Comunicação Oral Curta

02/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC15.3 - Promoção, educação e comunicação em/na saúde

47440 - UMA PORTA DE ENTRADA À ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE PELA POPULAÇÃO LGBTQIAPNB+ NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO: RELATO DE EXPERIÊNCIA DO PROJETO ARCO-ÍRIS - ILHA DO GOVERNADOR
NATASHA DE ASTROGILDO STEFANI - PRMFC-SMS-RJ, PEDRO ANTONIO GOMES COSTA - UFRJ


Contextualização
A Atenção Primária à Saúde (APS) é a base do Sistema Único de Saúde (SUS), sendo a porta de entrada da população aos seus direitos constitucionais de saúde. A população do Brasil sofre grande desigualdade social, racial e de gênero. Por isso, a equidade é um dos propósitos do SUS de inquestionável importância. Logo, a APS tem a responsabilidade pelo acesso e acolhimento de qualidade aos vulnerabilizados. A população LGBTQIAPNB+, mesmo após a publicação da Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais em 2011, ainda apresenta dificuldades no acesso ao SUS, principalmente devido à LGBTfobia que sofrem no momento de entrada no sistema.

Descrição
Isso tudo foi a motivação para que o Projeto Arco-Íris fosse implementado em uma Clínica da Família (CF) da Ilha do Governador, no Rio de Janeiro (RJ). Embora médicos de família, por suas motivações pessoais e profissionais, se especializem em atendimento à população LGBTQIAPNB+, os demais trabalhadores da unidade de saúde também demandam capacitação para que o acolhimento seja respeitoso e justo. Desde a recepção dos seguranças e dos agentes comunitários de saúde (ACS), cadastramento dos usuários com nome social, coleta de exames, até a própria consulta médica, o respeito à identidade de gênero e ao pronome de preferência da pessoa são vitais para o atendimento qualificado.

Período de Realização
O Projeto se iniciou em 2022, sendo colocado em prática por três residentes de medicina de família e comunidade (MFC) e, até hoje, segue acontecendo às sextas-feiras pela manhã, sendo aberto à toda população do RJ, e não somente para o território de atuação da unidade. Isso porque poucas CFs no município tinham um acolhimento especial voltado a esse grupo, baseado em relatos prévios de usuários e suas tentativas frustradas em conseguir uma consulta com as suas especificidades, uma vez que muitas de suas demandas, como hormonização e cuidados em saúde sexual e mental, ainda eram vistas enquanto tabus por uma grande parte dos profissionais da saúde, mesmo os que atuam na APS.

Objetivos
Em março de 2023, após conclusão de curso de três residentes de MFC que implementaram o projeto na nossa CF, dois outros profissionais se responsabilizaram pelo Projeto, visando manter seu funcionamento e sua expansão. Com isso, todos os residentes de segundo ano de MFC acompanhariam consultas do Projeto durante um mês, como uma atividade de oficina teórico-prática, capacitando-os para atendimentos futuros nas unidades que viessem a trabalhar, respeitando também as demandas das suas equipes de origem. Além disso, se iniciou uma maior divulgação através de mídias sociais, visando ampliar o acesso e causar impacto, uma vez que o Projeto poderá servir de exemplo para outras unidades da APS.

Resultados
Em um turno semanal, são realizados quatro atendimentos agendados que duram cerca de uma hora, sendo possível absorver demandas espontâneas ou agendar uma consulta presencialmente. As consultas objetivam, sempre, o cuidado integral; o Projeto representa a porta de entrada da população LGBTQIAPNB+ ao SUS, mas nunca resume esse grupo a demandas específicas, o que reforçaria a hiper-estigmatização. Em caso de busca pelo Projeto nas mídias sociais, foi disponibilizado um formulário online de pré-cadastro, sendo possível que os ACS façam o cadastramento previamente e o agendamento seja realizado online. Além disso, disponibilizamos um canal via Whatsapp, pelo qual se pode agendar ou cancelar consultas e obter outras informações sobre o acompanhamento de saúde do usuário. Também iniciamos um trabalho de vigilância organizado em planilha, onde acompanhamos mais de 40 pessoas que já passaram por consulta no Projeto. Dessa forma, buscamos prestar um serviço individualizado e integral utilizando tecnologias disponíveis e úteis para o cuidado longitudinal e compartilhado.

Aprendizados
Mais recentemente, dois outros frutos desse trabalho surgiram; o primeiro deles, um novo cartão do usuário, contendo informações úteis para o acompanhamento em saúde, incluindo nome social, identidade de gênero, condutas em hormonização quando ocorrem, exames laboratoriais, teste rápidos, vacinações e encaminhamentos, além de informações sobre o Projeto, agendamento de consultas futuras e contatos úteis. Por último, entendendo a importância da Abordagem Comunitária, o outro resultado desse trabalho foi o Grupo Ocupação que, a partir de reuniões quinzenais, promove convivência, trocas e discussões para além da saúde entre os usuários do Projeto e sensação de pertencimento ao sistema de saúde, que sempre foi, e seguirá sendo, a partir de projetos como esse, de todes.

Análise Crítica
Após quase 1 ano de funcionamento, o Projeto Arco-íris continua em crescimento, com perspectiva de expansão através de capacitações que ocorrerão para outras unidades da APS carioca. Sem pretensão de fechar as portas, muito pelo contrário, permaneceremos ocupando espaços e oferecendo acesso à saúde de qualidade e com respeito à população LGBTQIAPNB+ no município do Rio de Janeiro.