02/11/2023 - 08:30 - 10:00 COC24.1 - Nada sobre mim, sem mim: História, saúde e resistência |
46509 - “PORQUE, EN LA REALIDAD, NUESTRO NORTE ES EL SUL” CURSO DE EXTENSÃO EM PSICOLOGIA DECOLONIAL: A ARTE LATINO-AMERICANA COMO BÚSSOLA PARA REPARAÇÕES HISTÓRICAS ALANA MARIA LOBO DE QUEIROZ PINHEIRO - UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ (UFC), ANA RAQUEL SILVA PATRÍCIO - UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ (UFC), ANTÔNIO CAIO RENAN SILVA PENHA - UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ (UFC), ÉRICA ATEM GONÇALVES DE ARAÚJO COSTA - UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ (UFC), LUCAS ARAÚJO DA SILVA - UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ (UFC), MARIA MARIANA DE ANDRADE SILVA - UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ (UFC)
Contextualização Apesar de não ter colônias desde o século XIX, a América Latina ainda é colonial. A colonização fez frestas e deixou veias abertas que sangram com violências, silenciamentos e apagamentos, em corpos que nem estão cientes do porquê dói. Nesse sentido, o eixo de estudos decoloniais, componente do Programa de Educação Tutorial do departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará, entende que, dado que quem narrou “nossa História” foi o colonizador, nossa concepção de sujeito e de mundo é nortecêntrica e, portanto, carregada de preconceitos e lacunas de informação sobre nós próprios. Foi por meio da Psicologia Decolonial que encontramos o direcionamento para responder perguntas sobre dores e desigualdades que nossas vivências enquanto latines nos trazem, mas a epistemologia científica dominante não só não nos respondia, como também já legitimou os machucados. Adotamos, portanto, a proposta de romper com essa perspectiva político-epistemológica hegemônica e traçar lutas por uma América Latina elaborada por e para latinos/as/es.
Descrição Atuando nessa direção, desenvolvemos um curso de extensão em Psicologia Decolonial denominado “Porque, en la realidad, nuestro norte es el sul” (TORRES GARCÍA, 1944), no qual discutimos: o que é decolonialidade, a cultura latino-americana e sua implicação nas subjetividades, interseccionalidades, a luta antimanicomial pela lente da decolonialidade, a atuação de uma psicologia comprometida com sua realidade e, por fim, qual a América Latina que queremos construir. Tais temáticas foram debatidas a partir de referenciais teóricos etnocêntricos, como Conceição Evaristo, Rachel Gouveia, Ailton Krenak, Martin-Baró, dentre outros. Outrossim, utilizamos produções latino-americanas na música, na dança, na literatura e no cinema, além de uma experimentação teatral, como ferramentas metodológicas sulcêntricas, que tensionam a colonialidade vigente em todas as suas facetas: no poder, no saber, no ser (LIMA e MALCHER, 2019, p.24) e no gênero (GONÇALVES e RIBEIRO, 2018).
Período de Realização O curso ocorreu de 29 de março a 10 de maio de 2023, às quartas-feiras, totalizando seis encontros realizados, com a presença de 25 participantes- considerando inscrites e convidades.
Objetivos O objetivo da extensão era trabalhar, a partir de metodologias artísticas, com a decolonialidade como motor epistêmico-político que proporciona a compreensão da urgência de uma reparação histórica, almejando transformações das realidades latina. Isso porque percebemos a arte latina como uma bússola, que aponta no presente para o passado, incitando movimentos de resgate dos saberes, das crenças e das narrativas dos povos indígenas, das pessoas pretas, das mulheres, do povo cigano e da comunidade LGBTQIAPN+, em vista de um futuro que se constrói conosco e para nós.
Resultados Como reflexo desse direcionamento, houve diversas partilhas e debates entre os participantes sobre percepções, vivências, dores e potências das suas e de outras existências enquanto corpos latinos. A partir disso, o curso foi, além de um espaço de resistência e luta, um local de afeto e refúgio. Além da fala, os presentes se expressaram por meio da arte, construindo inclusive uma materialidade-produto: um mapa da América Latina, desenvolvido em coletivo, ao longo do curso, por nós e para nós. No último encontro da extensão, esse mapa foi posto no chão, segurado por aqueles que o traçaram, erguido, invertido, e posto de volta ao solo, como uma simbolização da premissa de que “[...] en la realidad, nuestro norte es el sul” (TORRES GARCÍA, 1944).
Aprendizados A experiência do curso nos ensinou exatamente o poder de uma produção de conhecimento que afirme a potência de nossas identidades latino-americanas, que incite que sejamos os narradores da nossa história e os construtores dos nossos caminhos, não somente por meio do re-letramento epistemológico, mas também do nosso meio de denúncia e resistência mais antigo: nossa arte. Aprendemos que movimentos como pedir permissão para tocar o Ijexá e dançar em homenagem aos que vieram antes de nós também é fazer Psicologia, uma que ainda não está no papel, mas sempre esteve presente nos corpos.
Análise Crítica Nesse sentido, na trajetória traçada para a construção desses aprendizados, percebemos, ao debater as implicações da colonialidade nas subjetividades latinas, a gravidade de uma formação em Psicologia cujo referencial teórico é composto quase exclusivamente por epistemologias do Norte, tendo em vista que essas reproduzem uma visão colonial de sujeito e de mundo, contribuindo portanto para a perpetuação de violências macro e microestruturais decorrentes da colonização. Analisamos, portanto, que é urgente a decolonização das Psicologias, até mesmo para garantir não só o aumento e a permanência de corpos historicamente marginalizados na Universidade, como também o reconhecimento daqueles como pertencentes a esse local. Entendemos que isso somente é possível se a decolonialidade for entendida não como uma teoria, mas sim como a ética de onde se parte- o Sul.
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