02/11/2023 - 08:30 - 10:00 COC31.1 - Pesquisas da saúde e direitos humanos das e com as comunidades atingidas |
47632 - UM RIO QUE CORRE EM MIM: NARRATIVAS DE MULHERES ATRAVESSADAS PELA TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO TAMARA GOMES PACHECO SOBREIRA - FIOCRUZ PE, ANDRÉ MONTEIRO COSTA - FIOCRUZ PE, WANESSA DA SILVA GOMES - UPE
Apresentação/Introdução Diante das singularidades climáticas do semiárido do nordeste brasileiro e de suas implicações sociais e econômicas, vários projetos de enfrentamento à seca foram propostos ao longo de décadas como o projeto de integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional (PISF), conhecido como a transposição do Rio São Francisco. Ao longo de 16 anos de implementação, inúmeras questões e problemáticas ressoam nas comunidades atravessadas por este megaprojeto, expondo-as a processos de conflitos e vulnerabilização. Megaempreendimentos como este, alinhados ao modelo neoliberal desenvolvimentista, possuem suas raízes na estrutura moderna-colonial-capitalista-patriarcal que produz secularmente uma ordem social de hierarquização e subordinação entre os povos, estrutura uma lógica de existência e de relacionamento social que submete as mais diversas mulheres a contextos de violências de gênero. A colonialidade do poder, de gênero e da natureza são categorias potentes na reflexão sobre a relação entre a colonialidade e suas atualizações através dos programas e projetos de desenvolvimento e seus novos formatos de exploração da natureza, dos territórios, de vidas humanas, de pessoas historicamente subalternizadas. Partindo da complexidade, dos aspectos sócio-históricos e políticos que permeiam as questões sobre violência de gênero e processos de vulnerabilização em contextos de megaprojetos de desenvolvimento, opto pelas contribuições e provocações dos feminismos decoloniais e dos ecofeminismos na tessitura deste estudo que se propõe a refletir sobre as violências de gênero e os processos de vulnerabilização produzidos às mulheres pelo megaprojeto de transposição do rio São Francisco. Falar sobre violência surge da experiência de vivenciá-la. Quantas de nós, mulheres cis e trans, a cada segundo que passa enquanto escrevo estas palavras, vivencia neste momento uma manifestação da violência?! Me valendo das provocações do pensamento decolonial e feminista, anuncio esta escrita carregada de afetos, sentidos e memórias que surgem dos encontros e diálogos vivenciados junto às mulheres das comunidades de Sertânia e junto às integrantes do TransVERgente. Este estudo é uma escrita coletiva que parte dos medos, anseios e desejos de muitas de nós.
Objetivos -Analisar a produção de violências na vida das mulheres vulnerabilizadas pelo megaprojeto de transposição do rio São Francisco no município de Sertânia/PE.
-Compreender a representação da transposição do rio São Francisco para as mulheres atravessadas pelas suas obras no município de Sertânia;
-Caracterizar os processos de vulnerabilização vivenciados pelas mulheres atingidas pelo megaprojeto de transposição;
-Identificar as violências de gênero vivenciadas pelas mulheres em função da transposição.
Metodologia A perspectiva epistemológica utilizada na construção da pesquisa é tecida a partir das contribuições dos feminismos decoloniais e dos ecofeminismos. Para responder seus objetivos foi realizado um estudo de abordagem qualitativa entre os anos de 2021 a 2023, uma pesquisa narrativa através de seis entrevistas narrativas com mulheres cis das comunidades do município de Sertânia-PE e posteriormente da ánalise Crítica do Discurso em uma perspectiva Feminista de suas falas.
Resultados e discussão Me valendo das provocações de Donna Haraway a partir do conceito de objetividade corporificada, anuncio a não neutralidade e imparcialidade na análise desse estudo. Ao narrar uma memória o(a) corpo(a) fala de diferentes formas. Para além da expressão vocal durante as entrevistas, nos comunicamos através da respiração, em olhares por vezes tão presentes, em outros momentos, bem distantes. Era como se as narradoras se deslocassem exatamente para a situação que estavam a narrar. De fato, elas se deslocavam. Era possível sentir na firmeza revoltante de suas falas o quanto isso as afetava e produzia sofrimento. A partir dos discursos das participantes foi possível identificar os processos de vulnerabilização e as manifestações de violências como a violação e exploração dos(as) corpos(as) de mulheres e meninas, sobrecarga de trabalho doméstico e de cuidado com a família por agravamento das condições de saúde, assim como a negação dessas mulheres enquanto sujeitos políticos. Assim, a transposição do rio São Francisco através da sua implementação produziu processos de vulnerabilização, violências, transformações nos modos de vida e inúmeras problemáticas para a vida e para a saúde das mulheres das comunidades atravessadas por este megaprojeto de desenvolvimento.
Conclusões/Considerações finais Este estudo visa fortalecer as discussões insurgentes tecidas pelos feminismos decoloniais e ecofeminismos em sua crítica à colonialidade, ao capitalismo e suas relações com a produção de violências de gênero, assim como contribuir com a análise crítica acerca dos modelos de desenvolvimento neoliberal, seus megaempreendimentos e implicações sobre a vida das diversas mulheres latinoamericas.
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