02/11/2023 - 08:30 - 10:00 COC16.2 - Desafios na atenção à gestação, ao parto e ao puerpério |
46272 - ENFRENTAMENTO À GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA NO BRASIL: ADIAMENTO DA VIDA SEXUAL COMO POLÍTICA PÚBLICA SABRINA PEREIRA PAIVA - UFJF, DANIELLE TELES DA CRUZ - UFJF
Apresentação/Introdução O início do século XXI é marcado pelo acirramento das disputas entre posições ideopolíticas orientadas pela defesa dos direitos humanos, entre eles, os direitos sexuais e reprodutivos, e as posições neoconservadoras, defensoras do discurso religioso e da teocratização do Estado. As forças conservadoras obtiveram maior destaque com a gestão governamental de Jair Bolsonaro (2019-2022). A retórica governamental, partindo de um pânico moral em relação à sexualidade juvenil, aliou a perspectiva antigênero às iniciativas "pró-vida" e de “adiamento” da vida sexual, elegendo a família cisheteronormativa como responsável pela esfera da sexualidade e do gênero, causando desconstrução das políticas públicas na área.
Objetivos O estudo investiga as políticas sexuais voltadas para juventude no Brasil, desenvolvidas durante o Governo Bolsonaro e coteja com dados nacionais sobre as gestações na adolescência.
Metodologia Parte-se aqui do material bibliográfico e documental sobre as políticas sexuais voltadas para a sexualidade juvenil no Brasil, com destaque para a gestão governamental de J. Bolsonaro. Os documentos foram analisados à luz das premissas da análise de discurso.
Resultados e discussão Documento recente sobre o estado da população mundial, que abarcou 96% da população adolescente mundial, concluiu que um terço das mulheres jovens dos países periféricos gestou na adolescência, sendo que metade destas possuía até 17 anos. O Brasil tem uma das maiores taxas de gravidez na adolescência da América Latina, mesmo que tenha decrescido nos últimos anos. A redução destas taxas depende de investimento no desenvolvimento social e econômico, de políticas de equidade de gênero, acesso ao aborto seguro e oferta de educação sexual integral (UNFPA, 2022 ). Diante de tal realidade, o governo federal defendeu a ideia de adiamento da vida sexual. Em 2022, lançou um conjunto de políticas sexuais voltadas para a juventude, entre elas, consideramos aqui as que se relacionam especificamente à gravidez na adolescência. Tais documentos abordam a temática a partir dos supostos prejuízos causados ao desenvolvimento “integral” dos/as jovens, provocados pelo que é compreendido como “início prematuro da vida sexual”, que desencadearia danos como: aumento dos riscos de IST e de gravidez não planejada, além de “patologias psicológicas, emocionais e sociais” (BRASIL, 2022a , p.4; BRASIL, 2022b ). A proposta do ‘Plano Nacional de prevenção primária do risco sexual precoce e gravidez na adolescência’ é o enfrentamento tanto do que é compreendido como “sexualização precoce” quanto da “gravidez na adolescência”. Os discursos biomédicos e dos direitos humanos são acionados simultaneamente, fundamentando o ‘pânico moral’ em relação à sexualidade juvenil. O “Guia de Autocuidado: recomendações para prevenção do risco sexual precoce e da gravidez na Adolescência” apresenta abstratamente a noção de autocuidado, sem conexão com as desigualdades e diferentes realidades enfrentadas pelos jovens em seus cotidianos, como algo como “inerente ao ser humano”, dizendo respeito à “integralidade do ser” (BRASIL, 2022b, p. 7). Adota a noção essencialista e binária dos sexos feminino e masculino, invisibilizando as diferentes desigualdades e diferenças existentes entre os jovens na cena contemporânea.
Conclusões/Considerações finais Faz-se mister considerarmos as particularidades da nossa formação social, incluindo o conjunto de determinações que fortalecem a cultura patriarcal, conservadora, racista e familista (re)produzida no interior do Estado e da sociedade civil. A política pública não possui o papel referido à economia dos prazeres sexuais, mas deve priorizar a educação em sexualidade, supondo o diálogo aberto sobre sexo com adolescentes, a existência de recursos e insumos para prevenção de gestação e de IST, informações qualificadas ofertadas por profissionais de saúde e educação, respeitando a heterogeneidade sociocultural, de gênero, sexual, econômica e política desse grupo populacional. Neste momento, de recomposição de forças no interior do Estado e da sociedade, torna-se fundamental retomar esse debate e recompor as políticas sexuais, em especial aquelas voltadas para a juventude.
Referências:
UNFPA- Fundo de População das Nações Unidas. Estado de la población mundial 2022. Visibilizar lo invisible: la necessidad de actuar para poner fin a la crisis desatendidas de los embarazos no intencionales. 2022, 160 p. Disponível em: https://argentina.unfpa.org/es/publications/visibilizar-lo-invisible-la-necesidad-de-actuar-para-poner-fin-la-crisis-desatendida--2. Acesso em: 06 de abril de 2022.
BRASIL. Plano Nacional de Prevenção Primária do risco sexual precoce e gravidez na adolescência. 2022a, 50 p. Disponível em: https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/prevencao-a-gravidez-precoce/protege-brasil-plano-nacional-de-prevencao-primaria-do-risco-sexual-precoce-e-gravidez-na-adolescencia.pdf.
BRASIL. Guia de autocuidado: recomendações para prevenção do risco sexual precoce e gravidez na adolescência. 2022b, 26 p.
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