Comunicação Oral Curta

02/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC15.2 - Direito humano fundamental à saúde: gênero, violência, dignidade

47806 - VIOLÊNCIA AUTOPROVOCADA EM ADOLESCENTES NO RECIFE-PE (2012-2022)
REBECA VALENTIM LEITE - SECRETARIA DE SAÚDE DO RECIFE, LENIZANE VANDERLEI CAVALCANTE DA SILVA - SECRETARIA DE SAÚDE DO RECIFE, ATHAIANA MARIA DE OLIVEIRA - SECRETARIA DE SAÚDE DO RECIFE, ANDRÉA MARIA FERREIRA BARBOSA - SECRETARIA DE SAÚDE DO RECIFE, ALESSANDRA DE LIMA ARAÚJO - SECRETARIA DE SAÚDE DO RECIFE, ANDREA TORRES FERREIRA - SECRETARIA DE SAÚDE DO RECIFE, CLAUDIA CRISTINA LIMA DE CASTRO - SECRETARIA DE SAÚDE DO RECIFE


Apresentação/Introdução
A adolescência é uma etapa do desenvolvimento humano de intensas transformações físicas e psicológicas que podem culminar em comportamentos de risco, como a exposição a acidentes e violências. Dentre as violências, a que tem uma grande repercussão não só à vítima, mas também aos familiares, é a autoprovocada, que atinge indivíduos de todas as regiões do mundo e de diferentes condições sociais, raças e credos. Esta violência, apesar de não ter casos divulgados nos meios de comunicação, segundo a orientação da OMS, tem avançado no Brasil nesta faixa etária. A cidade do Recife foi classificada em 2020 como a capital mais desigual, segundo o índice GINI, sendo um dos fatores que implicam na qualidade de vida e potencializam as vulnerabilidades. Em meio a este contexto de fragilidades sociais e inerentes à própria faixa etária, além de considerar a extensão e gravidade dessa violência, faz-se necessário conhecer esta população para planejamento de ações preventivas com efetividade.

Objetivos
Identificar o perfil e magnitude das violências autoprovocadas na população de adolescentes do Recife-PE, notificadas no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) no período de 2012 a 2022.

Metodologia
Trata-se de um estudo descritivo e transversal que analisou os registros de violência autoprovocada em adolescentes de 10 a 19 anos, notificados por profissionais de diversos estabelecimentos de saúde do município de Recife/PE no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN). Os dados coletados referem-se aos anos de 2012 a 2022, com o intuito de conhecer a dimensão da problemática ao longo desses anos. Os dados foram tabulados pelo programa Tabwin, tendo como variáveis: ano de notificação, sexo, raça/cor, gestação, orientação sexual, deficiência/transtorno e meio de agressão.

Resultados e discussão
No período analisado foram registradas 12.328 notificações de violência interpessoal/autoprovocada na população de adolescentes recifenses de 10 a 19 anos. Destes, 1.665 (13%) correspondem a violência autoprovocada. Em uma análise temporal do período estudado, verificou-se que desde 2018 o número de notificações para esse tipo de violência vem aumentando significativamente. No ano de 2022 houve quase quatro vezes mais registros dos casos em relação ao ano de 2017, passando de 6,2% para 22%. Esse dado aponta para a necessidade urgente de estratégias de intervenção nos mais variados contextos em que esses adolescentes estão inseridos, desde a escola à família e comunidade. Quanto à raça/cor, a maioria, 67%, é composta por pretos e pardos, fato este em concordância com as características existentes na população nordestina. Mesmo considerando a violência como um fenômeno complexo que atinge todas as identidades étnico-raciais, a população negra é mais vulnerável às situações de violência, seja interpessoal ou autoprovocada, pelas desigualdades sociais que ainda perduram no Brasil. Com relação ao sexo, as meninas (76,6%) são as que mais se autoinfligem, sendo verificado que 50 destas (3%) estavam gestantes. Quanto à orientação sexual, 70 (4,2%) se auto intitulam como homossexuais ou bissexuais. É necessário salientar que essa informação na ficha de notificação de violência passou a existir a partir de 2015 e é uma variável com fragilidade no preenchimento por possuir um grande número de ignorados. Desta forma, este dado pode não refletir a realidade. No que concerne a outras vulnerabilidades, observou-se que 20,5% desses adolescentes possuíam alguma deficiência/transtorno, sendo o transtorno mental e de comportamento os mais prevalentes, com 14,5%. A presença de comorbidade mental é um expressivo fator de risco para o comportamento suicida, especialmente os transtornos de humor. É oportuno destacar que, quanto ao meio de agressão utilizado, o envenenamento/intoxicação correspondeu a 59,4% dos casos e em sua maioria são por medicamentos antidepressivos, ansiolíticos e antipsicóticos. Já o uso de perfurocortantes teve um alcance de 17,6%, pelos quais os adolescentes realizam a automutilação. A maioria dessas violências autoprovocadas ocorrem dentro de casa (72,6%), o que é relevante para se discutir a vigilância doméstica e escolar, em que os pais e/ou responsáveis e educadores precisam estar cada vez mais atentos à mudança de comportamento dos adolescentes.

Conclusões/Considerações finais
Os números do SINAN apontam que a violência autoprovocada tem aumentado entre adolescentes do Recife ao longo dos últimos 10 anos, sendo um desafio para o setor saúde. O perfil identificado mostra adolescentes do sexo feminino, negras, cuja orientação sexual é ignorada e que empregam como meio de agressão o envenenamento/intoxicação por medicamentos de uso restrito como as mais vulneráveis à violência autoprovocada. Por envolver uma população com peculiaridades inerentes à faixa etária, é necessária uma maior articulação intersetorial entre saúde, educação e assistência social, para planejar ações de prevenção e promoção à saúde, sobretudo mental, a fim de lidar com a problemática.