Comunicação Oral Curta

02/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC27.1 - Interculturalidade e Praticas de Curas

47670 - MEMÓRIAS TAPUIAS E AS ERVAS DE CURA: VIVÊNCIAS E TRADIÇÕES COM AS PLANTAS NAS MARGENS DO RIO SABUGI, EM SÃO MAMEDE/PB
KARUÁ TAPUIA-TARAIRIÚ - UFPE, TAKAMARA KARIRI TAPUIA-TARAIRIÚ - UFRN, ABINIEL JOÃO NASCIMENTO - UFPE


Contextualização
Aldeamento Boa Vista, atual cidade de Bananeiras/PB. Em 16 de setembro de 1739, durante uma Junta das Missões, reunião representativa da Coroa Portuguesa, faz-se uma acusação de feitiçaria praticada pelos indígenas Xukuru e Canindé daquele aldeamento.
A acusação afirmava que mesmo com a inserção da fé católica no aldeamento, os indígenas continuavam praticando a feitiçaria, realizando rituais onde faziam o uso de fumo, bebiam da jurema e reverenciavam os espíritos de seus antepassados. Segundo relatos dos enviados pela coroa portuguesa, ao beberem da jurema os indígenas caiam como mortos, viam alucinações e acessavam visões ‘colocadas pelo diabo’.
Diante da denúncia, Felix Machado Freire, acompanhado de um capitão e do Padre Ignácio Goncalves Requião, é enviado para o aldeamento da Boa vista para averiguar os fatos. Durante a visita, Felix Freire ordena a prisão de um indígena sob a justificativa de que o mesmo estaria praticando feitiçaria. O mandado de prisão gerou uma revolta que resultou na morte de pelo menos 8 indígenas das etnias Kanindé e Xukuru. As punições não se findaram nesse momento, pois nos meses seguintes a perseguição a espiritualidade indígena naquele aldeamento seria cada vez mais intensa.
Ainda no mesmo ano, no dia 19 de dezembro, o capitão-mor da Paraíba, Pedro Monteiro de Macedo faz mais uma denúncia à coroa portuguesa. Segundo sua carta, o que acontecia no aldeamento Boa Vista era ainda pior do que se imaginava, pois além das feitiçarias feitas pelos indígenas, os próprios padres daquela missão bebiam da jurema e recorriam as curas dos feiticeiros de seu convívio. Além da perseguição as práticas vinculadas ao uso da jurema nesse aldeamento, pelo menos 8 indígenas Kanindé e Xukuru foram mortos. Já os padres que assim como os Kanindé e Xukuru faziam uso das encantarias indígenas foram inocentados em seguida.


Descrição
Ao longo da investigação para constituição do Memórias Tapuias: Acervo Audiovisual da Cultura Indígena no Vale do Sabugi (PB), construímos um diálogo a partir de entrevistas realizadas junto aos conhecedores tradicionais do semiárido na zona urbana e rural da cidade de São Mamede, no Sertão Paraibano. Junto a uma equipe de trabalho multidisciplinar temos elucidado sobre os conhecimentos vinculados às memórias e as práticas de vida das famílias originárias das margens do Rio Sabugi.

Período de Realização
Primeiro semestre/2021.

Objetivos
Nesta comunicação apresentamos um retrato sobre os usos das ervas de cura e a práticas vinculadas ao cuidado no e com o território a partir da construção do Memórias Tapuias: Acervo Audiovisual da Cultura Indígena no Vale do Sabugi (PB).

Resultados
Agenciando as relações entre territorialidade, espiritualidade e memória familiar, as ervas medicinais apontam para uma relação intransferível com a terra, até mesmo nas residências urbanas. As técnicas de cura e os modos de utilização das ervas apontam para uma memória anterior ao que o tempo pode contar, remontando a práticas agenciadas desde o surgimento de cada uma dessas famílias. Perpassa desde as maquinarias do trabalho que regem as experiências do fazer; os modos de agir como prática constante; objetos achados que provam uma relação com a terra anterior à história contada; até as construções contemporâneas. Com isso, apresentamos um conjunto de memórias que permanece em rejeição ao esquecimento.

Aprendizados
Essa pesquisa tem um caráter de constituição de um acervo audiovisual, que se constitui uma fonte de informação e conhecimento sobre essas populações de ancestralidade indigena no semiárido paraibano. Proporcionando um meio de reflexão sobre a invisibilização, silenciamento e violências da colonialidade que perpassam essas comunidades ao longo dos anos. Também se configura como um material educativo da cultura, que através dos tempos resistiram e resistem às forças de opressão. As plantas sagradas de cura são mecanismos da cultura ancestral indigena, que atuam para fazer permanecer essa ancestralidade indígena viva na atualidade. Sendo um material consultivo sobre essas memórias, podendo ser usadas como estratégias educativas para a região semiárida conectada aos povos tradicionais indígenas.


Análise Crítica
As técnicas de cura e os modos de utilização das ervas apontam para uma memória anterior ao que o tempo pode contar, remontando a práticas agenciadas desde o surgimento de cada uma dessas famílias. Perpassa desde as maquinarias do trabalho que regem as experiências do fazer; os modos de agir como prática constante; objetos achados que provam uma relação com a terra anterior à história contada até as construções contemporâneas.