Comunicação Oral Curta

02/11/2023 - 08:30 - 10:00
COC31.1 - Pesquisas da saúde e direitos humanos das e com as comunidades atingidas

47434 - IMPACTOS DAS MEDIDAS DE REPARAÇÃO NA SAÚDE MENTAL DOS ATINGIDOS PELA BARRAGEM DO FUNDÃO NO DISTRITO DE BENTO RODRIGUES: REFLEXÕES E CONSIDERAÇÕES
GABRIELA MARIA DE LANA PINTO - UFOP, KERLEY DOS SANTOS ALVES - UFOP, SOLANO DE SOUZA BRAGA - UFOP, NILSON RICARDO ARAÚJO - UFOP


Apresentação/Introdução
O rompimento da barragem do Fundão, no subdistrito de Bento Rodrigues, no município de Mariana, Minas Gerais, foi considerado um dos maiores crimes socioambientais da história recente do Brasil (SERRA, 2018). Foram cerca de 60 milhões de metros cúbicos de rejeitos minerários que transformaram a pequena comunidade em um mar de lama (TEIXEIRA, 2018). Dentre as diversas consequências da tragédia, nos atemos aos impactos psíquicos causados pela perda do território e pelo trauma vivenciado na luta pela própria vida durante o rompimento e na diária ao longo dos últimos sete anos.
As diversas reuniões, assédio da mídia e também de representantes da Fundação Renova, os preconceitos cometidos por parte da população da cidade de Mariana, além da constante luta pelo território e pela memória da tragédia, são alguns dos pontos que promovem o mal estar psíquico da comunidade atingida que até hoje não possuem o reassentamento de suas casas, principal reivindicação dos atingidos de Bento Rodrigues, primeiro povoado atingido pelo crime. Pretende-se com essa pesquisa, contribuir com a narrativa das comunidades atingidas evidenciando os falsos discursos presentes na mídia, pela Fundação Renova e sua gestão.
Aproveitamos o espaço também para agradecer à Universidade Federal de Ouro Preto e também ao apoio apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES).

Objetivos
O objetivo geral, é elencar as consequências na saúde mental da comunidade atingida pela barragem do Fundão após sete anos da tragédia. Como objetivos específicos; investigar como as medidas de reparação realizadas pela Fundação Renova afetam a saúde mental dos atingidos, examinar os discursos presentes no jornal "A Sirene", principal veículo de comunicação das comunidades atingidas, e no site da Fundação Renova, identificando os discursos presentes.


Metodologia
Essa pesquisa possui caráter qualitativo. Utilizamos como metodologia a pesquisa bibliográfica e documental, utilizando como fonte o jornal “ A Sirene”, principal veículo de comunicação das comunidades atingidas pela barragem do Fundão, no distrito de Bento Rodrigues, município de Mariana, e os discursos presentes no site da Fundação Renova. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.


Resultados e discussão
A partir da análise do Jornal “ A Sirene” e dos conteúdos publicados pela Fundação Renova, foi possível observar a tensão existente nas narrativas. O Jornal A Sirene é um veículo comunicacional que nasceu em fevereiro de 2016, como um meio possível de circulação de informações sobre as consequências e trâmites que envolvem a queda da barragem do Fundão, crime ocasionado em 5 de novembro de 2015. A Fundação Renova é uma instituição que faz parte dos desdobramentos do Termo de Transação e de Ajustamento de Conduta (TTAC), termo firmado em resposta à ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal em 02 de março de 2016 ( DINAT, 2022). A instituição passou a operar em 2 de agosto de 2016. Aqui, observamos que a instituição se transforma em um tipo de blindagem para as empresas responsáveis pelo crime, de acordo com relatos encontrados no jornal:

"Quando você tem um dano causado pela Samarco, ela é a obrigada principal junto com a Vale e a BHP. Quando você cria a pessoa jurídica da fundação, você cria um terceiro para responder por um dano causado pelas três primeiras. Então, você criou uma roupagem que vai dificultar novamente a execução em caso de descumprimento. É como se você causasse um dano a alguém e, ao invés de você pagar e reparar, você dissesse: “não, espera aí! Eu vou criar uma pessoa jurídica, uma fundação que vai te pagar”. Ninguém aceitaria esse acordo, mas a União e os Estados de Minas Gerais e Espírito Santo aceitaram (A SIRENE, 2016, p. 4)."

Através das primeiras edições do jornal observamos, em um primeiro momento, a dificuldade da comunidade em relação ao próprio termo atingido. Quem é atingido e quem não é, apresenta-se como uma problemática que envolve os direitos à reparação. Em um segundo momento, observamos que ao longo dos meses, surge um preconceito em relação à comunidade que após o desastre foi realocada para a cidade de Mariana.

A partir das análises realizadas, fica evidente que a mudança de comportamento dos cidadãos de Mariana, de uma postura inicial de solidariedade para a hostilidade em relação à comunidade atingida, pode ser atribuída a diversos fatores. Entre eles, destaca-se o estigma alimentado por narrativas da mídia e a falta de compreensão das consequências psicológicas do desastre. O preconceito enfrentado pelos atingidos, juntamente com a luta constante pela recuperação do território e a memória da tragédia, contribuem para o mal-estar psíquico vivenciado pela comunidade, que até hoje aguarda o reassentamento de suas casas. Essa mudança de comportamento reflete a necessidade de um maior entendimento e sensibilização por parte da população, a fim de promover a solidariedade e apoio contínuo às comunidades afetadas por eventos traumáticos.

Por meio dos relatos encontrados e também das passagens do jornal, podemos inferir que parte desse processo se dá pela pausa das atividades da Samarco no município que prejudicou parte da população de Mariana. Seguindo essa lógica, os atingidos se tornam então, os principais “culpados” pela queda da mineradora.

A partir do site da Fundação Renova, foi possível observar o jogo político que atravessa as narrativas das histórias, na medida em que a instituição, possui poderes aquisitivos maiores que as populações atingidas, o que permite que a empresa invista mais capital em marketing e publicidade a fim de reverter a crise de imagem pela qual a Samarco, mais que as empresas Vale e BHP passou após o crime. A própria criação da Instituição, de acordo com Maher (2021), foi algo feito às escuras. Os atingidos durante as reuniões promovidas pela Samarco, não sabiam que o processo de reparação viria de uma pessoa jurídica.

Assim como a construção do Dique S4, considerada uma forma de apagamento e que foi justificada como uma das únicas formas possíveis de contenção dos rejeitos restantes pós desastre, nos últimos meses, a alteração da rota da Estrada Real (Freitas et al, 2023), que passava pelo antigo Bento, se tornou também fonte de disputa, a partir do momento em que a Fundação Renova planejou as mudanças de rota com a justificativa de potencial turístico sem consultar a população atingida. Esse processo soma mais uma forma de apagamento da memória de Bento origem e que faz parte também de mais uma camada do trauma vivenciado.


Conclusões/Considerações finais
A partir desse pequeno esboço, concluímos que para que o discurso da comunidade atingida seja ouvido, é necessário um trabalho de sensibilização social.