Comunicação Oral Curta

02/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC20.1 - Políticas da reprodução e governança reprodutiva

46906 - EMERGÊNCIAS SANITÁRIAS E MULHERES NEGRAS: A JUSTIÇA REPRODUTIVA E A SOLIDARIEDADE NAS INICIATIVAS DA SOCIEDADE CIVIL
SAMANTHA VITENA BARBOSA - ENSP/ FIOCRUZ


Apresentação/Introdução
A interseccionalidade de opressões enfrentada por mulheres negras é ponto de destaque para a teoria da justiça reprodutiva, que explica que, para além de especificidades do direito reprodutivo, como o direito essencial ao aborto seguro, é igualmente importante que haja garantias de emprego, saneamento básico, educação, entre outros direitos que não são independentes da questão reprodutiva.
A presente pesquisa vem sendo produzida por uma discente de mestrado do Programa de Pós-graduação em Bioética, Ética Aplicada e Saúde Coletiva – PPGBIOS, programa interinstitucional e interdisciplinar, sendo principalmente vinculada à Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca. Além de estudante de pós-graduação, a pesquisadora também atua no âmbito da diversidade, equidade e inclusão em uma aliança de organizações da sociedade civil voltada para o avanço da saúde, direitos e justiça reprodutiva.

Objetivos
O objetivo deste estudo é conhecer respostas da sociedade civil para a garantia da justiça reprodutiva durante a covid-19 no Brasil, entendendo em que medida o valor bioético da solidariedade pode ser encontrado na proposta da iniciativa.

Metodologia
Desenvolveu-se pesquisa bibliográfica de cunho qualitativo e caráter exploratório. Foi utilizada a estratégia de análise indutiva, encontrando, durante a pesquisa, padrões, categorias e variáveis. Na primeira etapa da pesquisa, o foco foi no aprofundamento do conceito de interseccionalidade, principalmente pela perspectiva de Patrícia Hill Collins (2016), Kimberlé Crenshaw (1989, 2002) e Carla Akotirene (2021), e do conceito de solidariedade, principalmente pela perspectiva de bell hooks (2019) com vistas a contribuir para a análise do contexto em que se encontram as mulheres-foco da pesquisa.
A segunda etapa da pesquisa foi de análise de documentos que trazem recomendações voltadas à saúde reprodutiva de mulheres e outros direitos relacionados à justiça reprodutiva, principalmente o Dossiê Mulheres Negras e Justiça Reprodutiva, criado pela ONG Criola, e o Guia de Defesa Popular da Justiça Reprodutiva, do Coletivo Margarida Alves, com vistas a criação de categorias analíticas importantes para a análise das expressões de justiça reprodutiva.
A terceira etapa foi de escolha das expressões de justiça reprodutiva a serem analisadas, entendendo que o foco da pesquisa não era escolher o maior número de iniciativas possível, mas sim encontrar exemplos-chave para análise posterior.
Na quarta etapa foram analisadas as respostas selecionadas a partir de documentos textuais e audiovisuais disponibilizados pelas organizadoras das iniciativas e/ou presentes na mídia. O intuito da análise foi entender em que medida as expressões de justiça reprodutiva recuperam valores morais específicos. O foco principal foi entender se nelas é possível encontrar o valor da solidariedade, como proposta por bell hooks (2019).

Resultados e discussão
As iniciativas se mostraram abrangentes, abarcando o conceito de justiça reprodutiva da Conferência de Cairo (1994), que corresponde ao “bem-estar [...] completo de mulheres e meninas, baseado na completa conquista e proteção dos direitos humanos das mulheres”. As mulheres não são vistas como “coitadas”, se unindo pelo sofrimento, tampouco apenas pelas suas semelhanças. A vulnerabilidade não é vista como binária - ou tem ou não tem -, mas em camadas, entendendo em que contextos se apresenta e se ressalta.
A solidariedade não partiu de uma “opressão comum” apenas - e do amor incondicional às outras mulheres por passarem por opressão comum-, mas no entendimento de que as diferenças existem mesmo dentro de grupos de pessoas muito parecidas e que as diferenças devem ser apreciadas e não temidas, entendendo que para que a solidariedade aconteça, é preciso combater não somente as opressões que nos afetam individualmente.

Conclusões/Considerações finais
Como disseram Diniz e Guilhem, o papel da bioética não é ditar como a humanidade deve ser mas recuperar estratégias para a reparação social. Particularmente às mulheres negras, é fundamental o processo que bell hooks chama de “descrer” nas definições que foram impostas para si, resistindo não só à exploração individual, mas também a exploração de todas, para a transformação da sociedade.