Comunicação Oral Curta

02/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC16.3 - Atenção à Saúde Sexual e Reprodutiva: desigualdades e estigma

47504 - EXPERIÊNCIAS E PERCEPÇÕES DE TRABALHADORAS SEXUAIS CISGÊNERO SOBRE MÉTODOS BIOMÉDICOS DE PREVENÇÃO AO HIV: UMA PERSPECTIVA INTERSECCIONAL
ISA DA SILVA SORRENTINO - PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA, FACULDADE DE MEDICINA DA USP, LAURA REBECCA MURRAY - NÚCLEO DE ESTUDOS DE POLÍTICAS PÚBLICAS EM DIREITOS HUMANOS / UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO, ALEXANDRE DOMINGUES GRANGEIRO - FACULDADE DE MEDICINA DA USP, MÁRCIA THEREZA COUTO - PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA, FACULDADE DE MEDICINA DA USP, DULCE AURÉLIA DE SOUZA FERRAZ - ESCOLA FIOCRUZ DE GOVERNO, FIOCRUZ BRASÍLIA, FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ, ELIANA MIURA ZUCCHI - PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA, UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SANTOS


Apresentação/Introdução
Desde o final do século XX a epidemia de HIV/aids tem sido um dos grandes desafios no campo da saúde, como uma das principais causas de morte por doenças infecciosas no mundo. Mas a prevalência e o risco de agravos são notadamente mais críticos para travestis e mulheres transexuais, jovens homens que fazem sexo com homens, usuários de drogas injetáveis e trabalhadoras sexuais.
Nos anos 2010, as profilaxias pré-exposição (PrEP) e pós-exposição (PEP) e o autoteste de HIV surgiram como apostas para mudar esse cenário. Entretanto, como já alertavam diversas pesquisas e movimentos sociais, o relatório sobre HIV/Aids lançado pelo Programa Conjunto das Nações Unidas em 2022 confirmou a insuficiência dos métodos biomédicos para conter as novas infecções, se não houver a devida atenção às barreiras sociais interpostas às práticas cotidianas de prevenção.
No caso específico das trabalhadoras sexuais, fatores como o estigma, a violência de clientes e de agentes do Estado, as relações de gênero, os contextos legais e contextos de trabalho são comprovadamente relacionados ao curso da epidemia, mas poucos estudos abordam o impacto desses fatores sobre a efetividade dos novos métodos biomédicos, especialmente sob uma perspectiva interseccional.


Objetivos
Com o objetivo de contribuir para compreender como as relações sociais circunscrevem o uso da PEP, da PrEP e do autoteste HIV entre trabalhadoras sexuais cisgênero, propõe-se analisar como os lugares sociais ocupados por essas mulheres mediam as experiências e percepções sobre esses métodos, considerando-se que as estratégias individuais de prevenção assumem diferentes significados de acordo com os contextos legais, políticos, sociais e culturais em que são utilizadas, assim como são mediadas por marcadores sociais da diferença como gênero, raça/etnia, classe e geração, entre outros.

Metodologia
O estudo baseia-se no componente qualitativo de um ensaio clínico pragmático realizado para implementar esses insumos em serviços de saúde brasileiros de 2015 a 2019 (Estudo Combina!). Realizaram-se 34 entrevistas em profundidade com trabalhadoras sexuais cisgênero maiores de 18 anos, usuárias de um Centro de Testagem e Aconselhamento e DST/Aids e de um serviço público de saúde especializado na prevenção, diagnóstico e tratamento do HIV, ambos no município de São Paulo.
Entre as participantes, 22 estavam em seguimento clínico de uso da PEP ou da PrEP e foram convidadas a relatar suas experiências no uso das profilaxias. As usuárias de PEP foram entrevistadas entre março e dezembro de 2015, e as usuárias de PrEP, entre agosto de 2018 e junho de 2019. As demais (12) participaram de uma pesquisa formativa sobre a viabilidade e aceitabilidade do autoteste HIV – que naquele momento ainda não estava disponível no SUS – entre outubro de 2018 e fevereiro de 2019, na ocasião em que procuraram o serviço para outras demandas, ou em seus próprios locais de trabalho, quando a entrevistadora acompanhou agentes de prevenção nas visitas regulares a esses territórios.
As entrevistas foram gravadas em áudio com autorização das entrevistadas por meio do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, foram transcritas ipsis literis, e posteriormente codificadas no software MAXQDA. Para a análise temática interseccional, cujo propósito epistemológico consiste em evidenciar as relações de poder subjacentes aos relatos, estão sendo aplicadas as seguintes etapas: 1. elencar os temas de análise a partir das narrativas 2. caracterizar os marcadores de diferenciação social nos relatos individuais 3. analisar como os marcadores se articulam no interior de cada tema e dialogam com hipóteses amparadas na literatura 4. identificar como a interação entre os marcadores potencializa ou ameniza as experiências de vantagens e desvantagens para cada tema 5. elaborar a síntese final a partir do cotejamento dos principais achados com a literatura sobre o objeto de investigação.


Resultados e discussão
Nos resultados preliminares – primeira e segunda etapas da análise temática interseccional – as categorias temáticas relacionadas à efetividade das profilaxias pré e pós-exposição sexual ao HIV e do autoteste de HIV nos contextos sociais em que as entrevistadas estão inseridas foram: a) rotina e contextos de trabalho b) medo do HIV e percepções de exposição à infecção c) estigmas relacionados ao trabalho sexual, ao HIV e ao uso dos métodos biomédicos de prevenção c) sensação de autocuidado, segurança e responsabilidade d) confiança nos métodos e) mudanças de comportamento sexual pelo uso dos métodos. As relações de gênero, raça, classe e geração se articulam de diferentes formas em todos os temas, com maior ou menor poder explicativo para compreender as experiências e percepções individuais das entrevistadas.

Conclusões/Considerações finais
As experiências e percepções sobre a PrEP, a PEP e o autoteste HIV são permeadas pelas respostas ao estigma e às negociações de uso do preservativo, entre outros aspectos das relações sociais que circunscrevem a prostituição em níveis micro e macro.