúde. Este trabalho trata das repercussões das relações familiares e interpessoais no processo de descoberta da sexualidade e de sua expressão social entre jovens lésbicas, gays e bissexuais. O estudo de questões emergentes no processo de descoberta da sexualidade e busca por aceitação social permite o reconhecimento de vulnerabilidades para uma adequada atenção à saúde.

Objetivos
Analisar a importância das relações familiares e interpessoais na expressão da sexualidade de jovens gays, lésbicas e bissexuais.

Metodologia
Estudo qualitativo realizado por meio de entrevistas semiestruturadas com jovens auto identificados como lésbicas, gays ou bissexuais, com idade entre 18 e 24 anos, de cidade do interior paulista. O roteiro de entrevistas propõe um diálogo sobre sexualidade e o desenvolvimento do processo de autoidentificação e suas interfaces com as relações interpessoais e com a família nuclear. O contato inicial com os entrevistados foi feito com usuários do Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) da cidade, ampliando-se o número de participantes por meio da técnica de “bola de neve”.
As entrevistas foram gravadas e utilizou-se o diário de campo para registrar as impressões do entrevistador. Foi realizada análise de conteúdo. O material apresentado integra estudo mais amplo sobre a saúde de jovens gays, lésbicas e bissexuais.

Resultados e discussão
Foram realizadas 6 entrevistas, 4 com homens gays e 2 com mulheres lésbicas, identificados pela letra E seguida de um número, sendo gays de 1 a 4, e lésbicas 5 e 6. Em muitos momentos, a família não constitui a principal rede de apoio para tratar de assuntos pessoais relevantes nessa fase da vida, e os jovens tendem a recorrer a amigos ou parceiros amorosos para suprir essa falta Os relacionamentos familiares podem se constituir tanto em reforços positivos quanto em reforços negativos para expressão da sexualidade e autoaceitação, com impacto na saúde desses jovens .
A existência de apoio familiar é um ponto de diferenciação significativo entre as experiências vividas pelos entrevistados, fortalece e potencializa a construção da subjetividade e formas de ser no mundo de pessoas gays, lésbicas e bissexuais, como pode ser observado no seguinte excerto:
“Ela [irmã], de modo geral, sempre me apoiou, inclusive quando eu usava o cabelo grande né, ela falava ‘corta o cabelo, não fica com cabelo preso’, (...) ‘Ah quer jogar bola, vamos, eu te levo para jogar bola’, então sempre quando tinha algum alguma coisa assim que eu precisava (...) ela era a pessoa chave” (E 5).

Neste caso, o apoio da irmã permitiu que a entrevistada sentisse liberdade para se expressar socialmente da maneira como desejava. A aceitação possibilitou a superação de medos, angústias e conflitos internos que estavam presentes no processo de definição de sua orientação sexual.
Ao contrário, o reforço negativo ao desejo por mudança na expressão social dificulta a efetivação desse processo, reforçando medos e angústias e criando espaço para conflitos familiares.
"Eu comecei a comprar mais roupas nas seções masculina de loja, porque eu me sinto confortável, eu gosto de roupas que me deixam confortável e aí isso foi um primeiro baque para minha mãe, ela ficava tipo ‘ah você vai ver a menino assim’". (E 6)

Em outra entrevista, vemos também um reforço negativo e violento relativo à descoberta da sexualidade de um jovem gay. A reação da irmã intensificou medos e angústias que ele possuía.
"Eu já discuti muitas vezes com a minha irmã nesse período e ela falar que eu vou para o inferno, que eu tô errado e que eu consigo sair disso" (...) "Eu não vou mentir que eu tenho medo, sabe, por acreditar na Bíblia...". (E 3)

Por outro lado, a falta de apoio da família nuclear estimula a busca de construção de outras redes, como na seguinte fala: "Nunca senti muito suporte da minha família, então ele foi a minha primeira família" (E 2).


Conclusões/Considerações finais
Os resultados evidenciam a importância de redes de apoio que reforcem positivamente a construção das formas de existir no mundo desses jovens. A família nuclear tende a ser vista pelos serviços de saúde como espaço de apoio mas pode ser justamente ponto de conflito e de exacerbação de violências vivenciadas. Os jovens tendem a construir redes extrafamiliares, que para além das relações interpessoais aí constituídas, deveriam contar com os serviços de saúde como um ponto adicional de orientação e amparo para o cuidado em saúde. As especificidades dos contextos de vulnerabilidade individual e social destes jovens nos momentos de transição e definição de suas orientações sexuais precisa ser reconhecido pelos serviços de saúde para que possam responder adequadamente às suas necessidades.