46301 - O PORTAL REDIMENSIONADO EM UM MESTRADO ACADÊMICO: O APORTAR “CORPO-CICLO” DE UMA MULTIDIMENSÃO ESPIRALAR E A DESCOLONIZAÇÃO DO PRÓPRIO CORPO SIMONE SILVA DE PAIVA DE MAGALHÃES - PPGSC - UFF
Contextualização Este relato de experiência apresenta o percurso de uma discente negra, moradora de periferia, profissional da área da saúde e mestranda em saúde coletiva em seu enegrecimento propiciado por diversos mecanismos perpassados a partir de seu ingresso no mestrado acadêmico. Para isso, apropria-se do recurso de escrevivências, utilizando-a como ferramenta metodológica, problematizando suas transformações pessoais ao longo deste percurso, afetado por racismo, sofrimento psíquico e questionamentos de um corpo negro subjetivado, no enfrentamento das estruturas hegemônicas e eurocentradas das universidades.
Descrição A partir de uma construção e imersão de campo definida pela autora como “corpos-ciclos”, o relato descreve as interseccionalidades vivenciadas por ela, mas que representa todo um coletivo de mulheres negras. Esta se submete a uma encruzilhada de indagações no processo formativo, apontando caminhos não lineares, decoloniais e afrocentrados de (re)significação de aprendizagens, que impactam na formação docente e consequentemente, traz proposições de transformações na formação de profissionais na área da saúde coletiva.
Período de Realização O relato acontece a partir do ingresso no mestrado acadêmico em junho de 2021 e se apresenta em curso no momento desta escrita.
Objetivos Objetiva uma reflexão sobre a descolonização da pós-graduação de profissionais da saúde e os possíveis efeitos no campo da saúde coletiva. Agrega a esta ideia principal, a perspectiva da descolonização de saberes, rupturas e desconstruções na ciência ocidentalizada que rege a formação em saúde, assim como uma tentativa de compreender as potencialidades de uma formação pluriversal e consonante com uma afro perspectiva.
Resultados Ao experimentar as escrevivências como ferramenta metodológica, de resistência e preservação da memória social para o campo de pesquisas científicas, resgata a voz de autores negros na literatura e na produção de caminhos contra-hegemônicos de superação ao modelo instituído e validado como único e referenciado caminho de produção científica. Através desta proposta, relata sobre o processo formativo por uma ótica discente, propondo uma valorização das experiências dos sujeitos e suas afetações no pensar-agir-fazer, por onde foi se constituindo seu caminho metodológico. A autora identifica esta passagem como metamorfósica e de instituição de corpos-ciclos que não se delimitam em si, mas tal qual em um processo espiralar, a cada interação com o meio, este campo-tempo-espaço se transforma, refletindo a partir de suas “cicatrizes”, rupturas e resistências, a imersão de novos processos de subjetivação e aprendizagens significativas.
Aprendizados Fazer a escolha por este “corpo-território” para pesquisa acadêmica em um mestrado de Saúde-Coletiva e emergir neste campo instituindo, uma metodologia definida por “corpos-ciclos”, está sendo um processo desafiador e transformador, descartando a priori, outras nuances de pesquisas qualitativas baseadas em metodologias narrativas ou autobiográficas, que não se encaixavam na minha perspectiva enegrecida de escrita. Este estudo aporta em um momento oportuno de reflexão, sobre a construção de conhecimento e formação de um constructo discente que vai além de um mecanismo institucional e pedagógico, mas uma poderosa oferta de ressignificação de saberes, práticas e epistemologias que anseiam por um (re)descobrimento/direcionamento de sua práxis, potencializando em seus desdobramentos outras performances de aprendizagem.
Análise Crítica Este caminhar transformador, em uma encruzilhada com sofrimentos e resistências, permite também aberturas e resgates a todo um processo civilizatório que vem promovendo uma dessubjetivação de pensamentos, corpos e epistemes. A chamada ocidentalização e movimento europeu de colonização trouxe amarras ao pensamento ancestral, diaspórico e cosmogônico. A essência da sabedoria humana passou a ser declamada apenas como um conhecimento empírico ou de senso comum, não permitido ser legitimada para estudos ditos científicos. Os campos em disputa estiveram ao longo da evolução das pesquisas, dimensionados e organizados em caixas de conceitos, fragmentados e distantes, nos fazendo refletir neste estudo, como pesquisador e objeto se imbricam nesta “fazedura” e não se distanciam. Aflora no cerne deste estudo e ascensão de conhecimentos, uma trajetória coletiva imprescindivelmente decolonial e epistemicamente afro referenciada, propositora de um espaço de formação que seja pluriversal, enegrecedor e “pretistêmico” (contra o racismo epistêmico), fazendo uma analogia ao apagamento e invisibilização de culturas outras não eurocentradas e de um projeto arraigado nas universidades de embranquecimento estrutural dos saberes.
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