02/11/2023 - 08:30 - 10:00 COC21.1 - Políticas públicas, territórios e experiências em saúde indígena |
46504 - REFLEXÕES SOBRE SAÚDE E NUTRIÇÃO DO POVO XOKÓ A PARTIR DO DIÁLOGO ENTRE LÍDERES DA COMUNIDADE, ESTUDANTES E DOCENTES DA NUTRIÇÃO EM VISITA AO TERRITÓRIO ANCESTRAL JÚLIA BORGES GIUDICE MONTEIRO - UFS, LUCIMARA CORREIA DOS SANTOS - UFS, IARA SANTANA TARGINO - UFS, SILVIA MARIA VOCI - UFS, ANDHRESSA ARAÚJO FAGUNDES - UFS, ANA VERÔNICA VIEIRA DE AZEVEDO - UFS
Contextualização A formação dos nutricionistas contempla, entre outras áreas, o estudo da Saúde Coletiva, almejando preparar os educandos para a atuação nos órgãos de saúde, assistência social e todos aqueles que envolvem saúde e alimentação das populações, respeitando suas diversidades.
Ainda é um desafio, no entanto, abordar essas diversidades no contexto acadêmico, de modo que garantam a representação efetiva e a autonomia dos povos tradicionais brasileiros, incluindo os povos indígenas e suas etnias.
Descrição Ao final da disciplina de Saúde Coletiva II, discentes e docentes do Departamento de Nutrição de uma universidade de Sergipe foram recebidos no território Xokó, na região do Alto Sertão Sergipano, pelo Cacique da comunidade, pelo Pajé e pela representante do Conselho Local de Saúde, para uma aula de campo acerca da saúde e cultura dos povos indígenas, em especial, do povo Xokó.
Período de Realização A aula de campo realizada em visita à comunidade Xokó ocorreu no dia 12 de maio de 2023.
Objetivos 1. Compreender a organização e práticas da comunidade no âmbito dos cuidados em saúde;
2. Identificar as pautas e os desafios mais importantes para a população Xokó atualmente.
Resultados Ao longo da visita, foi possível desmistificar certas noções e aprofundar conhecimentos. A organização do povo Xokó foi um aspecto central nos aprendizados, visto que seus representantes demonstraram um forte engajamento às causas e reivindicações da comunidade. A representante do conselho de saúde local exemplificou situações ao longo dos anos em que determinados órgãos não cumpriram ou não reconheceram suas responsabilidades com a população Xokó. Em todos os casos, a articulação do conselho de saúde e da comunidade criou mecanismos de exigibilidade de direitos diante das dificuldades para acessá-los.
A estruturação da comunidade em aspectos políticos e hierárquicos também foi elucidada aos estudantes, assim como seus desdobramentos na saúde e qualidade de vida. O diálogo realizado em torno da temática da ocupação e emprego também indicou transformações na rotina que afetam a alimentação, o cuidado em saúde (individual e coletiva) e as práticas cotidianas nesse território.
Aprendizados Após décadas seguindo uma lógica colonial na eleição de representantes, o povo Xokó foi conseguindo retomar a conexão ancestral com a natureza e suas divindades. Agora, a partir dos rituais sagrados, são revelados os responsáveis pela liderança e cuidado em saúde principal dos xokó.
A ocupação do Pajé também como Agente Indígena de Saúde busca aproximar os indivíduos dos equipamentos do Sistema Único de Saúde, e manter práticas originárias como forma de cuidado complementar.
Ao serem questionados sobre saúde e alimentação, os representantes relataram que atualmente a desnutrição e a fome não representam um problema central para os Xokós. Já a hipertensão foi destacada por eles e pela médica da Unidade de Saúde como o principal desafio atual da comunidade. Segundo a líder, a alimentação também tem se transformado à medida que os indivíduos passam a trabalhar em locais mais distantes da sua residência, e o cultivo do seu próprio alimento não é mais visto como uma opção viável. O pajé, por sua vez, comentou o afastamento da população em relação às práticas tradicionais de cuidado em saúde e alimentação, a exemplo do consumo de chás e plantas medicinais. A ingestão de ultraprocessados e bebidas alcoólicas também vem se tornando mais comum na comunidade.
Análise Crítica Um paradoxo apresentado pelo pajé foi a melhora do acesso à saúde com a presença do SUS na comunidade, em contraponto com a percepção do aumento de doenças crônicas, tais como hipertensão, preferência da população pelo tratamento alopático oferecido pelo serviço em detrimento das práticas tradicionais.
Tratando da redução do uso de plantas medicinais e aumento do consumo de ultraprocessados e bebidas alcoólicas, o pajé os associou à aproximação com estilo de vida ocidental.
A conselheira de saúde acrescentou que a mudança da principal fonte de renda da população gera o deslocamento diário desses indígenas até a região urbana do município. Quando o sustento advinha do artesanato e cultivo local, havia o hábito de consumo de mais alimentos in natura e minimamente processados.
Embora a superação da desnutrição na comunidade deva ser celebrada, é preciso atenção às causas associadas a outros problemas que denotam insegurança alimentar e nutricional e que também afetam a saúde e qualidade de vida da população.
Pensar em soluções afirmativas e que partam da própria comunidade, entender as movimentações políticas, e se posicionar também tornam-se, dessa forma, posturas relevantes na atuação do profissional de saúde que visa a promoção e proteção do cuidado à população.
Logo, a inserção de partilhas entre os povos originários e a academia mostra-se imprescindível para endereçar a falta de informação dos estudantes, e sensibilizar os futuros pesquisadores e profissionais.
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